Farmácias de manipulação criticam medida da Anvisa em
audiência
Com exceção da representante da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), todos criticaram a Consulta Pública
editada pelo órgão, que restringe a atuação das farmácias de
manipulação, dentre outras medidas. Membros de entidades
representativas desse segmento, além de farmacêuticos magistrais e
médicos participaram, nesta terça-feira (7/6/05), da reunião
conjunta das comissões de Saúde e de Defesa do Consumidor e do
Contribuinte. A audiência pública, requerida pelos deputados Paulo
Piau (PP), Elmiro Nascimento (PFL) e outros, discutiu a Consulta
Pública 31, de abril de 2005, que, segundo eles, imporia grave
cerceamento à atuação dos farmacêuticos.
Segundo a presidente da Associação Nacional dos
Farmacêuticos Magistrais (Anfarmag), Ângela do Amaral Caldas, três
das mudanças previstas chamam atenção pela ausência de razões
técnicas, denotando o caráter político da medida. O item 5.14 prevê
que a farmácia não poderá mais manipular qualquer medicamento que
tenha similar no mercado, a não ser que seja numa dosagem diferente
da que a indústria farmacêutica oferece. Além disso, o item 5.14.2
só permite a chamada "manipulação magistral de associações
medicamentosas" com a devida justificativa do médico que fizer a
receita e desde que a combinação não seja proibida por lei. Já os
itens 5.22.3 e 5.22.5 vedam, respectivamente, a propaganda e a
distribuição de amostras grátis de formulações manipuladas.
Comentando as medidas, Ângela Caldas afirmou que a
Anvisa extrapolou suas prerrogativas legais, uma vez que não é da
competência da agência fiscalizar farmácias, o que caberia aos
conselhos Regionais e Federal de Farmácia. Na opinião da dirigente,
a Lei 9.782, de 1999, que criou a Anvisa, não previu como
competência da agência a regulamentação de profissões na área de
saúde e sim, de regulamentar e fiscalizar os produtos e serviços que
envolvem risco à saúde pública.
Para farmacêuticos, proposta é
inconstitucional
Ângela citou ainda parecer elaborado pela Anfarmag
mostrando que a consulta pública 31, da Anvisa, descumpriria a
Constituição Federal. A medida promoveria o cerceamento do exercício
profissional dos farmacêuticos, além de ferir a livre concorrência
ao não permitir que as farmácias de manipulação façam publicidade.
Tal iniciativa dificultaria o acesso da população às formas
farmacêuticas diferenciadas e aos princípios ativos não encontrados
nos laboratórios, todos com preços mais baixos e adequação na
dosagem. Apesar das críticas, a dirigente ressalvou que o setor
(composto por 5.500 farmácias de manipulação no Brasil, sendo 1.300
em Minas Gerais) sempre esteve aberto a discutir com a Anvisa
medidas de fiscalização e controle de qualidade.
Também com postura crítica, a vice-presidente da
Associação Mineira dos Farmacêuticos Homeopatas, Vânia Lúcia Silva
Carneiro, divulgou que o congresso da categoria, em maio deste ano,
aprovou moção de repúdio à consulta. Representantes de várias
categorias, incluindo médicos, homeopatas, veterinários homeopatas,
além de farmacêuticos, condenaram o que chamaram de "tentativas de
promover a reserva de mercado e restringir o exercício de diversas
profissões". Vânia Carneiro alertou ainda que muita pessoas vão
ficar sem medicamento se a proposta não for mudada.
Já o diretor do Sindicato dos Farmacêuticos de
Minas Gerais, Rilke Novato Públio, avaliou que "o debate sobre a
resolução é nacional, extrapolando discussões meramente técnicas".
Perpassam a discussão os interesses da população quanto a sua saúde
(65% dos gastos na saúde são com remédios) em confronto com os da
indústria farmacêutica. Esse setor faturou, em 2004, segundo Públio,
R$ 20 bilhões, colocando o País entre os dez maiores faturamentos do
mundo. Atualmente, são 719 indústrias de medicamento no País, 40%
conglomerados multinacionais, que dominam 86 % do mercado. Outro
dado trazido foi o de que os 50 medicamentos mais vendidos no Brasil
são todos de multinacionais.
Segundo Anvisa, medida reduz risco
sanitário
A representante da Anvisa, Cristiana Martins
Araújo, afirmou que o objetivo de uma consulta pública é,
justamente, abrir o debate para que os interessados possam fazer
críticas e sugestões. No presente caso, para a Consulta Pública 31
foram destinados 60 dias para coleta de idéias, com o vencimento do
prazo no dia 18 deste mês. Ela afirmou que a proposta visa reduzir o
risco sanitário nas farmácias de manipulação. Nesse sentido,
Cristiana comparou o controle de qualidade dessas empresas com o da
indústria farmacêutica, concluindo que nessa última, o
acompanhamento é maior, com o controle da matéria prima, do processo
e da finalização.
Já na manipulação, como o produto é
individualizado, não há controle final. "Se o paciente tiver algum
problema com o medicamento, não há como detectar", advertiu.
Cristiana ressaltou que uma das motivações da proposta foram 27
ocorrências graves envolvendo remédios manipulados. Quanto à
proibição de manipular o que a indústria fabrica, ela disse que vê
dificuldades na fiscalização. Sobre a dosagem exata de medicação,
antes possível apenas nas farmácias de manipulação, agora ocorre
também com remédios industrializados, depois da aprovação do
fracionamento de medicamentos pela Anvisa.
Deputados - Adelmo
Carneiro Leão (PT), presidente da Comissão de Saúde, informou que
iria a Brasília onde cobraria da Anvisa alterações na Consulta
Pública 31. Ele concordou que os medicamentos manipulados deveriam
ser fiscalizados e controlados, mas também os industrializados, que
sofrem processos de falsificação e fraudes, como comprovou a CPI dos
Medicamentos da Assembléia. Também Paulo Piau (PP) avaliou que, como
os governos não conseguem exercer bem o papel de fiscalização,
acabam criando dificuldades para o cidadão, como no caso dessa
proposta.
Também a deputada Lúcia Pacífico (PTB) bateu na
tecla da importância de reforçar a fiscalização. "O que queremos são
medicamentos de boa procedência", afirmou, lembrando que tanto os
manipulados quanto os industrializados podem apresentar problemas. O
deputado Elmiro Nascimento (PFL) disse que a consulta tolhia a
liberdade dos farmacêuticos manipuladores e atendia a um lobby dos
grandes laboratórios farmacêuticos, e por isso, deveria ser
cancelada. Como médico, o deputado Doutor Viana (PFL) disse que se
sentiu humilhado ao saber da proposta de que o médico teria que
justificar a prescrição de um remédio manipulado. "É um
desrespeito", concluiu.
Requerimentos - Foram aprovados quatro
requerimentos sobre o assunto, como o do deputado Carlos Pimenta
(PDT), pedindo o envio de ofício a deputados federais, senadores e a
presidentes das comissões de Saúde e de Defesa do Consumidor dos
estados para que manifestem posição contrária à Consulta Pública 31,
da Anvisa. Já o deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) pediu que seja
enviado apelo à agência para que seja prorrogado o prazo para
apresentação de sugestões e propostas à consulta. Também foi
solicitado pelo deputado Domingos Sávio (PSDB), o envio de ofício ao
ministro da Saúde pedindo seu posicionamento a respeito da proposta
da Anvisa, principalmente sobre a supressão de alguns itens e
prorrogação do prazo. O deputado João Leite (sem partido), solicitou
o envio de ofício ao Ministério da Saúde e à Anvisa, para que seja
retirada a proposta de normatização contida na Consulta Pública 31.
O parlamentar justificou a solicitação defendendo que o assunto é de
competência do Congresso Nacional.
Presenças - Deputados
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente da Comissão de Saúde; Carlos
Pimenta, vice; Chico Rafael (PMDB) e Lúcia Pacífico (PTB),
presidente e vice da Comissão de Defesa do Consumidor e do
Contribuinte; Elmiro Nascimento (PFL), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB),
João Leite (sem partido), Paulo Piau (PP), Domingos Sávio (PSDB) e
Doutor Viana (PFL). Além dos citados na matéria, participaram
também: o presidente do Conselho Regional de Farmácia, Lauro Mello
Vieira; a diretora da Faculdade de Farmácia da UFMG, Jane Maciel
Almeida Baptista; e a farmacêutica e proprietária de farmácia
alopática, Maria Alícia Ferrero.
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