Deputados e juristas debatem redução do número de
vereadores
O Brasil tem 60.311 vereadores. Minas Gerais, com
853 municípios, tem 9.093 vereadores, o que dá a média de 10,6 por
município. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal arbitrou uma
questão referente ao número de vereadores do pequeno município
paulista de Mira Estrela. O Tribunal Superior Eleitoral recomendou
que a decisão de redução fosse estendida a todos os demais
municípios, gerando uma polêmica de grandes proporções nestes poucos
meses que faltam para as eleições municipais.
O assunto foi trazido à discussão na Comissão de
Assuntos Municipais e Regionalização da Assembléia Legislativa, a
requerimento do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), na reunião
desta terça-feira (4/5/2004), e lotou o auditório com quase uma
centena de vereadores representando mais de 30 municípios de todas
as regiões do Estado. Os deputados convidaram dois juristas e dois
dirigentes da União dos Vereadores de Minas Gerais (Uvemig) para
debater e prestar esclarecimentos, além do presidente da Câmara
Municipal de Belo Horizonte, Betinho Duarte.
Dalmo Ribeiro Silva expôs a situação, lembrando
que, além da Resolução do TSE, havia várias propostas de emenda à
Constituição tramitando no Congresso, e que os juristas estavam ali
para explicá-las. "Agradeço a presença de vocês, que são guerreiros
em suas comunidades, e proponho aqui uma cruzada cívica para cobrar
dos deputados e senadores que o direito seja respeitado", disse o
deputado.
A primeira exposição foi do promotor de Justiça da
Comarca de Cláudio e também professor de Direito Eleitoral, Thales
Pontes Cerqueira. Ele defendeu o Judiciário da acusação de querer
tumultuar o processo eleitoral às vésperas do pleito. "O Judiciário
só decide quando é provocado, e tem a função de interpretar as leis.
No entanto, o que o TSE emitiu foi uma resolução, que não tem força
para descumprir o artigo 16 da Constituição", disse, esclarecendo
que esse artigo não permite a eficácia da mudança este ano.
Jurista recomenda Adin contra TSE
Thales Cerqueira sugeriu que, se as normas de
redução do TSE forem aplicadas contra seus interesses, a Uvemig
poderia ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
(Adin) contra a Resolução do TSE. Segundo os cálculos, o número de
vereadores mineiros seria reduzido em 1.289 cargos. O jurista expôs
também as diferentes propostas de redução contidas nas PECs em
tramitação. "Uma delas, de 1992, foi desarquivada recentemente, e
estabelece números máximos e mínimos de vereadores segundo a faixa
populacional do município, deixando a cargo dos TREs arbitrar o
número correto", expôs. "No entanto, a que menos interessa aos
senhores é do senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), que coleta
assinaturas para uma PEC que propõe extinção dos salários dos
vereadores nos municípios com menos de 15 mil habitantes",
continuou.
A revelação do jurista provocou várias
manifestações de protesto da platéia, que o presidente, deputado
Paulo Cesar (PFL), precisou controlar com energia. José Marcelo
Botelho, vereador em Jaci, indignou-se com esse novo ataque à classe
dos vereadores: "Todos os vereadores, mesmo os menos capazes,
procuram trabalhar e fazer alguma coisa pela cidade. E no final do
mês, vamos à Câmara buscar o salário para pagar uma passagem de
ônibus, comprar um remédio, acudir uma pessoa em dificuldade. Todo
mundo que trabalha precisa ganhar. Democracia aqui é só para os
ricos. Os pobres vivem na ditadura da miséria e do desemprego",
desabafou.
Vereadores discordam quanto às estratégias para
combater a redução
O vereador Paulo de Castro, do município de
Candeias, ficou tão exaltado com as ameaças que sugeriu até reações
mais drásticas aos vereadores. Eustáquio Patrício, presidente da
Câmara de Carandaí, onde o número de vereadores pode cair de 13 para
9, queixou-se do desrespeito à classe. "Vereador é pau de amarrar
égua. Tudo de ruim é com o vereador. Precisamos mostrar nossa força
com inteligência, e não com armas e pedras", afirmou.
Fizeram seus protestos também a vereadora Inês
Santos, de Bom Jesus do Amparo, que também é defensora pública, e os
vereadores Ivan de Oliveira, de Sabinópolis, e Rui Palomo, de Ouro
Fino. Cláudio Paes, de Santos Dumont, relatou as dificuldades para
resolver problemas dos cidadãos: "De manhã, a gente tem que abrir o
portão de casa bem devagar, pra não cair gente dentro".
O vereador Betinho Duarte foi voz dissonante entre
os protestos. Ele se declarou favorável à aplicação da decisão do
Supremo sobre Mira Estrela para todo o Brasil, e considerou as PECs
eleitoreiras, precipitadas e oportunistas. Ouviu protestos da
platéia ao afirmar que "vereador não é profissão".
Vozes conciliatórias também se fizeram ouvir. Darci
Souza Lima, diretor da Uvemig, revelou que foi enviado a Brasília
para sondar o ânimo dos parlamentares. Conversou com vários líderes,
e obteve a informação de que seria votado um substitutivo anexando
partes das demais propostas. O artigo 29-B estabeleceria limites de
sete vereadores para municípios até 7 mil habitantes, até o máximo
de 55 para municípios acima de 10 milhões. Darci sugeriu que a
questão fosse encarada com "humildade e sabedoria, calma e
paciência, porque a força não vai vencer".
PECs teriam que ser votadas até 10 de junho
O consultor jurídico Mauro Bomfim mostrou várias
divergências de interpretação em relação aos pontos de vista do
promotor Thales Cerqueira. Para ele, a Resolução do TSE foi "uma
forma engenhosa encontrada pelos magistrados para impor uma regra
sem submetê-la ao Legislativo". Isso teria transformado o processo
eleitoral num "manicômio judiciário". Bomfim deplorou os sucessivos
remendos à Constituição, que comparou a um "terreno baldio onde
todos colocam coisas que não deveriam estar ali".
Para o consultor, o artigo 16 de Constituição não é
cláusula pétrea, e pode ser modificado pelas PECs. No entanto,
lembrou que a lei que disciplina o processo eleitoral é a 9.504/97.
Pelos prazos que impõe para as convenções partidárias e para o
programa das urnas eletrônicas, Bomfim acredita que o prazo fatal de
votação seria o dia 10 de junho. "Se a PEC não for voltada até esta
data, vale o que está em vigor", afirmou.
Branca de Castilho Souza Cunha, presidente da
Uvemig, confessou-se perplexa com os ataques que os vereadores
sofrem da imprensa, da opinião pública e do Congresso. No entanto,
condena especificamente a ação do Ministério Público. "Por que o MP
entra na nossa casa e nos manda fazer projeto de lei reduzindo o
número de vereadores? Recomendo a todos que não o façam e aguardem
as decisões do Congresso".
Vários deputados participaram dos debates,
conduzidos pelo deputado Paulo Cesar, que presidiu a reunião. Fábio
Avelar (PTB) repudiou "a balbúrdia judiciária a poucos meses da
eleição". Alencar da Silveira Jr. (PDT), incentivou os vereadores a
telefonarem para seus deputados federais e cobrarem a defesa de suas
posições. Laudelino Augusto (PT) defendeu a redefinição dos
quantitativos das câmaras, mas nem sempre para menor. Para ele, há
cidades que precisam de representação maior.
Ao final da reunião, o deputado Paulo Cesar mandou
coletar entre os presentes assinaturas em um manifesto para ser
encaminhado ao presidente da Câmara Federal, pedindo que não permita
a alteração dos quantitativos para estas eleições. Dalmo Ribeiro
Silva pediu que um relatório da reunião seja enviado a todas as
câmaras municipais de Minas.
Presenças - Participaram
da reunião os deputados João Bittar (PL), presidente; Paulo Cesar
(PFL), vice-presidente; Olinto Godinho (PSDB), Dalmo Ribeiro Silva
(PSDB), Fábio Avelar (PTB), Laudelino Augusto (PT), Alencar da
Silveira Jr. (PDT), José Henrique (PMDB) e a deputada Cecília
Ferramenta (PT).
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