Comissões discutem atuação da máfia das notas frias

O esquema de fraudes fiscais com o uso de notas frias ou falsas no setor siderúrgico é complexo e envolve a participa...

24/06/2004 - 00:01
 

Comissões discutem atuação da máfia das notas frias

O esquema de fraudes fiscais com o uso de notas frias ou falsas no setor siderúrgico é complexo e envolve a participação não só de empresas de fachada e de "laranjas", mas, também, de grandes empresas do setor. Há anos, os envolvidos aproveitam-se de brechas na legislação e de falhas na fiscalização para lesar os cofres públicos em milhões de reais. Isso é o que se pode concluir da audiência pública realizada nesta quinta-feira (24/6/04) pelas comissões de Fiscalização Financeira e Orçamentária e de Segurança Pública da Assembléia de Minas, em que os deputados ouviram esclarecimentos de integrantes da força-tarefa que investiga a atuação da chamada "máfia da nota fria" e do empresário Evandro Torquette, um dos operadores do esquema.

O uso das notas frias veio a público com o assassinato do assessor parlamentar Jair Olímpio Júnior, no último dia 31 de março, que teria sido morto a mando do empresário Evandro Torquette. Em seu depoimento, Torquette negou ter sido o mandante do assassinato e disse que seu negócio sempre foi "comprar e levantar empresas em dificuldades". Uma das empresas que adquiriu, há pouco mais de um ano, foi a Ferrum Ltda, de Bocaiúva, registrada em nome de Jair Olímpio. Segundo investigações da Polícia Civil, Jair foi morto por ameaçar os participantes do esquema.

Torquette admitiu o envolvimento das grandes empresas siderúrgicas no esquema das notas frias. "Quando falta gusa no mercado, todas as empresas compram: a Gerdau, a Mannesmann, a Usiminas, a Belgo Mineira", afirmou. Isentando-se de responsabilidade, ele confessou a existência de notas falsas da empresa Ferrum e informou que conseguiu, junto à Agência Fazendária, o desbloqueio de um talão de notas fiscais. Admitiu, também, a compra de gusa "sem pintura" de atravessadores; mas falou que a venda de cerca de mil toneladas de gusa para a Belgo Mineira foi feita com notas autênticas e que recebeu em dinheiro.

Promotor denuncia engenharia da sonegação

O promotor de Justiça Fernando César Mattos, que também integra a força-tarefa, resumiu as dificuldades na repressão aos crimes fiscais dizendo que o que há é uma verdadeira "engenharia de sonegação" em Minas Gerais, e que "o crime organizado é mais rápido e mais dinâmico que a estrutura do Estado". Ele disse que algumas ações já desenvolvidas conjuntamente pela Secretaria da Fazenda e Ministério Público tiveram bons resultados, e mais de dez fiscais foram presos por envolvimento com a máfia da sonegação.

Fernando Mattos estimou que, no setor guseiro, a arrecadação pode aumentar dez vezes com o combate à sonegação. Para ele, uma das metas deve ser acabar com a intermediação no setor: "Não consigo entender como grandes empresas, como a Belgo e a Votorantim, compram gusa de intermediários; valem-se de intermediários para sonegar. Se compram de intermediários, num Estado que é o maior pólo da siderurgia nacional, é porque tem alguma falcatrua", sentenciou.

Receita investiga setor guseiro

O subsecretário da Receita Estadual, Pedro Meneguetti, disse que a Secretaria da Fazenda está desenvolvendo um projeto de ações fiscais especificamente no setor de ferro gusa e que, das 79 empresas do setor no Estado, 16 já foram fiscalizadas em 2004. Ele demonstrou confiança na recuperação de parte dos valores devidos, e disse que a receita gerada pelo setor guseiro passou de R$ 45 milhões, em 2002, para R$ 77 milhões, em 2003. Nos cinco primeiros meses de 2004, a arrecadação chegou a R$ 36 milhões. Segundo ele, o trabalho do fisco é complexo não apenas em função do grande número de novas inscrições de empresas junto à Receita - cerca de 30 mil por ano -, mas, também, pelo fato de que não adianta autuar os "laranjas" em nomes dos quais as empresas são registradas. "Muitas vezes, tudo o que o laranja quer é ser autuado", declarou, explicando que este não é o melhor caminho para se combater a sonegação e recuperar créditos.

Legislação incentiva sonegação

O procurador e coordenador do Centro de Apoio Operacional de Combate ao Crime Organizado e de Investigação Criminal (CAO Crimo), André Estevão Ubaldino Pereira, criticou a legislação que permite ao sonegador não ser punido se recolher o que deve aos cofres públicos. "O que era para ser um instrumento para aumentar a arrecadação acabou incentivando a sonegação", avaliou. André Ubaldino disse que o Legislativo pode contribuir para a correção de alguns equívocos mudando a lei; e frisou que a extinção da punibilidade para quem negociar o pagamento do débito acabou por tornar a prática "extremamente difusa e freqüente".

O deputado Chico Simões (PT) apontou a omissão do Estado como uma das causas da fraude fiscal, ao lado das "brechas legais". O parlamentar citou o crescimento do crédito tributário de algumas grandes empresas, nos últimos dois anos, para concluir que essas empresas estão agindo como "receptadoras de notas frias", com a conivência do Estado.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Ermano Batista (PSDB), Jayro Lessa (PL), Chico Simões (PT), Doutor Viana (PFL), José Henrique (PMDB), Sebastião Helvécio (PDT) e Antônio Júlio (PMDB).

 

 

 

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