Eucalipto provoca alterações no clima e no meio ambiente

Durante o terceiro e último painel do ciclo de debates "O Eucalipto", realizado pela Assembléia Legislativa na manhã ...

25/05/2004 - 00:00
 

Eucalipto provoca alterações no clima e no meio ambiente

Durante o terceiro e último painel do ciclo de debates "O Eucalipto", realizado pela Assembléia Legislativa na manhã desta terça-feira (25/5/04), e coordenado pelo deputado Rogério Correia (PT), parte do tempo foi utilizado para estudar os efeitos da monocultura de eucalipto sobre o meio ambiente, e parte para o aprofundamento do confronto entre defensores e críticos da atividade, cabendo aos muitos deputados presentes o papel de interpretar as razões de cada lado e moderar as atitudes que não levassem ao pleno entendimento da questão.

Os três primeiros expositores apresentaram dados e estudos que minimizam as alterações ambientais dessa monocultura, em comparação com outras atividades econômicas. Os três últimos, bem ao contrário, procuraram inserir a questão na problemática ambiental mundial e nos desequilíbrios causados na vida dos primitivos habitantes das regiões impactadas pelo eucalipto. Na fase de debate, a platéia - em sua maioria composta por trabalhadores rurais - dividia-se entre as vítimas da ação das grandes empresas de reflorestamento e aqueles que defendem o eucalipto como fonte de renda para subsistência em regiões que nada mais lhes poderia oferecer.

Rubens Vargas Filho, diretor de monitoramento e controle do IEF-MG, historiou as quatro décadas de introdução do reflorestamento com eucalipto, revelando que nas décadas de 60 e 70, com incentivos fiscais, grandes áreas foram desmatadas de sua cobertura nativa para o plantio da espécie. Na década de 80, aperfeiçoou-se a tecnologia com a oferta de mudas de propagação vegetativa. Nos anos 90, surgiram as preocupações ambientais com o manejo e a busca de práticas mais adequadas.

"A eucaliptocultura se destina principalmente à produção de carvão e de celulose, mas tem múltiplos usos crescentes, como a indústria moveleira, remédios orgânicos, mel, proteção contra os ventos, proteção do solo e resgate de gás carbônico", enumerou Vargas Filho. Segundo ele, hoje o IEF não incentiva grandes áreas contínuas, mas o fomento da silvicultura como complemento em pequenas propriedades, e exige a adoção de técnicas de conservação do solo e da água.

Brasil tem 5 milhões de hectares florestados

O IEF exige também o distanciamento adequado dos mananciais e das matas ciliares e o respeito aos corredores de interligação para a flora e a fauna, e a preservação de áreas de recarga hídrica. Com os incentivos do programa de fomento, teriam sido plantados 5.541 hectares em 2003, beneficiando 993 produtores do Jequitinhonha.

"Comparativamente, o eucalipto tem maior função ambiental do que as pastagens. Estamos inclusive incentivando a substituição de pastagens por florestamento e a regeneração de áreas degradadas", concluiu.

José Roberto Scolforo, professor de Biometria, Inventário e Manejo Florestal da Universidade Federal de Lavras, iniciou sua exposição com dados sobre a magnitude do agronegócio do eucalipto. "Dos 5 milhões de hectares reflorestados no país, 3 milhões estão ocupados com eucaliptos, 1,3 milhões com pinus e o restante com outras espécies, para atender a um consumo de 102 milhões de metros cúbicos de madeira por ano. O setor florestal produz 4,5% do PIB brasileiro, cerca de R$ 20 bilhões por ano. Cria 1,5 milhão de empregos diretos, principalmente nos estados de Minas, São Paulo e Paraná. Em Minas, a atividade cria 110 mil empregos diretos e 450 mil indiretos", informou.

Scolforo relacionou uma série de clientes da eucaliptocultura. Além das indústrias guseiras e de celulose, há milhares de padarias, olarias, cerâmicas que dependem da matéria-prima. Em seguida, procurou desfazer duas crenças desfavoráveis à eucaliptocultura, o de que as raízes pivotantes mergulham profundamente nos lençóis freáticos e o de que as árvores são responsáveis pela degradação do meio ambiente. "Nas espécies clonais hoje existentes, o sistema radicular não ultrapassa os 2,5 metros", demonstrou.

Da mesma forma, acusou o efeito estufa de aumentar a evapotranspiração e contribuir para a degradação de microbacias. Quanto ao consumo de água para produzir biomassa, Scolforo revelou que outros produtos gastam muito mais: "Um quilo de batata consome 2 mil litros de água para ser produzido. Um quilo de carne consome 15 mil litros".

'Retirada a monocultura, ambiente recupera o equilíbrio', diz professor de Viçosa

O terceiro expositor foi Herly Carlos Teixeira Dias, professor de Hidrologia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, que explicou o ciclo da água, com as chuvas se infiltrando no solo e percolando através dele nas áreas de recarga hídrica para garantir a existência das nascentes. Dias considera difícil responder como a eucaliptocultura interfere no ciclo da água. "Antigamente acreditava-se que floresta formava chuva, mas depois concluiu-se que isso era falso, porque a maior parte da evaporação vem dos oceanos. No entanto, é certo que a floresta contribui para a formação de um microclima úmido e mais ameno", esclareceu.

Professor Herly explicou como são feitos os estudos hidrológicos. "Parte da chuva é interceptada pelo dossel da floresta, e outra parte vai diretamente para o solo. Da parte interceptada, a floresta de eucaliptos retém de 5,3 a 16,8%. Bosques de oliveiras retêm até 25%, de seringueiras 23,7%, de cacau 15%. A Mata Atlântica retém 18,4% e as florestas tropicais de 17 a 37%, dependendo da concentração", disse ele.

O escoamento da água que vai diretamente para o solo é maior no eucalipto (1,5%) do que no pinus (0,54%) e na copaíba (0,22%). No entanto, a perda de solo é de apenas 4 kg por hectare/ano, enquanto nos cultivos de algodão chega a 35 mil kg por hectare/ano. A melhor constatação do professor da UFV, no entanto, é que, retirada a monocultura, o ambiente recupera aos poucos o equilíbrio e as nascentes voltam a correr.

Americanos consomem 15 vezes mais energia que chineses

O alto consumo de energia está na origem do efeito estufa e da expansão desenfreada de plantio de florestas. Esta foi a tese defendida por Leonardo Fares, da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA), que apresentou a lista dos países com maior e menor consumo de energia. A unidade é o BTU (Unidade Térmica Britânica). O maior consumidor per capita do mundo, segundo Fares, é o Qatar, com 562 milhões de BTU/ano.

Os EUA consomem 307 milhões e a Finlândia 222 milhões. O Cambodja e o Vietnam são os menores consumidores, com 2 milhões. Os chineses consomem 15 vezes menos que os americanos: 24 milhões. O Brasil está numa posição intermediária, com 47 milhões de BTUs por habitante/ano. Fares também analisou a composição das fontes de energia. No mundo, 13% da energia é renovável. A situação do Brasil, com o álcool motor, o carvão vegetal e a lenha, é melhor. Fares receia que em breve a única alternativa energética sejam as usinas nucleares.

O professor Klemens Laschefski, membro do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta) da UFMG, apresentou uma análise de vários maciços de reflorestamento, demonstrando, através de fotos, que os corredores de interligação são estreitos e que os 30 metros de mata ciliar protegida às margens dos córregos não são obedecidos. Dentro dos critérios da sustentabilidade, Laschefski condena os empreendimentos:

"A plantação depende de agroquímicos não renováveis. Portanto não pode ser considerada sustentável. Com o aperfeiçoamento da tecnologia, as empresas aumentam sua produção e eliminam trabalhadores. Empregando apenas um homem para cuidar de 50 ou 60 hectares, não há sustentabilidade social", afirmou. O militante do Gesta igualmente critica os financiamentos europeus para o desenvolvimento "limpo", que também constituiriam subsídio e a comemoração do plantio de eucalipto em antigas pastagens: "Isso só significa que vão abrir fronteiras para a pecuária em outro lugar", disparou.

Comunidades começam a reagir contra empresas florestais

O último expositor foi o agrônomo Carlos Alberto Dayrell, membro da Rede Alerta contra o Deserto Verde, que considerou a grande tarefa dos ambientalistas é mudar a cultura mundial para que a produção e o consumo se adaptem à capacidade dos ecossistemas e à possibilidade de disposição adequada dos dejetos. "É necessário discutir um novo modelo de desenvolvimento regional dentro deste contexto", afirmou.

Dayrell trouxe denúncias dos impactos da rápida ocupação dos cerrados, com expulsão de quilombolas, veredeiros, geraiseiros e vazanteiros. "Encurralados, os pequenos produtores adotaram a estratégia de utilizar intensamente as grotas para onde foram empurrados, até sua exaustão, passando a viver na penúria e na sede", expôs. Hoje as comunidades sertanejas já estariam reagindo, empatando desmates, parando máquinas, invadindo plantios e retirando lenha das grandes empresas para fazer seu próprio carvão.

"E também denunciam, como fizeram com o empreiteiro Gentil Gontijo, que preservou remanescentes protegidos, como os pequizeiros, cagaiteiras e mangabeiras, e assim que obteve a licença, voltou à área e cortou tudo. Gontijo foi denunciado, mas não foi punido. E o pior é que, sem emprego na cidade, os filhos estão voltando para tentar viver da terra. Ao ser introduzida, cada motosserra tirou 10 empregos. Agora cada máquina moderna substitui 80 motosserras, ou seja, desemprega 800 trabalhadores", desabafou Dayrell.

Deputados se manifestam

Vários deputados foram ao microfone na fase de debates. Padre João (PT) quis expressar sua angústia pelas agressões sofridas pela natureza e pela dificuldade em se garantir a vida das gerações futuras. Adelmo Carneiro Leão afirmou que a ciência não conflita com a sabedoria popular. "Não vejo o eucalipto de modo negativo, mas condeno as práticas erradas que se fazem em torno do eucalipto, como o desrespeito ao trabalhador e à propriedade", afirmou. Célio Moreira (PL) criticou o "achismo" dos estudiosos que deixaram dúvidas por responder.

Paulo Piau (PP), que preside a Comissão Especial da Silvicultura, reconheceu a justiça das denúncias e da finalidade social da terra, mas defendeu os projetos bons, produtivos e sustentáveis. "Não há outra forma de gerar riquezas e empregos do que produzindo. Se pararmos, a situação brasileira só vai se agravar", assegurou. Domingos Sávio também exigiu respeito à terra e ao ambiente, mas ponderou que a siderurgia é responsável pelos milhares de empregos da sua Divinópolis, e que depende do eucalipto.

A deputada Ana Maria (PSDB) defendeu os interesses do Norte de Minas. "Somos pobres em água e a maioria das nossas terras não se prestam a outra finalidade que o plantio de eucalipto. Eucalipto não produz carne, mas produz dinheiro", afirmou.

Presenças - Deputado Rogério Correia (PT), coordenador; deputadas Maria José Haueisen (PT), Ana Maria (PSDB) e Jô Moraes (PCdoB); deputados Ricardo Duarte (PT), Laudelino Augusto (PT), Alberto Bejani (PTB), Doutor Viana (PFL), Padre João (PT), Dinis Pinheiro (PL), Sargento Rodrigues (PDT), Paulo Piau (PP), Leonardo Moreira (PL), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), Adelmo Carneiro Leão (PT), Domingos Sávio (PSDB) e Célio Moreira (PL).

 

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