CPI discute irregularidades no licenciamento de Capão
Xavier
Em reunião que durou mais de cinco horas, a CPI da
Mina Capão Xavier fez nesta quinta-feira (14/4/05) sua primeira
reunião com convidados, para ouvir o funcionário público Gustavo
Gazzinelli e o corretor Ricardo Santiago. Militantes da causa
ambientalista, os dois foram os primeiros a recorrer à Justiça para
tentar impedir a operação da Mina de Capão Xavier. Em dezembro de
2003, ajuizaram uma ação popular questionando o processo de
licenciamento ambiental da mina, que pertence à Minerações
Brasileiras Reunidas (MBR), subsidiária da Companhia Vale do Rio
Doce.
Última grande reserva de minério de ferro de alta
qualidade ainda inexplorada no Quadrilátero Ferrífero, Capão Xavier
vem despertando muita polêmica porque está localizada próxima dos
mananciais de Mutuca, Ferros, Catarina e Barreiro, responsáveis pelo
abastecimento de água de mais de 300 mil pessoas da Região
Metropolitana de Belo Horizonte. Além disso, o processo de
licenciamento ambiental para operação da mina teria apresentado
várias irregularidades, como afirmaram os dois convidados da CPI.
Eles temem o impacto negativo da mineração sobre a qualidade das
águas e criticaram a atuação do Conselho Estadual de Política
Ambiental (Copam). Segundo eles, a câmara de atividades minerárias
do Copam, que autorizou a exploração da mina, estaria comprometida
com os interesses das mineradoras.
De acordo com o corretor Ricardo Santiago, Capão
Xavier fica dentro da Área de Proteção Ambiental da Mutuca, em Nova
Lima. Ele conta que o próprio Instituto Estadual de Florestas (IEF)
admite que não existe possibilidade de explorar o minério de ferro
sem rebaixar o lençol freático. Capão Xavier vai exigir a construção
de uma cava de 1.800 metros de comprimento por 800 metros de
largura, com profundidade de 270 metros. Santiago, formado em
engenharia civil, mostrou as conclusões do estudo de impacto
ambiental elaborado pela própria MBR. "Os engenheiros da MBR são
unânimes em afirmar que pode haver redução de 40% na vazão de água
desses mananciais", disse.
Relatório prevê possibilidade de
contaminação
Santiago informou que essa água é de classe
especial, extremamente pura, e não exige processos complicados de
tratamento para que ela se torne potável. O estudo de impacto
ambiental prevê que a água das nascentes próximas a Capão Xavier
pode se tornar de classe 2, com grande quantidade de impurezas.
Quando a mina estiver esgotada, em 2025, a cava dará lugar a um lago
cujas águas não têm previsão para utilização para consumo humano. De
acordo com Santiago, o estudo de impacto ambiental prevê que poucos
detritos serão despejados no lago por conta da maior conscientização
ecológica da população e da melhoria das condições sanitárias da
Grande BH no futuro.
Futuramente, o relatório da MBR prevê também a
possibilidade, ainda que pequena, de contaminação do lago por gás
sulfídrico, algas cianídricas (que produzem material tóxico) e
poluição por eutrofização (processo natural de aumento de material
orgânico em ecossistemas lacustres). Santiago mostrou-se indignado
com o fato de o relatório amparar a operação de Capão Xavier em toda
a legislação federal e estadual que regulamenta o assunto, com
exceção de uma lei: a de número 10.793, de 1992, que proíbe a
instalação de atividades minerárias em bacias de mananciais no
Estado.
Outra irregularidade apontada pelos dois convidados
da reunião é a contratação da empresa espanhola Frasa Ingenieros
pela MBR para a elaboração da análise preliminar que serviu de base
para o estudo de impacto ambiental de Capão Xavier. De acordo com
Ricardo Santiago, a empresa não tem registro no Conselho Regional de
Arquitetura, Engenharia e Agronomia (Crea-MG), e portanto, não
estaria autorizada a fazer esse tipo de trabalho. O estudo prévio
foi entregue em espanhol, o que não é permitido pela legislação
brasileira, segundo o engenheiro.
Projeto não foi discutido com população de Belo
Horizonte
Segundo Gustavo Gazzinelli, a aprovação para
funcionamento de Capão Xavier foi precedida de um termo de
compromisso firmado entre a MBR e a Prefeitura de Belo Horizonte
(PBH). Por esse acordo, em caso de acidente na mineração que
comprometesse os mananciais, uma comissão analisaria o caso e
proporia alterações somente para o plano de lavra seguinte, para que
o problema não se repetisse. Mas cada plano de lavra dura cinco
anos, segundo Gazzinelli. "Coincidentemente, na mesma época (março
de 2003), a PBH recebeu da MBR uma doação de R$ 1,5 milhão para
construir casas para as vítimas das chuvas", denunciou.
A ação popular também acusa a ausência de uma
audiência pública com a população de Belo Horizonte para discutir a
permissão para atividades minerárias na área de preservação
ambiental. O Conselho Municipal de Meio Ambiente enviou ao Copam uma
moção pedindo uma audiência pública na Capital para discutir o
assunto. "Pouco tempo depois, o secretário municipal de Meio
Ambiente de BH foi exonerado e parte de sua equipe pediu demissão.
Parece que a pressão contra essa audiência era muito grande", acusou
Gazzinelli.
De fato, uma audiência pública para tratar do
assunto foi realizada no Jardim Canadá, bairro de Nova Lima vizinho
ao empreendimento. Mas os ambientalistas reclamam que a maior parte
da população de Belo Horizonte foi alijada do processo de discussão.
Segundo Gazzinelli, o governo do Estado se recusou a promover uma
audiência para discutir a questão. "Decisões desse tipo tomadas sem
ouvir a comunidade podem até ser legais, mas não têm legitimidade",
criticou.
Deputado questiona acusações contra o Copam
O deputado Domingos Sávio (PSDB) fez longos
questionamentos sobre as acusações feitas pelos dois convidados e
exigiu provas das irregularidades apontadas no Copam. "O Copam é um
avanço democrático que precisa ser respeitado. A decisão desse
conselho pode ser revista pelo Judiciário, mas ele não pode ser
simplesmente amesquinhado, colocado sob suspeita. Seus integrantes
são figuras notórias da sociedade, que trabalham sem receber
remuneração", afirmou.
O deputado Adalclever Lopes (PMDB) apontou o nome
do conselheiro João Henrique Grossi Saad, que segundo ele, presta
serviços para a MBR e teria sido um dos responsáveis pela absolvição
de multas aplicadas pelo Copam à mineradora. Domingos Sávio replicou
dizendo que pretende convidar o acusado para prestar esclarecimentos
à comissão, idéia concretizada na forma de um requerimento da
deputada Lúcia Pacífico (PTB). Adalclever Lopes então reclamou que
Domingos Sávio estava coagindo os convidados e acabou se retirando
da reunião, juntamente com os demais colegas de partido.
Foram apresentados outros três requerimentos
durante a reunião. Dois são de autoria do deputado Antônio Júlio
(PMDB) e solicitam as cópias das atas das seções da câmara de
atividades minerárias do Copam nos anos de 2002, 2003 e 2004. O
segundo requer que o cartório de registro de imóveis de Nova Lima
certifique quais imóveis estão no nome da MBR na cidade, suas
utilidades e qual a natureza dos títulos registrados.
O deputado Irani Barbosa (PTB) teve aprovado
requerimento de sua autoria para que sejam convidados a comparecer à
comissão representantes das ONGs Greenpeace e WWF-Brasil para
discutir se o padrão de mineração da Companhia Vale do Rio Doce e
suas empresas controladas estão dentro das normas ecológicas
internacionais.
Mananciais são última reserva de água pura da
região
Os mananciais de Mutuca, Fechos, Catarina e
Barreiro constituem a última grande reserva de água subterrânea do
Quadrilátero Ferrífero. A região, que se industrializou graças à
extraordinária quantidade de minério de ferro que constitui
importante produto da pauta de exportações mineira, também apresenta
grande quantidade de reservas de água pura no subsolo. O ferro é um
mineral poroso que permite a infiltração da água da chuva. Por isso,
a Serra da Moeda é um grande aqüífero, além de divisor de águas das
bacias do Rio das Velhas e do Paraopeba, dois afluentes do São
Francisco. "Esses quatro mananciais foram preservados com muito
sacrifício e são reservas de água estratégicas para Belo Horizonte",
afirmou Gazzinelli.
É por isso que o polêmico processo de licenciamento
ambiental de Capão Xavier foi marcado por vários questionamentos
judiciais. Gustavo Gazzinelli, Ricardo Santiago e Otávio Freitas
ajuizaram uma ação popular para impedir a autorização de exploração
da mina em 15 de fevereiro de 2003. Dois dias depois, eles
conseguiram uma liminar suspendendo o processo de licenciamento.
Duas semanas mais tarde, o desembargador Caetano Levi suspendeu os
efeitos da liminar. Atualmente, o processo corre na 5a
Vara da Fazenda Pública Estadual e está em fase de coleta de provas
(análise pericial).
Os deputados Antônio Júlio e Adalclever Lopes,
ambos do PMDB, movem uma ação na Justiça Federal contra o
licenciamento de Capão Xavier. No processo, eles alegam que a
operação da mina pode representar riscos para cavernas, grutas e
sítios arqueológicos localizados nos arredores da mina. O Ministério
Público do Meio Ambiente também move uma ação civil pública contra
Capão Xavier por causa dos riscos para os mananciais de água.
Presenças - Deputados
Márcio Kangussu (PPS), presidente; Biel Rocha (PT), vice; Domingos
Sávio (PSDB), relator; Leonardo Moreira (PL), Lúcia Pacífico (PTB),
Irani Barbosa (PTB), Leonardo Quintão (PMDB), Jayro Lessa (PL),
Adalclever Lopes (PMDB), Elisa Costa (PT), Ivair Nogueira (PT) e
Sargento Rodrigues (PDT).
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