Diretor de penitenciárias em Juiz de Fora é indiciado por
tortura
A Polícia Civil vai pedir o indiciamento do diretor
das penitenciárias José Edson Cavalieri e Ariosvaldo Campos Pires,
em Juiz de Fora, pela prática de tortura e maus tratos cometidos
contra detentos. O diretor das duas unidades, Flávio Moreira de
Oliveira, e o agente penitenciário Sérgio Rodrigues Ribeiro, o
"Serjão", teriam espancado e aplicado choques elétricos nos presos.
O resultado das investigações, conduzidas pelo delegado Eurico da
Cunha Neto, foi apresentado na reunião da Comissão de Direitos
Humanos da Assembléia Legislativa realizada na manhã desta
quinta-feira (25/11/04).
Segundo o delegado, foram comprovados sete casos de
agressões: contra os detentos Renato Ferreira Teixeira, Iuri de
Oliveira Alonso, Davi Vicente, Aloísio Prata, César Soares e Eduardo
Faria. O inquérito aponta também que o preso Carlos Fernando de Melo
foi espancado, mas os agressores não foram identificados por estarem
encapuzados, e portanto, não foram indiciados. Na investigação, o
delegado ouviu presos e diretores das penitenciárias e anexou
denúncias anônimas, mas os depoimentos decisivos foram dados por
agentes penitenciários. "Os indiciamentos se deram por testemunhos
de agentes que presenciaram ou ouviram as agressões", esclareceu
Eurico Cunha Neto.
O inquérito comprovou denúncia recebida pela
Comissão de Direitos Humanos em visita à Penitenciária José Edson
Cavalieri no dia 21 de outubro deste ano. Naquela ocasião, os presos
relataram aos deputados casos de espancamentos e choques elétricos
por parte do diretor do presídio e de "Serjão". Os presos contaram
que os cassetetes usados nas agressões foram apelidados de "direitos
humanos" e "Nilmário Miranda" (referência ao secretário nacional de
Direitos Humanos), o que foi confirmado na investigação da polícia.
Na mesma ocasião, os dois acusados negaram envolvimento com essas
agressões e associaram as denúncias à tentativa de impor maior
disciplina entre os detentos.
O inquérito, instaurado no dia 5 de outubro, foi
concluído na última quarta-feira (24). O delegado Eurico Cunha Neto
disse que o inquérito vai ser remetido à Justiça nesta sexta-feira
(26) ou no máximo, no início da próxima semana. Uma cópia do
resultado das investigações foi entregue à Comissão de Direitos
Humanos.
Diretor da penitenciária ainda não foi
afastado
O representante da Subsecretaria de Estado de
Administração Penitenciária, José Soares, esclareceu que já foi
instalada uma sindicância para apurar o envolvimento de Flávio
Moreira de Oliveira no episódio. Segundo ele, o relatório final da
sindicância deve ser apresentado até o próximo 4 de dezembro. Até
lá, o diretor continua à frente das duas penitenciárias de Juiz de
Fora. "Nossa posição é aguardar uma decisão judicial sobre o caso
para depois tomar uma providência, que pode ser punição, demissão ou
exoneração", explicou.
O subsecretário de Estado de Direitos Humanos, João
Batista de Oliveira, considerou uma afronta os apelidos dados aos
cassetetes utilizados nas agressões e defendeu punição rigorosa para
todos os agressores. "O crime de tortura é uma violação da
Constituição. A posição do governo é que os crimes dessa natureza
sejam julgados como violação dos direitos humanos, e portanto, como
violação da Constituição", afirmou. O subsecretário também defendeu
o afastamento de Flávio Moreira de Oliveira de suas funções para não
atrapalhar o andamento das investigações sobre o caso.
Os agentes penitenciários Sandro Henrique Menezes e
Leonardo Pinto da Silva foram demitidos supostamente por terem
colaborado com as investigações da Polícia Civil sobre o caso,
conforme denunciou o representante do Sindicato dos Servidores
Penitenciários da Zona da Mata, Wellington Luiz Moreira. Ele acusou
a demissão dos colegas como um ato de retaliação e apelou para que a
comissão interceda pela recontratação dos dois ex-agentes
penitenciários.
Deputados querem afastamento do diretor
A posição da Subsecretaria de Estado de
Administração Penitenciária motivou críticas dos deputados e demais
convidados do debate. A coordenadora do movimento Tortura Nunca
Mais, Heloísa Greco, considerou um absurdo o não-afastamento
imediato de Flávio Moreira de Oliveira da direção das penitenciárias
José Edson Cavalieri e Ariosvaldo Campos Pires. "Isso demonstra que
a cultura da impunidade ainda está arraigada na nossa sociedade",
criticou.
O deputado Roberto Ramos (PL) lembrou que a decisão
judicial sobre o caso pode demorar um mês ou dois anos e disse que o
afastamento não tira o direito de defesa do diretor. "O inquérito
policial não pode servir de base para pedir o afastamento? Será que
vocês (da subsecretaria) não confiam na investigação da polícia?",
questionou. O deputado Biel Rocha (PT) lembrou que a comissão já
tinha solicitado à Secretaria de Defesa Social o afastamento de
Flávio Moreira de Oliveira de suas funções, e sequer recebeu uma
resposta. O deputado Durval Ângelo (PT) também defendeu o
afastamento imediato do diretor. "É o primeiro caso em que sabemos
que o diretor da penitenciária participou da tortura", destacou.
O único deputado que saiu em defesa de Flávio
Moreira de Oliveira foi Leonardo Moreira (PL). Ele disse que é
contra qualquer tipo de tortura mas pediu cautela para que o diretor
não seja condenado injustamente antes de qualquer julgamento.
"Conheço Flávio Moreira de Oliveira, pai de família que não tem
nenhum antecedente criminal. Não levemos ninguém a uma condenação
sumária sem direito a ampla defesa", pediu.
Requerimentos - A comissão
aprovou quatro requerimentos cobrando providências para o caso de
Juiz de Fora (todos de autoria conjunta dos deputados Durval Ângelo,
Biel Rocha e Roberto Ramos):
* reiterando à Secretaria de Defesa Social o pedido
de afastamento de Flávio Moreira de Oliveira e Sérgio Rodrigues
Ribeiro de suas funções;
* pedindo à Secretaria de Defesa Social a
readmissão dos agentes penitenciários Sandro Henrique Menezes e
Leonardo Pinto da Silva (aprovado com abstenção de Roberto
Ramos);
* encaminhando o inquérito da Polícia Civil para a
Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão da Organização dos
Estados Americanos;
* remetendo o mesmo inquérito ao secretário
nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda.
CPT entrega dossiê sobre violência no campo
Durante a reunião, representantes da Comissão
Pastoral da Terra (CPT) entregaram à comissão um dossiê sobre a
violência cometida por milícias armadas contra camponeses em Minas
Gerais. "É preciso vontade para resolver essa problemática sem
violência. Os miseráveis estão gritando por justiça", afirmou o
bispo Dom Hugo Steekelenburg, de Almenara, que manifestou repúdio à
chacina de sem-terra em Felisburgo e cobrou da comissão providências
para os conflitos agrários.
Pouco antes, o bispo e outros representantes da
CPT, do Movimento dos Sem-Terra (MST) e de outras entidades
concederam entrevista coletiva na Sala de Imprensa da Assembléia.
Eles denunciaram a violência de milícias armadas a mando de
latifundiários contra camponeses em Minas Gerais e exigiram ações do
governo no sentido de tornar mais ágil a reforma agrária em todo o
País.
O deputado Durval Ângelo lembrou que a Comissão de
Direitos Humanos esteve em Felisburgo em junho de 2002 para tentar
intermediar uma solução para o problema da ocupação da Fazenda
Aliança. Ele garantiu que vai continuar cobrando providências para a
questão agrária e anunciou que vai protocolar um requerimento para a
instalação de uma Comissão Especial das Milícias Armadas na
Assembléia.
Montalvânia - Ao final da
reunião, os deputados ainda ouviram denúncias de tortura sofrida por
Adonias de Oliveira Ramos dentro da delegacia de polícia de
Montalvânia, no Norte de Minas.
Presenças - Deputados
Durval Ângelo (PT), presidente; Roberto Ramos (PL), vice; Biel Rocha
(PT) e Leonardo Moreira (PL). Também participaram da reunião o
superintendente regional de Polícia Civil, Eduardo Menezes, e o
delgado regional de Juiz de Fora, Antônio Garcia Freitas.
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