Condução da reforma agrária em Minas divide opiniões

O programa de reforma agrária do governo federal e a forma como têm sido conduzidos os processos de reintegração de p...

13/05/2004 - 00:00
 

Condução da reforma agrária em Minas divide opiniões

O programa de reforma agrária do governo federal e a forma como têm sido conduzidos os processos de reintegração de posse de áreas invadidas em Minas Gerais foram temas da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembléia Legislativa nesta quinta-feira (13/5/04). O assessor jurídico da Federação da Agricultura, Marcos Abreu e Silva, lamentou a lentidão dos processos de reintegração, afirmando que isso faz com que o Estado fique ainda mais vulnerável às invasões de terra. Representantes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Instituto de Terras de Minas Gerais (Iter), do Ministério Público e da Polícia Militar ressaltaram o caráter pacífico das reintegrações feitas em Minas, ainda que as liminares nesse sentido levem alguns dias ou meses para serem cumpridas.

O deputado Carlos Pimenta (PDT), autor do requerimento que deu origem à reunião, iniciou a discussão ressaltando os esforços dos governos federal e estadual, e também do Incra, do Iter e da Vara de Conflitos Agrários, que têm evitado confrontos e cenas de violência em Minas. O deputado quis saber, no entanto, como se dá a ação da Justiça e da Polícia Militar e por que, muitas vezes, a reintegração demora a acontecer. O diretor do Iter, Luiz Antônio Chaves, disse que Minas Gerais optou pelo diálogo, para evitar a todo custo o confronto. De acordo com o diretor, a demora às vezes é porque o entendimento com o proprietário da terra ainda não chegou ao fim, nem mesmo existe novo local para encaminhar os acampados. "Tentamos preservar a vida das pessoas e até mesmo evitar que as famílias retiradas voltem ao local pouco tempo depois", afirmou.

O juiz da Vara de Conflitos Agrários, Renato Luis Dresch, reconheceu que as dimensões territoriais do Estado às vezes dificultam a ação rápida da Justiça, tanto que a criação de Varas regionais já está sendo estudada pelo Tribunal de Justiça. "Procuramos estar sempre presentes no local do conflito, para saber qual é a situação real", ressaltou. O juiz enfatizou a preocupação com a função social da propriedade e disse que sempre pede ao proprietário para provar que a terra está cumprindo sua função social antes de definir pela reintegração. "Também pedimos à PM que planeje bem suas ações no momento de retirar as famílias do local", afirmou. Na opinião dele, a pequena demora é compensada pelo fato de raramente haver algum tipo de conflito entre a polícia e os acampados. A representante da Pastoral da Terra, Marcilene Aparecida, disse que acelerar o processo de reintegração de posse em Minas seria duplicar a violência já existente hoje no campo.

Incra pede apoio da Assembléia

O superintendente do Incra-MG, Marcos Helênio, lembrou que em Minas existem hoje 153 projetos de assentamento e que no último ano foram assinados 53 decretos de desapropriação. Nas desapropriações, ele garantiu que o órgão age sempre respeitando a lei e as pessoas. "Não fazemos confisco de terras, pagamos o preço justo, de mercado", afirmou. Ele pediu apoio da Assembléia para pressionar o governo do Estado a regularizar a situação das terras devolutas, discriminando e utilizando parte delas para reforma agrária. No que diz respeito à reintegração de posse, Helênio disse que o respeito à lei e aos direitos humanos deve continuar sendo a base de qualquer ação da justiça.

Ruralista de Montes Claros chora ao narrar ocupação

No meio da reunião, o deputado Gil Pereira (PP) apresentou requerimento, aprovado pela comissão, para que um produtor rural recém chegado de Montes Claros, no Norte de Minas, pudesse participar do debate. Carlos Luís Franco Nunes pediu a palavra para descrever a ação do Movimento dos Sem-Terra (MST), que ocupou sua fazenda no último fim de semana. Segundo ele, a propriedade é produtiva e tem apenas 288 hectares. Líderes do movimento teriam chegado de madrugada, armados, rendendo os caseiros e se apoderando de móveis e utensílios domésticos, que foram usados para armar "falsas barracas" espalhadas pelo terreno. O proprietário rural chorou ao narrar a ocupação e disse que tentou entrar na fazenda para tirar fotos, mas não conseguiu. "Deixaram que eu retirasse meu maquinário, mas meu gado está lá dentro ainda", lamentou.

Carlos Luís Franco está em Belo Horizonte para entrar na Justiça com pedido de reintegração de posse da terra, munido de documentos que, segundo ele, provam as atividades de pecuária da fazenda. "É meu ganha-pão, eles não podiam fazer isso. Minha família está em Montes Claros, amedrontada. Meus vizinhos estão revoltados", desabafou. Segundo o ruralista, muitos dos que ocuparam sua fazenda vêm de outra ocupação na região, e certamente não têm intenção de ficar lá: "Estão pegando gente nas periferias das cidades e levando para ocupar fazendas de gente trabalhadora, por favor, façam alguma coisa". O superintendente do Incra, Marcos Helênio, tentou tranquilizar Carlos Franco, dizendo que sua propriedade é de pequeno porte e não pode ser feita reforma agrária no local.

Deputado propõe avaliação bilateral do processo

O deputado Paulo Piau (PP) cobrou dos presentes uma avaliação bilateral do processo de reforma agrária que está sendo feito no Brasil. Na opinião dele, a reforma está mal conduzida: "Estamos presenciando abusos e intranqüilidade no campo, esse projeto tem se mostrado um verdadeiro ralo de recursos públicos", advertiu. Paulo Piau elogiou a cautela da PM nas ações de reintegração, mas disse que situações como a do pecuarista de Montes Claros não podem ficar sem solução. "Quem vai pagar o prejuízo de um proprietário como esse? Justiça não se faz olhando um só lado da questão", disse o deputado.

Paulo Piau ressaltou a importância do agronegócio para o país e afirmou que Minas Gerais está perdendo investimentos no setor, porque os empresários não têm segurança para investir aqui. O deputado lembrou que a terra representa apenas 10% do custo de produção agrícola: "Não é qualquer um que consegue trabalhar a terra, produzir. É preciso investimento, tecnologia", afirmou. A deputada Ana Maria Resende (PSDB), que é do Norte de Minas, concordou com a abordagem do deputado Paulo Piau. Ela cobrou resultados práticos da reforma conduzida pelo governo Lula, afirmando que alguns assentamentos têm se transformado em favelas.

O deputado Padre João (PT) evitou a discussão partidária do assunto, chamando todos os envolvidos à responsabilidade. "Não podemos ignorar a história do país e culpar apenas o governo Lula. A omissão foi da direita e não da esquerda", enfatizou. Na visão do parlamentar, a agricultura familiar, reforçada pela distribuição justa de terras, pode ser a solução para a maioria dos problemas do País. Para ele, a postura do Incra, Iter, Polícia Militar e do juiz Renato Luis Dresch o tranqüiliza, porque garante um processo de reforma agrária o mais pacífico possível no Estado. "Temos que valorizar o que é mais importante: a vida humana", disse. O deputado, no entanto, se solidarizou com o ruralista de Montes Claros, dizendo que certamente os órgãos responsáveis vão resolver o conflito o mais rápido possível.

Já o presidente da comissão, deputado Gil Pereira, alertou para o fato de que o governo precisa investir mais na reforma agrária, sugerindo que parte do dinheiro usado para pagar a dívida com o Fundo Monetário Internacional seja usado com essa finalidade.

Audiências públicas - A Comissão de Política Agropecuária aprovou mais dois requerimentos: o primeiro, de autoria do deputado Laudelino Augusto (PT), pede audiência pública para discutir, com convidados, o Programa Nacional de Crédito Fundiário; o outro, do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), solicita audiência para discutir a produção de batatas no Estado.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Gil Pereira (PP), presidente; Padre João (PT), vice; Doutor Viana (PFL); Paulo Piau (PP); Carlos Pimenta; e a deputada Ana Maria Resende (PSDB).

 

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