Comissão propõe reunião para viabilizar acordo entre CVRD e
população
Munidos de faixas de protesto, moradores da cidade
de Belo Vale voltaram a criticar, nesta terça-feira (31/5/05), a
construção de uma barragem de rejeitos pela Companhia Vale do Rio
Doce (CVRD) numa área de preservação do município. A audiência
pública da Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais foi
requerida pela presidente, deputado Laudelino Augusto (PT),
atendendo a pedido de moradores, que acompanharam a visita da
comissão ao local no último dia 2. Como proposta para reduzir os
impactos ambientais da obra e solucionar o impasse, foi aprovado
requerimento desse deputado pedindo audiência pública em Belo Vale
para debater a possibilidade de assinatura de Termo de Ajustamento
de Conduta entre o MP, os órgãos ambientais do Estado, a Prefeitura
de Belo Vale, representantes da comunidade e a CVRD.
O vice-presidente da Associação pela Preservação do
Patrimônio Histórico, Ambiental e Artístico de Belo Vale (Aphaa),
Tarcísio Martins, apresentou fotos mostrando a degradação promovida
pela empresa no município. Segundo ele, são 12 km de mineração ao
longo da rodovia MG-442, transformando a Serra dos Mascates, que
cerca Belo Vale, numa verdadeira "paisagem lunar", com várias
crateras. Ele destacou que já se forma um triângulo no local
desmatado pela Vale desde o ano passado, que seria uma área de
interesse histórico e arqueológico. Martins denunciou também que uma
das nascentes formadoras do córrego dos Mascates teve seu curso
afetado e sua mata ciliar destruída. Por esse motivo, verificou-se,
de acordo com ele, a redução no volume d'água nesse rio, que
abastece as comunidades dos Pintos e da Boa Morte, no município.
O dirigente afirmou ainda que um patrimônio
histórico da cidade, do século 18 - as ruínas das Casas Velhas -,
está também sob ameaça com a construção da barragem, problema
detectado pelo historiador do Ministério Público, César Moreno, que
verificou a "ausência de estudos de impacto à vizinhança e quanto ao
patrimônio histórico e cultural". O MP constatou que, nesses casos,
os órgãos estadual e federal pertinentes, Iepha e Iphan, deveriam
ser acionados.
Diretor da Vale diz que barragem atual está no
limite
Trazendo transparências, o coordenador de Meio
Ambiente da Vale, Marco Aurélio Borges, declarou que a obra da
barragem foi a única alternativa, uma vez que a atual pilha de
depósito de "estéril" (camadas superiores de solo retiradas para a
exploração do minério) estaria no limite. A empresa optou pela
construção em uma área contígua a já existente, por ser formada em
sua maior parte (85%) de campo limpo e por uma faixa estreita perto
do curso d'água. Quanto ao aspecto legal, o executivo da CVRD
afirmou que para o licenciamento da barragem foram consultados os
órgãos ambientais do Estado - Institutos Mineiro de Gestão das Águas
(Igam), Estadual de Florestas (IEF) e Fundação e Conselho Estadual
do Meio Ambiente (Feam e Copam). Igam e IEF, cada um na sua área de
atuação, autorizaram a continuidade do projeto, com a assinatura da
licença ambiental, válida até 2006, pela Feam, e aprovação pelo
Copam.
Sobre o dano à nascente, Borges informou que isso
não ocorrerá, pois serão feitos "tapetes" que drenarão a água para
que passe debaixo da pilha. Quanto à qualidade da água, o diretor
disse que a empresa faz monitoramento mensal, remetendo
trimestralmente relatório ao Igam. Com a outorga concedida por esse
órgão, começou o trabalho de construção da pilha de estéril e do
dique, que vão ocupar uma área de 51.660 metros². Está também sendo
construído o vertedouro por onde vai passar a água desviada para
voltar ao seu curso natural no córrego Moreira.
Como medidas compensatórias acordadas com a Feam, a
CVRD transferiu para o Estado a Floresta do Caimi, com uma área de
4.398,16 hectares. Outra ação proposta é a criação e manutenção de
uma reserva particular do patrimônio natural em Belo Vale, com a
preservação das ruínas de Casas Velhas e da vegetação. Borges
destacou que a mina emprega 1.200 funcionários, produzindo por ano
10 mil toneladas de minério de ferro e 4,50 mil toneladas de
pelotas.
Promotor afirma que obra descumpre leis
Discordando do representante da CVRD, o promotor de
Defesa do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, Fernando Galvão da
Rocha, afirmou que o MP constatou que a população de Belo Vale tem
razão. Ele confessou sua frustração, dizendo que várias
irregularidades no empreendimento foram denunciadas pelo MP, mas que
"o Estado é incapaz de dar uma resposta rápida à situação". Como
desabafo, afirmou que "o MP não tem poderes para tomar medidas mais
sérias; apenas aponta erros que são levados à Justiça, que é lenta,
e quando vai agir, já é tarde".
Segundo o promotor, em junho de 2004, o MP ajuizou
a ação que resultou em liminar impedindo o desmatamento da área. A
Vale entrou com recurso e, após vistoria do IEF, a liminar foi
revogada pelo mesmo juiz que a concedeu, Paulo Roberto Caixeta, de
Congonhas. O MP recorreu então ao Tribunal de Justiça de Minas
Gerais (TJMG), que concedeu liminar concluindo que houve violação
das leis ambientais no caso. E a Feam, na opinião do promotor,
estaria ignorando o parecer. "Como é possível o Judiciário dizer que
não pode e o Executivo ignorar?".
Ainda para Galvão, os pareceres da fundação seriam
inconsistentes, por não citarem lei alguma. Outra irregularidade
apontada foi a escolha feita pela Vale do local para a pilha de
estéril, sem ouvir a Feam, que seria a responsável pelo estudo sobre
o assunto. "A diretoria da Feam dispensou um direito que não é dela;
é nosso, da população", indignou-se. Concordando com o promotor, o
deputado Sávio Souza Cruz (PMDB) afirmou que não conseguia conceber
"que órgãos ambientais não tenham levado em consideração o estudo de
alternativas locacionais"
O técnico da Divisão de Extração de Minerais
Metálicos da Feam, Josino Gomes Neto, disse que a conclusão da
fundação foi a de que o impacto ambiental da obra não era
significativo o suficiente para desautorizá-la. Ele declarou também
que a pilha não iria interferir diretamente sobre as ruínas das
Casas Velhas. O gerente Regional do IEF, Marcelo de Araújo Porto,
afirmou que o instituto autorizou o desmate, agindo em consonância
com a licença expedida pela Feam.
Requerimentos - Foram
aprovados outros dois requerimentos do deputado Laudelino Augusto
solicitando enviar ofício pedindo cópias: à Feam, do processo de
licenciamento ambiental do empreendimento "Ampliação da Pilha de
Estéril Marés", em Belo Vale; ao MP, das peças principais do
processo relativo à ação civil pública referente à obra. O deputado
Doutor Ronaldo (PDT) manifestou a esperança de que o empreendimento
ainda pudesse caminhar no sentido da vida, das pessoas, e não apenas
com preocupação econômica. O deputado Padre João (PT) sugeriu que
fossem estudados outros usos para o estéril, citando o exemplo de
cascalho para estradas vicinais. O deputado Fábio Avelar (PTB)
declarou julgar importante reconhecer o valor da atividade minerária
para o Estado e ao mesmo tempo, compatibilizá-la com o
desenvolvimento sustentável.
Presenças - Deputados
Laudelino Augusto (PT), presidente; Doutor Ronaldo (PDT), vice;
Sávio Souza Cruz (PMDB), Padre João (PT) e Fábio Avelar (PTB). Além
dos citados na matéria, participaram o delegado de Prevenção Contra
Crimes ao Meio Ambiente e o Patrimônio Histórico da Polícia Federal,
Carlos Marcelo Silva Rodrigues; o presidente do Sindiextra e da
Câmara da Indústria Mineral da Fiemg; José Fernando Coura; o
prefeito de Belo Vale, Wanderlei de Castro; e a chefe da Divisão de
Licenciamento Ambiental do Ibama/MG, Ubaldina Maria da Costa
Isaac.
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