CPI do Café ouve denúncias de desvio de recursos do
Recoop
O possível desvio de verbas do Programa de
Recuperação de Cooperativas (Recoop) destinadas ao saneamento de
cooperativas, e a sonegação de tributos federais pela empresa
Cerealista Monte Dourado, de São Gonçalo do Sapucaí, Sul de Minas,
foram os temas da reunião da CPI do Café da Assembléia Legislativa
nesta quinta-feira (17/6/04), a requerimento do relator da comissão,
deputado Rogério Correia (PT). A comissão encontrou denúncias de
sonegação fiscal, o que motivou o convite para a reunião, de dois
delegados da Polícia Federal em Varginha. Foi denunciado também o
sumiço de mais de 80 mil sacas de café em Poços de Caldas. Os
depoimentos ensejaram a aprovação de vários requerimentos pedindo
documentos do inquérito sobre sonegação à Polícia Federal, ao Banco
do Brasil e às cooperativas envolvidas.
A comissão, criada para investigar o sumiço de
milhares de sacas de café no Estado, teve acesso a informações sobre
o inquérito da Polícia Federal sobre a sonegação de imposto de
renda, PIS, Cofins e contribuição sobre o lucro líquido (CSLL),
todos tributos federais, que teriam gerado um prejuízo de R$ 11,5
milhões para o governo federal. A empresa investigada é a Cerealista
Monte Dourado, que trabalha no ramo de compra e venda de café, com
sede em São Gonçalo, apesar de seu proprietário, Ailton Venturato,
morar em Varginha. A reunião teve um de seus focos centrados nos
esclarecimentos desse caso, com os deputados sabatinando o delegado
da Polícia Federal em Varginha, Sebastião Augusto Camargo.
Sonegação envolveria "laranjas" de Varginha
Segundo Sebastião Augusto de Camargo, o inquérito
começou com a investigação de uma denúncia anônima encaminhada à
Receita Federal, que em fiscalização teria constatado que a empresa
deixava de declarar transações com café, caracterizando sonegação
fiscal. A Polícia Federal foi acionada para investigar o caso, que
teria provocado um rombo de R$ 11,5 milhões. O delegado afirmou que
há indícios de que o dono da corretora seja apenas um "laranja", já
que não foram constatados bens patrimoniais em nome dele ou da
esposa, sócia da empresa.
Respondendo aos deputados, Sebastião Camargo disse
que acredita existirem outras empresas atuando da mesma forma na
região e que os possíveis beneficiários do esquema seriam as
corretoras e exportadoras. O representante da Secretaria de Estado
da Fazenda (SEF) junto à CPI, Itamar Peixoto de Melo, disse que há
possibilidade de sonegação de Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS), tributo estadual, mas que o caso
precisa ser remetido à SEF para investigação. Sebastião Camargo
afirmou que a investigação não conseguiu apurar os beneficiários do
esquema, o que poderia ser levantado com a quebra do sigilo fiscal
dos donos da Monte Dourado.
O delegado informou ainda que a empresa investigada
não tinha estrutura financeira para fazer as operações com o café,
porque possuía apenas uma sala em São Gonçalo. O deputado Sargento
Rodrigues (PDT), vice-presidente da CPI, pediu que fosse divulgado o
nome das empresas que negociavam com a Monte Dourado. O relator
Rogério Correia quis saber se o delegado tinha conhecimento de mais
casos de sonegação. Sebastião informou que havia indícios de mais
uma empresa operando da mesma forma em Varginha, mas com sonegação
menor, em torno de R$ 1,5 milhão.
O deputado Domingos Sávio (PSDB) disse que a
apuração tinha que levar em conta que o produtor quase sempre é a
vítima nesses casos, porque está à mercê dos preços de venda,
estabelecidos pelas bolsas de valores. E perguntou se houve o
cancelamento da empresa após o inquérito, o que só pode ser feito,
segundo o delegado da PF, pela Receita Federal. O deputado
Adalclever Lopes (PMDB), relator parcial da CPI, perguntou ao
representante da SEF se há uma fiscalização nos armazéns das
cooperativas, sobre a quantidade e qualidade de sacas guardadas; e
se a CPI poderia acompanhar uma fiscalização. Itamar Peixoto disse
que a fiscalização não é feita com sentido de flagrante, porque
envolve o levantamento de documentação de vários exercícios fiscais.
Ele sugeriu um agendamento anterior pela CPI, no caso de uma
vistoria em algum armazém, para que toda a documentação seja
levantada previamente.
Cooperativas usaram indevidamente recursos do
Recoop
Outra fase dos depoimentos foi feita pelo também
delegado da Polícia Federal em Varginha, Célio Jacinto, responsável
pela investigação do empréstimo do Banco do Brasil à Cooperativa dos
Produtores de Café de São Sebastião do Paraíso (Cooparaíso), por
meio do Programa de Recuperação de Cooperativas (Recoop). O programa
é do governo federal, com o objetivo de sanear as finanças dessas
entidades. O indício de mau uso de R$ 313 mil liberados para a
Cooparaíso, segundo o delegado Célio Jacinto, veio do fato de que
parte do dinheiro foi repassado à Cooperativa de Cafeicultores de
Guapé (Coocafeg). No processo investigativo constatou-se que a
Cooparaíso tinha um convênio de cooperação com a Coocafeg e que o
empréstimo teria sido para sanear dívidas da última.
Para o delegado, esta é a principal irregularidade,
já que a Cooparaíso não tinha dívidas, motivo do empréstimo. Célio
Jacinto disse que está tentando levantar a documentação sobre o
empréstimo desde março, mas que até o momento não conseguiu nada,
apesar de já a ter requisitado junto ao Banco do Brasil e às
cooperativas. Ele disse que o empréstimo foi autorizado diretamente
em Brasília, no Banco do Brasil, com a participação do deputado
federal Carlos Melles (PFL-MG), na época ministro do Turismo e
Esportes. O deputado Rogério Correia informou que consta da
declaração do deputado junto ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE)
uma doação de campanha feita pela Cooparaíso, no valor de R$ 117
mil, no mesmo ano da liberação do empréstimo pelo Recoop.
O deputado Rêmolo Aloise (PL) sugeriu a convocação
do gerente do Banco do Brasil, agência de Boa Esperança, por onde
saiu o empréstimo. Ele disse que o banco deve ter toda a
documentação relativa ao contrato. O deputado Domingos Sávio
salientou a necessidade de uma apuração com responsabilidade, para
não condenar pessoas que estão exercendo sua função parlamentar,
como o deputado Carlos Melles.
Presidente da Coocafeg depõe
Por requerimento aprovado na mesma reunião, o
presidente da Coocafeg, Maurício Souza Sobrinho, e a ex-funcionária
da Cooparaíso, Fabiana Alves, prestaram depoimento a respeito do
caso da cooperativa de Guapé. O presidente disse que assumiu a
direção da entidade após o escândalo do sumiço das 20 mil sacas de
café, que causaram um prejuízo de cerca de R$ 7 milhões em valores
atuais. Ele disse que também está tendo dificuldades para levantar a
documentação tanto do empréstimo do Recoop como do sumiço das sacas.
O que já conseguiu já foi encaminhado à delegacia da Polícia Federal
em Varginha.
Fabiana Alves, ex-funcionária da Cooparaíso,
prestou informações sobre o pagamento de sete salários mínimos feito
pela Credipar, banco da Cooperativa de São Sebastião do Paraíso, ao
atual prefeito de Guapé, José Rogério Lara. Ela disse que o prefeito
era cooperado da Coocafeg e que foi assessor do deputado federal
Carlos Melles, na época em que ele foi ministro, entre 2000 e 2002.
Novas denúncias - Durante a
reunião a produtora de café Maria Amália Junqueira, de Poços de
Caldas, denunciou o sumiço de 285 sacas de café de sua propriedade,
que estavam sob responsabilidade da Cooperativa Café Poços e do
banco de crédito Café Credi. Segundo a produtora, desde março deste
ano ela tenta vender suas sacas de café para saldar uma dívida e até
agora não teve nenhuma resposta do banco nem da cooperativa. O
deputado Rogério Correia pediu que fossem tomadas providências para
que Maria Amália e sua família recebam proteção policial. O deputado
Sargento Rodrigues disse que 84 mil sacas de café desapareceram na
cidade de Poços de Caldas. Segundo estimativas do representante da
Polícia Federal, Sebastião Augusto de Camargo, no caso de Poços de
Caldas, o prejuízo pode chegar a R$ 25 milhões. O presidente da CPI,
deputado Sebastião Navarro Vieira (PFL), disse que o sumiço das
sacas de café em Poços de Caldas está sendo investigado e que o
processo, que está em sua fase final, corre sob sigilo de justiça.
Requerimentos aprovados
Foram aprovados os seguintes requerimentos:
* do deputado Rogério Correia, pedindo ao
presidente do Banco Central, a indicação de um funcionário da
gerência regional do banco para acompanhar os trabalhos da CPI; que
seja realizada uma reunião da comissão em Poços de Caldas para
apurar o sumiço de sacas de café naquele município; solicitando ao
Banco do Brasil cópias dos contratos entre o banco e a Cooparaíso
referente ao Recoop de R$ 313 mil; e pedindo à Cooparaíso cópia da
ata que autorizou a doação de campanha para o deputado Carlos
Melles;
* do deputado Sebastião Navarro Vieira, para que
sejam convocados os contadores e auditores que elaboraram e
auditaram os balanços das cooperativas e empresas envolvidas no
desaparecimento de sacas de café, conforme sugestão de produtor de
Manhuaçu;
* do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB),
solicitando à superintendência do Banco do Brasil informações sobre
quais agências da regional de Varginha liberaram recursos do
Pronaf;
* do deputado Sargento Rodrigues, pedindo
informações ao Banco do Brasil em Brasília, sobre quais cooperativas
do Sul de Minas foram beneficiadas com o Recoop e a cópia dos
contratos; e solicitando ao delegado regional da Polícia Civil em
Alfenas o encaminhamento à CPI da documentação apreendida em
cumprimento de mandado de busca e apreensão executado pela
delegacia, relativo à empresa de José Carlos de Souza; e o convite
para serem ouvidos na CPI o superintendente do Banco do Brasil em
Varginha e do gerente do mesmo banco da agência de Boa
Esperança.
* do deputado Domingos Sávio, pedindo à Receita
Federal cópia do processo fiscal-administrativo contra a Cerealista
Monte Dourado;
Presenças - Participaram da reunião os
deputados Sebastião Navarro Vieira (PFL), presidente; Sargento
Rodrigues (PDT), vice; Rogério Correia (PT), relator; Adalclever
Lopes (PMDB), relator parcial; Fábio Avelar (PTB), Doutor Viana
(PFL); Domingos Sávio (PSDB), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), Rêmolo
Aloise (PL), Durval Ângelo (PT), Luiz Fernando Faria (PSDB) e
Gilberto Abramo (PMDB).
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