Auditoria revela irregularidades em contrato entre Loteria e
Gtech
Caberá à Advocacia-Geral do Estado, chefiada por
José Bonifácio Borges de Andrada, definir o valor da multa a ser
cobrada da empresa Gtech do Brasil pelo descumprimento do contrato
firmado em 1994 com a Loteria do Estado, para exploração de jogos
on-line em Minas Gerais. Conforme os parâmetros adotados no cálculo
da multa, os valores podem variar de R$ 29 milhões a R$ 203 milhões,
dependendo das interpretações jurídicas sobre as cláusulas
contratuais. As informações são da auditora-geral do Estado, Maria
Celeste Morais Guimarães, que compareceu, nesta quinta-feira
(13/5/04), à reunião da Comissão de Trabalho, Previdência e Ação
Social da Assembléia Legislativa. A auditora havia sido convidada a
prestar esclarecimentos sobre o relatório da auditoria realizada na
Loteria Mineira para investigar questões relativas ao contrato entre
a autarquia e a Gtech. A auditoria foi realizada por determinação do
governador Aécio Neves e feita em parceria com o Ministério Público,
que designou três promotores para o trabalho.
Desde o mês de março, o contrato entre a Loteria
Mineira e a Gtech vem sendo objeto de debates na Comissão, devido ao
descumprimento de cláusula que determinava a aplicação de 25% das
receitas dos jogos on-line em projetos e programas sociais. O
presidente da Comissão de Trabalho e Ação Social, deputado Alberto
Bejani (PTB), já propôs, inclusive, a constituição de CPI para
investigar o assunto.
Irregularidades - De
acordo com Maria Celeste Guimarães, o trabalho de auditoria
evidenciou a prática de inúmeras irregularidades, como sucessivos
aditamentos ao contrato original, com alteração substancial de
valores e metas que justificariam nova licitação em lugar de termos
aditivos; reiterado descumprimento de cláusulas contratuais;
informalidade nas práticas administrativas e completa desorganização
nos arquivos da autarquia. "Não foram localizados, nos arquivos da
Loteria, muitos dos documentos solicitados, como a comprovação da
destinação dos 25% para programas sociais entre 1994 e 2002",
denunciou a auditora.
Auditoria trabalhou com autonomia
Frisando que a Auditoria-Geral teve total autonomia
para realizar seu trabalho, de forma a produzir um relatório isento
e minucioso, Maria Celeste não poupou críticas à forma como o
contrato foi sendo aditado, à falta de instrumentos que permitissem
fiscalizar a atuação da empresa concessionária e a operação dos
jogos on-line, e à complacência da autarquia com o descumprimento de
cláusulas contratuais.
O contrato original, firmado ainda no governo Hélio
Garcia, em 11 de outubro de 1994, deu ao consórcio Racimec, formado
pelas empresas Racimec e Gtech do Brasil, vencedor da licitação e
posteriormente representado apenas pela empresa Gtech, o direito de
explorar o sistema lotérico de captação de apostas, implantação e
gestão de jogos "on-line/real time" em Minas Gerais. O contrato, no
valor de R$ 122 milhões, previa a instalação de 500 terminais no
prazo de até 120 dias, de 1.000 terminais em um ano e de 3.000
terminais até 11 de outubro de 1996. Não houve, na ocasião, qualquer
questionamento por parte do consórcio que venceu a licitação. Doze
anos depois e após seis termos aditivos ao contrato inicial, apenas
850 terminais foram implantados, a distribuição dos percentuais
relativos ao faturamento foi completamente alterada e excluiu-se a
obrigação de se aplicar 25% da receita em programas sociais em
benefício da população mineira.
Aditamentos alteram metas contratuais
O primeiro aditamento aconteceu em 10 de março de
1997, depois, portanto, de expirado o prazo estipulado no contrato
original para instalação dos 3.000 terminais. Naquela data, ficou
acordada a instalação de 1.500 máquinas no prazo de um ano, 2.000
até dois anos e 3.000 até março de 2000. O segundo termo de
aditamento foi firmado em 1º de dezembro de 1998 e reduziu a meta
final de 3.000 terminais para apenas 1.500, além de incluir outras
modalidades de jogos e alterar os percentuais de participação dos
recursos, excluindo-se do contrato a exigência de destinação de 25%
para programas sociais. "Não houve qualquer justificativa para a
exclusão dessa cláusula dos 25%", frisou Maria Celeste.
O terceiro aditamento ocorreu em 1º de outubro de
2000, quando o contrato de concessão foi prorrogado e estabeleceu-se
o compromisso de apresentação de fiança complementar, até 13 de
outubro daquele ano, no valor de R$ 3 milhões, conversíveis em
pecúnia e levados a depósito à vista no "Fundo de Marketing" a ser
criado e disciplinado pelo contratante, quando do contrato
definitivo. As novas mudanças foram criticadas pela auditora, que
disse não ter encontrado "nenhum argumento técnico para a criação do
fundo". Além disso, segundo ela, o aporte dos R$ 3 milhões foi
apenas da concessionária, apesar de a Gtech ter receita própria. O
quarto aditamento novamente alterou prazos e quantidade de
terminais, chegando-se, após mais dois aditamentos, ao número de
apenas 850 terminais efetivamente implantados.
Cálculo da multa
O contrato firmado entre a Loteria e a Gtech
previa, para o caso de descumprimento total ou parcial das cláusulas
estabelecidas, sanções e penalidades como multa de 0,1% por dia
excedente sobre o valor adjudicado, de R$ 122.304.000,00, além de
multa de até 20% sobre esse montante, atualizando-se os valores
mediante aplicação de índice oficial. O relatório da auditoria
contém o cálculo da multa feito pela Loteria, que em 2000 chegou a
ser cobrada e posteriormente cancelada, de R$ 29.164.000,32; e o
cálculo feito pelos auditores nos termos das cláusulas contratuais.
Tomando-se como base a data limite para instalação dos 3.000
terminais, em novembro de 1996, a multa chega a R$ 203.146.941,00.
Segundo Maria Celeste, as divergências devem-se à interpretação
jurídica dos termos contratuais, e deverão ser resolvidas pelo
parecer da Advocacia-Geral do Estado, a quem o relatório foi
encaminhado.
A auditora-geral apontou, ainda, a existência de
seis contas não contabilizadas em nome da Loteria Mineira,
movimentando o total de R$ 892 mil entre novembro de 1999 e abril de
2002; e uma projeção de perda de recursos destinados a programas
sociais, entre 1999 e 2003, da ordem de R$ 99 milhões.
O assunto Loteria/Gtech deverá voltar à pauta da
comissão na próxima semana, quando serão convidados para prestar
esclarecimentos os três promotores que trabalharam na auditoria e o
procurador Cleber Reis Greco.
Requerimentos aprovados
Na reunião, foram aprovados os seguintes
requerimentos:
* do deputado Alberto Bejani (PTB), convidando os
promotores do Ministério Público Estadual que participaram dos
trabalhos de auditoria na Loteria Mineira a prestarem
esclarecimentos à comissão no próximo dia 20 de maio;
* do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB),
solicitando informações sobre a Vara em que foi protocolado o pedido
de concessão de liminar referente ao contrato celebrado entre a
Gtech do Brasil e a Embratel e cópia de inteiro teor da mesma; além
de solicitar ao Ministério Público Federal esclarecimentos sobre a
existência de procedimento administrativo criminal em face do
contrato entre a Gtech e a Loteria;
* do deputado André Quintão (PT), requerendo à
auditora Maria Celeste Guimarães cópia de documentos sobre auditoria
realizada na Loteria Mineira; e
* do deputado Alberto Bejani, convidando Jorge
Alberto Gouvêa Prado, diretor do Sindados/MG, a participar de
reunião da comissão no próximo dia 18 de maio e falar sobre a
demissão de 154 trabalhadores da Prodemge;
Presenças - Compareceram à
reunião os deputados Alberto Bejani (PTB) - presidente da comissão,
Alencar da Silveira Jr. (PDT), André Quintão (PT), Elmiro Nascimento
(PFL) e Dalmo Ribeiro Silva (PSDB). Como convidados, participaram a
auditora-geral do Estado, Maria Celeste Morais Guimarães; e o
diretor da Superintendência Central de Auditoria Operacional,
Henrique Hermes Gomes de Morais.
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