Emater sugere que programa de biodiesel seja projeto
estruturador
A formulação de uma tributação estadual específica
para o biodiesel e a transformação do Programa Mineiro de Biodiesel
em projeto estruturador de governo foram alguns desafios apontados
pela Emater no painel "O biodiesel em Minas Gerais e no Brasil:
perspectivas e entraves", na tarde desta segunda-feira (23/5/05),
durante ciclo de debates promovido pela Assembléia. O presidente da
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas
Gerais (Emater), José Silva Soares, apresentou no evento as
conclusões do I Seminário Mineiro de Biodiesel, conduzido pela
empresa. Segundo ele, um dos temas mais polêmicos a serem analisados
pela ALMG será a definição de uma tributação para incentivar a
produção do biodiesel no Estado.
"Nossa preocupação é que as políticas públicas a
serem implementadas estejam sintonizadas com as necessidades do
homem do campo", apontou Soares. Ele demonstrou apreensão com o fato
de, no semi-árido mineiro, os agricultores terem muitas
desconfianças, em virtude de experiências anteriores frustradas de
implementação de culturas sem políticas públicas consolidadas. O
biodiesel tem como matérias-primas a mamona, o girassol, a soja e a
palma. A mesma preocupação foi expressada por Vilson Luiz da Silva,
da Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais
(Fetaemg), que representou a Confederação Nacional dos Trabalhadores
na Agricultura (Contag). "Precisamos de assistência técnica de
qualidade que atinja todos os agricultores familiares; de garantias
para o escoamento da produção e de certificação de sementes", cobrou
Vilson Silva.
Os representantes da Emater e da Fetaemg
apresentaram, no evento, suas visões sobre as perspectivas e
entraves da produção do biodiesel no Estado. Na parte da manhã, o
ciclo de debates promovido pela Assembléia trouxe ao Plenário
representantes dos Ministérios das Minas e Energia e do
Desenvolvimento Agrário, que falaram sobre o Programa Nacional de
Produção e Uso do Biodiesel, que privilegia a agricultura familiar
na produção de biocombustíveis oriundos das oleaginosas e prevê
incentivos fiscais e financeiros para essa produção. O representante
da Fetaemg afirmou que a entidade não é contra o programa, mas os
agricultores familiares precisam saber mais sobre o assunto. "Há
experiências que não foram boas e deixaram seqüelas. Precisamos de
garantias", reivindicou, afirmando que "a solução para o Brasil não
é a mamona".
José Silva Soares, da Emater, também apresentou
como outra conclusão do I Seminário Mineiro de Biodiesel a
necessidade de instituir uma comissão multissetorial para conduzir o
Programa Mineiro de Biodiesel. A Fetaemg cobrou, inclusive, a
participação nesse grupo. Outras deliberações do seminário foram:
criar uma câmara setorial do biodiesel, ligada ao Conselho Estadual
de Política Agrícola; estabelecer um zoneamento agrícola para as
oleaginosas; incentivar o associativismo e o cooperativismo para
organizar a produção da matéria-prima.
O presidente da Emater também apresentou números
que comprovam as perspectivas do biodiesel em Minas. Hoje, quando a
adição de 2% de biodiesel ao óleo diesel é facultativa, o mercado
potencial no Estado é de 100 milhões de litros/ano, 170 mil hectares
plantados e a perspectiva de geração de 25 mil postos de trabalho no
campo. Em 2013, quando for obrigatória a mistura de 5%, os números
pularão para 250 milhões de litros/ano, 425 mil hectares plantados e
50 mil postos de trabalho criados.
Mercadoria de interesse estratégico
Para Milton Nogueira da Silva, consultor
internacional do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia (Crea/MG), o biocombustível líquido tem que ser tratado
como mercadoria de interesse estratégico no século XXI, e não apenas
sob os pontos de vista de preço e cotas. Ele centrou sua
participação no ciclo de debates no aspecto geopolítico estratégico
da produção de biocombustíveis, sobretudo em função do Protocolo de
Kyoto, que estabelece metas para a redução, em nível internacional,
da emissão de gases poluentes.
Milton Nogueira explicou que os biocombustíveis,
além de captarem gás carbônico (dióxido de carbono - CO2) da
atmosfera com a plantação de oleaginosas, contribuem para reduzir a
emissão do mesmo gás ao substituírem os combustíveis fósseis, e que
isso, nos termos do Protocolo, pode ser objeto de negociações
internacionais. Segundo ele, são previstas algumas fórmulas de
negociação, e uma delas é o "mecanismo de desenvolvimento limpo", em
que, se um país tem débito na emissão de CO2, poderá compensar esse
débito em negociação com outro país que tenha crédito nesse item.
"Essa fórmula de negociação ainda é novidade no mercado mundial, mas
não pode ser desprezada sob o ponto de vista estratégico",
analisou.
Motivações do uso do biodiesel
Outro debatedor foi o gerente de Energia Renovável
da Diretoria de Desenvolvimento Energético da Petrobras, José Carlos
Gameiro Miragaya, que falou sobre a matriz energética dos
combustíveis veiculares no Brasil e apresentou dados sobre o
potencial dos biocombustíveis. No País, o diesel responde por 55,7%
do consumo de combustível veicular; a gasolina representa 35,3%; o
álcool, 6,6%; e o gás natural, 2,4%. As principais motivações para o
uso do biodiesel são o fato de ser uma fonte renovável de energia; a
economia de petróleo; a substituição da importação; a característica
de combustível limpo; o crédito de carbono e, o principal ponto, no
projeto do Governo Federal, a geração de emprego e renda.
Ao listar os ganhos ambientais do biodiesel,
Miragaya citou a redução da poluição nas grandes cidades, a redução
de 78% nas emissões de gás carbônico, a eliminação de enxofre, a
diminuição na emissão de monóxido de carbono (CO) e um ligeiro
aumento na emissão de óxido de nitrogênio. Sob o ponto de vista
social, o técnico da Petrobras destacou que a produção de biodiesel
é importante como indutora do desenvolvimento regional e na geração
de empregos, sobretudo nos casos das oleaginosas mamona e dendê,
que, diferentemente da soja, são intensivas em mão-de-obra. Quanto
às características tecnológicas, ele ressaltou a boa lubricidade do
biodiesel, a ausência de enxofre e a neutralidade em relação à
emissão de CO2 para a atmosfera, quando produzido a partir do
etanol.
Empresário desaconselha mamona como
matéria-prima
O último debatedor foi o presidente da Biobrás e
diretor da Soyminas Biodiesel, Artur Augusto Alves, que apresentou
estudos que apontariam a inviabilidade do uso da mamona para
produção de biodiesel no semi-árido, em função dos custos muito mais
elevados que nos casos da utilização da soja ou do nabo forrageiro.
Segundo ele, a única forma de se baixar o custo do biodiesel a
partir da mamona seria reduzir o preço pago aos agricultores.
No entanto, ele mostrou-se um entusiasta do
biodiesel, devido às características territoriais extremamente
favoráveis do Brasil, com sol em abundância e clima úmido. Para
ressaltar o potencial mercadológico do novo combustível, ele lembrou
que das 1.500 jazidas de petróleo existentes no mundo, apenas 48
foram descobertas após 1980, o que revela um esgotamento desse tipo
de combustível fóssil. Sem novas jazidas, houve um aumento na
exploração das atuais e, consequentemente, um encurtamento do tempo
de utilização dos recursos existentes. "O Brasil pode dominar grande
parte do mercado de combustíveis líquidos com o biodiesel",
avaliou.
Na opinião de Artur Alves, o projeto do biodiesel
tem que ser consistente, e não, fruto de um sonho. Assim, ele
aconselhou que a implantação do projeto leve em conta quatro
fatores: a definição da matéria-prima a ser utilizada, a localização
das plantas industriais, a implantação da cadeia produtiva e a
tecnologia a ser empregada. E finalizou defendendo subsídios para o
setor: "o Estado que não promover isenção de ICMS ou redução do
imposto, nos primeiros anos, não terá plantas instaladas em seu
território".
Os debates, na parte da tarde, foram coordenados
pelo deputado Márcio Kangussu (PPS).
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