Deputados e trabalhadores criticam mudanças no Hospital de Venda
Nova
Deputados da oposição e trabalhadores da rede
estadual de saúde fizeram duras críticas à transferência do Hospital
de Venda Nova para uma organização da sociedade civil de interesse
público (oscip), durante reunião da Comissão de Saúde da Assembléia
Legislativa realizada nesta quarta-feira (25/5/05). O hospital
pertence à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), e
os parlamentares petistas consideram que sua transferência para uma
entidade do terceiro setor representa o início da privatização dos
serviços estaduais de saúde.
O presidente da comissão, deputado Adelmo Carneiro
Leão (PT), alertou para o risco de privatização no serviço da saúde,
no que foi endossado pelo deputado Rogério Correia (PT), que pediu a
realização da reunião. Correia alertou para os riscos que essa
mudança pode representar, como o repasse de patrimônio público para
entidades privadas, o fim de concursos para preencher cargos
públicos e a ameaça ao profissionalismo no serviço público. Ele
lembrou o déficit dos investimentos do Estado em saúde pública, já
acumulado em R$ 1 bilhão nos dois primeiros anos do governo Aécio
Neves. Segundo Rogério Correia, neste ano essa defasagem deve ficar
em R$ 760 milhões. "Não nos restou outra opção senão pedir uma CPI",
disse. Adelmo Carneiro Leão completou ao dizer que Minas Gerais é o
2o estado que menos investe em saúde no País.
Essa defasagem e o descumprimento da Emenda à
Constituição Federal 29, que fixa limites mínimos para investimentos
do Estado em ações e serviços básicos de saúde, levaram o Ministério
Público Federal a pedir ao Supremo Tribunal Federal que determinasse
intervenção federal no Estado em janeiro do ano passado, de acordo
com Rogério Correia. A deputada Jô Moraes (PCdoB) e o deputado Edson
Rezende (PT) também fizeram críticas ao novo modelo de administração
pretendido para o Hospital de Venda Nova.
O diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde
do Estado de Minas Gerais, Renato Barros, lembrou que a
transferência de hospitais públicos para oscips foi uma experiência
malsucedida em São Paulo. Segundo ele, 16 hospitais paulistas foram
assumidos por entidades do terceiro setor e o resultado foi aumento
dos custos hospitalares e imposição de limites ao atendimento para
garantir a sustentação financeira das unidades.
Já o diretor da Associação dos Trabalhadores em
Hospitais do Estado de Minas Gerais (Asthemg), Carlos Augusto dos
Passos Martins, reclamou que as mudanças na rede Fhemig não foram
discutidas com a sociedade. Para ele, o Estado deveria resolver os
problemas dos hospitais antes de pensar em transferir sua
responsabilidade para outros órgãos.
Para Estado, mudança vai melhorar
atendimento
Para o subsecretário de Inovação e Logística da
Secretaria de Estado da Saúde (SES), Marcelo Gouvêa Teixeira, a
transferência do Hospital de Venda Nova para uma oscip vai melhorar
a qualidade do atendimento prestado à população. De acordo com ele,
a entidade que assumir o hospital vai ter mais agilidade para
contratar profissionais, comprar material hospitalar e gerenciar o
orçamento da unidade. "Se o novo modelo pode melhorar a qualidade do
atendimento, é nosso dever fazer essa experiência em Venda Nova",
afirmou.
Ele citou pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo
Cruz que constatou melhor desempenho de hospitais administrados por
oscips em comparação com unidades da rede pública. Em São Paulo, de
acordo com a secretaria de Saúde daquele Estado, os hospitais
vinculados a oscips apresentam custo médio 20% inferior e
produtividade 37% superior às demais unidades estaduais. O índice de
satisfação dos pacientes é de 95%, segundo esse mesmo estudo
apresentado pelo subsecretário.
O edital de concurso de projetos para escolha da
entidade que vai assumir o Hospital de Venda Nova foi publicado no
dia 5 de abril. A oscip escolhida vai assinar com a SES um contrato
de 12 meses com um orçamento de R$ 31,7 milhões. Nesse contrato, a
entidade terá que oferecer o pacote de serviços e cumprir as metas
estabelecidas pela SES: 9 mil atendimentos, 8 mil consultas
ambulatoriais, 29 mil exames mensais e manutenção de 241 leitos. O
atendimento terá que ser gratuito e exclusivo aos usuários do
Sistema Único de Saúde (SUS), conforme detalhou Marcelo Gouvêa
Teixeira.
Podem participar da seleção oscips habilitadas pela
Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), ficando
vedada a participação de hospitais privados e planos de saúde. A
comissão julgadora das propostas será formada por representantes da
Seplag, SES, Fhemig e conselhos estadual e municipal de Saúde. Os
cerca de 500 profissionais contratados que trabalham no hospital
terão preferência no processo de seleção do novo quadro funcional. A
remuneração será com base na média salarial de hospitais privados do
mesmo porte. Os servidores efetivos (cerca de 50) poderão continuar
lotados em Venda Nova ou pedir transferência para outra unidade da
Fhemig.
A remuneração da oscip vencedora será com base no
pacote de serviços oferecidos, ao invés do número de procedimentos
realizados, como funciona no SUS. Uma comissão executiva vai
acompanhar o funcionamento do hospital e outra comissão de avaliação
vai verificar o cumprimento das metas acertadas. "Não há
possibilidade de transferência do patrimônio público para a
iniciativa privada. Estamos aliando a flexibilidade necessária para
o funcionamento de um hospital com o rigor no acompanhamento do
contrato", garantiu o subsecretário.
Promotora é contra transferência
O Ministério Público ajuizou uma ação civil com
pedido de liminar para anular o edital de concurso de projetos. O
pedido de liminar, no entanto, não foi deferido pelo juiz da
2a Vara Cível de Belo Horizonte. Para a promotora Josely
Ramos Pontes, responsável por essa ação, a Procuradoria Geral da
República deveria ser instada a mover uma ação direta de
inconstitucionalidade questionando a Lei 14.970, em vigor há dois
anos, que disciplinou a atuação das oscips no Estado. Na opinião da
promotora, essa lei fere tanto a Constituição Estadual quanto a
Federal.
Fhemig quer transferir unidades para
município
As mudanças na rede Fhemig não se restringem ao
Hospital de Venda Nova. Quatro unidades da fundação devem ser
assumidas pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) em breve: Unidade
de Pronto-Atendimento da Zona Leste, Centro Mineiro de Toxicomania,
Centro Psicopedagógico e Centro Geral de Reabilitação. O Hospital
Regional Cristiano Machado deve ser repassado para a prefeitura de
Sabará em regime de co-gestão. O presidente da autarquia, Luís
Márcio Araújo Ramos, garante que a qualidade do atendimento será
garantida, mesmo com a transferência. O Plano de Saúde Gestão 2005
tem como metas aumento de 50% na receita e redução de 15% nas
despesas da fundação.
O secretário municipal de Saúde de Belo Horizonte,
Helvécio Magalhães, informou que a PBH não tem interesse em
gerenciar outras unidades da Fhemig. Com os hospitais e centros
estaduais que fazem cirurgias e internações, o município prefere
firmar contratos de parceria, com metas de qualidade e quantidade de
atendimentos, assim como já fez com o Hospital das Clínicas e a
Santa Casa.
Deputados rebatem críticas ao governo
O líder do Governo na Assembléia, deputado Alberto
Pinto Coelho (PP), foi quem liderou a reação às críticas à
administração Aécio Neves. Segundo ele, a Emenda 29 ainda não foi
regulamentada pelo governo federal, o que permite ao Estado incluir
gastos com saneamento básico na rubrica de investimentos em saúde. A
atuação do governo, segundo ele, está amparada em uma decisão
normativa do Tribunal de Contas do Estado. Ele também reclamou que a
União investiu até agora somente 1% do que foi aprovado no Orçamento
2005.
O deputado Carlos Pimenta (PDT) avalia que o modelo
paulista não será seguido em Minas, e considera que a SES tem
credibilidade para afiançar o pacto com o terceiro setor. O deputado
Fahim Sawan (PSDB) disse que Minas é um dos Estados que recebem da
União a menor quantidade de investimentos em saúde per
capita. Ele apresentou um requerimento pedindo audiência pública
para discutir o assunto.
Outro requerimento aprovado, do deputado Paulo Piau
(PP), pede reunião conjunta com a Comissão de Defesa do Consumidor
para discutir mudanças pretendidas pela Agência Nacional de
Vigilância Sanitária que podem restringir a atuação das farmácias de
manipulação.
Presenças - Deputados
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente; Carlos Pimenta (PDT), vice;
Fahim Sawan (PSDB), Edson Rezende (PT), Alberto Pinto Coelho (PP),
Rogério Correia (PT), Rêmolo Aloise (PSDB), Doutor Viana (PFL),
Jésus Lima (PT), Jô Moraes (PCdoB), Dinis Pinheiro (PL), Sávio Souza
Cruz (PMDB), Adalclever Lopes (PMDB), Antônio Júlio (PMDB), Elisa
Costa (PT) e André Quintão (PT), além do representante do Ministério
da Saúde, Nilton Lemos, e do presidente do Sindicato dos Médicos de
Minas Gerais, Cristiano Gonzaga da Matta Machado.
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