Expositores abordam condições para o desenvolvimento do
cerrado
As vertentes social, econômica e ambiental do
cerrado mineiro foram abordadas nas exposições feitas na manhã desta
segunda-feira (14/6/04) durante o Fórum Técnico "Cerrado mineiro -
desafios e perspectivas". A diretora do Centro de Estudos Econômicos
e Sociais da Fundação João Pinheiro, Maria Luíza de Aguiar Marques,
baseou sua fala no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos
municípios do cerrado, comparando os dados dos anos de 1991 e 2000.
Três indicadores são usados para avaliar o desenvolvimento da
região: educação, longevidade e renda. De acordo com a pesquisadora,
a variação de IDH entre os 233 municípios analisados é comparável à
encontrada entre a Polônia e Botswana, havendo grande diversidade.
De 1991 para 2000, o número de municípios do cerrado que estavam
acima da média do Estado aumentou.
Maria Luíza comentou que os piores números são
relativos à renda dos municípios do cerrado e, os melhores,
referem-se à educação, quando são analisados o acesso à escola e a
taxa de analfabetismo. "Houve uma universalização do acesso entre as
crianças de 7 a 14 anos, mas em alguns municípios 45% dos jovens
estão fora da escola e, em outros, onde estão os melhores índices,
15% não freqüentam a sala de aula", comentou. Ela disse que a
situação fica ainda mais grave se for adotado um conceito um pouco
mais sofisticado para analisar o grau de analfabetismo, como o de
analfabeto funcional ou fundamental, por exemplo. A pesquisadora
acrescentou que o atraso escolar também é bastante significativo nos
municípios do cerrado. "Grande parte dos estudantes está no ensino
fundamental, quando deveria estar no ensino médio", afirmou.
A pobreza é também revelada pelo IDH, que aponta
que mais de 50% da população do cerrado mineiro tem renda familiar
per capita inferior a meio salário mínimo. A mortalidade infantil,
uma variável usada como complemento da longevidade (esperança de
vida ao nascer), demonstra que a maior parte dos municípios também
não atingirá a meta da ONU, que estabelece que até 2015 o Brasil
teria que apresentar o índice máximo de 17 mortes a cada mil
crianças nascidas vivas.
Ex-ministro acredita em potencial agrícola do
cerrado
"É preciso afastar a idéia de que o bioma do
cerrado está acabando", afirmou o ex-ministro da Agricultura,
Alysson Paulinelli. Para ele, o que destrói o cerrado é a má
utilização do solo. Paulinelli defendeu o plantio direto, o uso de
tecnologias simples de manejo do solo desenvolvidas pela Embrapa,
que integram agricultura e pecuária, por exemplo. "Nas áreas de
difícil manejo, já se consegue extrair hoje de 70 a 75 sacas de soja
por hectare", comentou. Ele acredita também que o Legislativo e os
órgãos do Executivo devem fiscalizar e prover meios para que a
legislação que prevê a preservação de 20% das propriedades
particulares seja cumprida.
O ex-ministro defendeu também que a evolução do
cerrado mineiro precisa ser considerada um ato político. "O que
houve foi uma mudança de comportamento e de visão por parte do
homem. Até a década de 60 o produtor procurava a terra fértil e a
desmatava para implantar ali seu sistema produtivo", afirmou.
Segundo ele, em 1974 o governo "se dispôs a acreditar na mudança de
comportamento do homem", investindo 3 milhões de dólares na
agricultura do cerrado, por meio do projeto "Pólo Centro", que
desenvolveu pesquisas para adaptar o solo do cerrado para o cultivo
de culturas como o café. Paulinelli informou que 3, 2 milhões de
hectares do cerrado foram ocupados nessa época. "Com isso, o Brasil
passou a ocupar uma posição mais competitiva no mercado agrícola,
passando a ser não só comprador, mas supridor de bens alimentícios".
Sustentabilidade - O
assessor de Desenvolvimento Florestal Sustentável do Instituto
Estadual de Florestas (IEF), José do Carmo Neves, falou da
necessidade de elaboração de um programa ambiental de
desenvolvimento sustentável do cerrado. Ele expôs quatro pontos que
deveriam ser tomados como prioritários para a implantação do
programa: a atividade agrosilvopastoril, com agricultura
tecnificada, associada à agricultura familiar; a proteção da
biodiversidade, englobando as unidades de conservação; legislação
ambiental que contemple o desenvolvimento sustentável do cerrado em
seus aspectos econômicos, sociais e ambientais; e a educação
ambiental. Ele acrescentou a informação técnica de que um hectare de
eucalipto no cerrado protege seis hectares de mata nativa.
Extrativismo - O
extrativismo como estratégia para o desenvolvimento do cerrado foi
defendido pelo diretor da Cooperativa Agroextrativista Grande
Sertão, Aparecido Alves de Souza. Em sua exposição, ele destacou que
a ocupação do cerrado se deu em três momentos, mas que em nenhum
deles a população local foi inserida nos projetos de
desenvolvimento. Ele afirmou que a ocupação iniciada em 1970 deixou
um legado de prejuízo para a biodiversidade, devido, sobretudo, à
expansão do modelo monocultor e agroexportador. Segundo Aparecido,
de um total de 1.200 córregos e rios, 680 secaram e houve um
empobrecimento dos pequenos municípios.
O diretor da cooperativa citou o exemplo da Grande
Sertão para o fortalecimento do agroextrativismo. Ele informou que,
na cooperativa, o pequi e outras 15 frutas nativas e cultivadas, são
beneficiadas, e já saem embaladas para o mercado. "Fazemos aqui
também um trabalho de conscientização sobre o aproveitamento dos
recursos naturais e de valorização do cerrado", afirmou. Ele
defendeu ações de apoio às cooperativas agroextrativistas
comunitárias; às experiências que associem o conhecimento local com
o tradicional; e a articulação do agroextrativismo com a pecuária
racional de bovinos e caprinos nas chapadas.
Debates - Na fase de
debates, Luiz Márcio Buriti, da Escola Agrotécnica de Uberaba,
criticou o sistema de monocultura voltada para a exportação, que
degrada o meio ambiente e não promove a inclusão social. "Foi a
monocultura do café que deixou a Mata Atlântica no estado em que se
encontra hoje", alertou. Na opinião do ex-ministro de Estado da
Agricultura, Alysson Paulinelli, é possível ter monocultura com
preservação do meio ambiente, se houver manejo adequado do solo.
Segundo ele, a agricultura brasileira é a melhor do mundo, em termos
de sustentabilidade, principalmente pelo que é feito hoje no
cerrado.
Marcelo Franco, da Emater, chamou a atenção dos
participantes para os problemas vividos nas pequenas propriedades
rurais em Minas. De acordo com ele, o Estado tem uma dívida social e
ambiental com os pequenos produtores, que hoje estão
descapitalizados e não têm condições de produzir e competir com as
grandes empresas agroindustriais. O ex-ministro disse que o país
carece de políticas públicas que possam ajudar o pequeno produtor e
incentivar o desenvolvimento da agricultura familiar. "Os subsídios
que existem são mal empregados e não atendem aos pequenos",
ressaltou.
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