Implantação de sistema nacional de cultura vai articular ações

O fortalecimento institucional do Ministério da Cultura e da implantação do Sistema Nacional de Cultura, com a partic...

08/09/2004 - 10:40
 

Implantação de sistema nacional de cultura vai articular ações

O fortalecimento institucional do Ministério da Cultura e da implantação do Sistema Nacional de Cultura, com a participação articulada entre União, Estados e municípios, nos moldes do Sistema Único de Saúde, é o caminho que o governo federal tem tomado para fortalecer as políticas públicas nesse setor. Foi o que explicou o secretário de Articulação Institucional do Ministério da Cultura, Márcio Augusto Freitas de Meira, que participou do primeiro dia do Fórum Técnico Cultura: Política e Financiamento, uma realização conjunta da Assembléia Legislativa de Minas Gerais e a Secretaria de Estado de Cultura, nesta segunda-feira (30/8/04). O encontro se estende até esta quarta-feira (1º), no Plenário.

De acordo com Meira, o objetivo do governo federal é iniciar a implantação de acordos de cooperação entre os entes federados, baseados em outros sistemas públicos já existentes, ainda este ano. Para o funcionamento do sistema, cada ente deverá manter um órgão governamental, como uma secretaria, por exemplo, para coordenar as políticas; e criar conselhos fortes, com a participação paritária da sociedade civil. A criação e o fortalecimento de legislações de incentivo ao financiamento cultural e o planejamento compartilhado a curto, médio e longo prazo também são prioridades de ação do Ministério da Cultura.

Ainda segundo o secretário de Articulação Institucional, o Ministério vem trabalhando com três pilares. O primeiro é a cultura ser considerada como direito social, conforme a Constituição Federal, tendo o cidadão como alvo das políticas públicas - e não os artistas e produtores culturais. O segundo aspecto, de acordo com o secretário, é considerar a cultura como aspecto fundamental da construção da identidade e da diversidade do Brasil, inclusive para reconhecimento internacional do País. Por fim, a influência da cultura na economia também é outro pilar fundamental para o fortalecimento das políticas públicas: "A cultura tem participação efetiva no PIB e isso deve ser tema de qualquer política voltada para o setor".

Silva pede comissão permanente

A necessidade de compreender a cultura como importante segmento na área econômica também foi bastante ressaltada pelo secretário de Estado de Cultura, Luiz Roberto do Nascimento e Silva. "Há um certo pudor de se associar cultura e processo econômico, apesar de ela ser empregadora maciça de mão-de-obra. Na Região Metropolitana de Belo Horizonte, por exemplo, o setor é a sexta atividade econômica fundamental", analisou o secretário, lembrando que o grau de informalidade e a sazonalidade são fatores que podem "escapar" das pesquisas. "Nossa tarefa é grandiosa mas difícil, pela pluralidade. No setor cultural acontece um fenômeno importante: todos os recursos oferecidos são captados", afirmou.

Ao final de sua exposição, o secretário fez um apelo: a criação de uma comissão permanente na Assembléia Legislativa para tratar especificamente da área cultural. "É preciso ter essa especialidade porque lidamos com um público muito diferenciado", defendeu. Outra sugestão dada por Luiz Roberto do Nascimento e Silva foi, além de manter o percentual previsto na lei estadual de incentivo à cultura, criar um fundo alternativo voltado para projetos sem grande apelo mercadológico.

Deputado ressalta potencial do Estado

A abertura do Fórum Técnico Cultura: Política e Financiamento" foi feita pelo autor do requerimento pela realização da atividade, deputado Domingos Sávio (PSDB), que representou o presidente da Assembléia, deputado Mauri Torres (PSDB). "Minas tem muitas possibilidades culturais, mas uma análise quantitativa e qualitativa nos mostra que a produção cultural do Estado ainda possui um grande campo a ser explorado", afirmou Domingos Sávio, que também destacou a cultura como indutora do desenvolvimento de outros campos da sociedade. O parlamentar lembrou que a Assembléia também organizou uma discussão sobre o setor cultural na década de 90, que acabou resultando na reformulação da política cultural do Estado.

Também participou da mesa da manhã o deputado André Quintão (PT). Ele ressaltou a importância de o fórum técnico ser realizado pela Assembléia e pela Secretaria de Cultura neste momento: "A Assembléia vai fazer, no mês de outubro, a primeira revisão participativa do Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG), que estipula prioridades para os quatro anos de governo", afirmou.

Investimento em cultura ainda é baixo no interior do Estado

O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), Octávio Elísio Alves de Brito, ressaltou a importância de haver articulação entre os diversos entes públicos para que a política cultural seja permanente e efetiva em Minas Gerais. Para ele, que participou do Fórum sobre financiamento da cultura, na manhã desta terça-feira (30/08/04), no Plenário da Assembléia, o diálogo entre os produtores da cultura e os atores políticos também é fundamental, uma vez que da Assembléia Legislativa saem as leis onde são definidas as questões básicas relacionadas ao financiamento da cultura. Octávio Elísio lembrou que a Constituição Federal de 1988 define cultura como direito do cidadão; sendo o Estado responsável por garantir o acesso de todos aos bens culturais.

Octávio Elísio cita o instituto do tombamento como fundamental para a proteção do patrimônio cultural do Estado. Segundo ele, a legislação vigente no Estado incentiva os municípios a inventariarem seu patrimônio, ao conceder pontos, que depois são revertidos em recursos aos que têm bens tombados. "O que antes era um entrave para a cidade, agora é fonte de receita". De acordo com o presidente do Iepha, hoje já são mais de três mil bens municipais tombados, um número que também demonstra quão importante é o papel do município na gestão do espaço urbano. O desafio, admite ele, é fiscalizar a aplicação dos recursos arrecadados, e que deveriam ser reinvestidos em cultura, o que nem sempre acontece.

Municípios precisam de assessoria para apresentar bons projetos

O superintendente da Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage, José Alberto Pinho Neves, de Juiz de Fora, disse que aquela prefeitura investe 1,75% de seu orçamento em cultura, com projetos de incentivo à leitura e ao desenvolvimento da literatura, entre outros. Na opinião dele, a Lei estadual 11.726, de 1994, precisa ser reformulada para continuar cumprindo seu papel, e valorizar os produtores culturais do Estado, inclusive os do interior. José Alberto fez uma ressalva com relação à postura do Estado e daqueles que produzem cultura: "o interior precisa ser valorizado pelo Estado, mas as propostas que vêm dos pequenos municípios precisam ter qualidade, e não apenas quantidade", afirmou.

Provocado por um dos participantes do Fórum, sobre o que é ou deixa de ser um bom projeto cultural, o superintendente evitou a polêmica, afirmando que os projetos vindos do interior não conseguem financiamento, freqüentemente, por não terem a forma adequada à lei. "Muitas vezes o município precisa de apoio logístico para apresentar boas propostas", lamentou. O secretário de Estado da Cultura, Luiz Roberto do Nascimento e Silva concordou com o representante de Juiz de Fora: " É verdade que há produtores e grupos culturais que não têm condições de preencher tantos formulários, contratar advogados etc."

Instâncias do poder público devem ter competência estabelecida

O presidente da Fundação Clóvis Salgado (FCS), Mauro Guimarães Werkema, foi o palestrante da tarde desta segunda-feira (30/8/04) do Fórum Técnico Cultura: Política e Financiamento, realizado no Plenário da Assembléia Legislativa. Werkema disse que no Brasil não há uma política clara que estabeleça as competências específicas da União, do Estado e do município. Isso, segundo ele, gera uma superposição de ações na área da cultura.

O executivo defendeu um mecanismo de financiamento diferenciado para o teatro, opinião contestada pelo presidente da Associação Artística dos Músicos de Minas Gerais, Weber Lopes: "Precisamos exigir políticas especiais para todos os setores culturais, pois cada um deles tem as suas especificidades", argumentou.

Lembrando que a produção cultural brasileira depende principalmente das leis de incentivo, o que faz com que a maior parte dos recursos seja empregado pelo poder público, Werkema falou sobre as dificuldades para que Estados e municípios financiem iniciativas culturais, dada a sua "crônica crise financeira". Finalmente, o presidente da FCS defendeu a maior integração entre cultura e turismo, como ocorre na Bahia.

O diretor da Superintendência de Ação Cultural da Secretaria de Estado da Cultura, José Eduardo Castro Liboreiro, endossou as declarações de Werkema e informou que apenas dez empresas são responsáveis por 90% do patrocínio cultural no Estado. Já o professor da PUC Minas José Márcio Barros falou da importância das cidades para a cultura, uma vez que é nelas que as atividades se realizam. Ele defendeu a reativação do Conselho Estadual de Cultura como órgão de regulação social e fiscalização da política de incentivo à cultura e ainda a maior presença da arte nas universidades.

Mais verba e menos verbo

Uma postura mais ácida a respeito das omissões do poder público em relação à cultura foi mostrada pelo diretor de teatro Pedro Paulo Cava, que se colocou como porta-voz da resistência cultural mineira. "Nós, que escolhemos viver e trabalhar neste Estado que é tão difícil para a cultura como para qualquer outra atividade, não podemos ficar reféns do Estado e das leis de incentivo à cultura, nem ficar sempre falando as mesmas coisas em inúmeros seminários como este. O que a Cultura precisa é mais verba e menos verbo", disparou.

Desde os anos 70, quando começou sua militância no teatro em Minas, Cava notou que havia seis teatros em Belo Horizonte, todos do poder público, e que agora há 45 espaços particulares, e que hoje há uma centena de companhias teatrais, e inúmeras galerias. "Ou seja, o Estado cresceu culturalmente e hoje possui o maior PIB cultural do país. Há 80 casas de espetáculos no interior, o que permitiria fazer um circuito para apresentação de peças e exposições de arte", informou. O teatrólogo também denunciou que existe um hiato entre as peças destinadas ao público infantil e ao público adulto. "A falta de formação teatral para os adolescentes é uma lacuna que veio da ditadura", disse Cava.

Em seguida, o coordenador dos trabalhos da tarde, deputado André Quintão (PT), abriu a palavra para a platéia. Inúmeras pessoas foram ao microfone, dividindo-se entre formular questões aos expositores, encaminhar críticas e formular propostas. Entre estas contribuições, houve quem lembrasse que os municípios ignoram que podem usar parte do seu ISS e do IPTU para apoiar grupos culturais locais, houve cobrança sobre a prioridade que deveria haver na lei de incentivo à cultura para proteger patrimônio tombado, houve discussão sobre a descentralização da cultura através de instâncias regionais formadas a partir de uma sólida base municipal.

O cerne do debate foi a ampliação de 0,3% para 0,5% a renúncia fiscal para financiamento da cultura. Muitos consideraram esse acréscimo de R$ 14 a R$ 15 milhões "uma miséria", ou "uma gota d'água num oceano de carência", mas o deputado Domingos Sávio (PSDB), que participou da mesa, pregou uma postura mais realista, e lembrou que nem esse benefício estava assegurado. "Depois que todos nós estivermos de acordo a respeito desse ponto, ainda teremos que enfrentar a resistência da Secretaria da Fazenda em aumentar a renúncia fiscal", disse o deputado.

José Eduardo Liboreiro, provocado pela platéia, disse que as grandes empresas estão criando seus próprios institutos e fundações e ali aplicam os recursos que deveriam distribuir pelos empreendedores culturais, e disse que a Lei Rouanet precisa de aperfeiçoamentos. Mauro Werkema também criticou a excessiva concentração de incentivos no eixo Rio-São Paulo.

Outro tema que mobilizou os participantes foi levantado por Pedro Paulo Cava, que lembrou a omissão do Banco Itaú nas questões culturais. "Esse banco ganha uma fábula para administrar as contas do Governo de Minas e não retorna nada para a sociedade mineira. O Itaú Cultural nem sequer existe mais", denunciou. O deputado Domingos Sávio confirmou que o Banco Itaú "lucra bilhões" em Minas, e disse que um projeto seu cria na Assembléia a Comissão Permanente de Cultura, que teria força institucional para apoiar essas atividades no Estado.

Ao encerrar a reunião, o deputado André Quintão informou que a ata com a transcrição completa dos pronunciamentos do fórum será publicada no sábado, dia 18 de setembro, e que a data da reprise pela TV Assembléia, para quem desejar gravar a íntegra do fórum, será divulgada após a plenária do dia 1º de setembro.

 

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