Leishmaniose visceral é debatida em reunião conjunta de
comissões
As comissões de Saúde e de Política Agropecuária e
Agroindustrial da Assembléia reuniram-se conjuntamente nesta
terça-feira (4/5/04) para debater questões relacionadas a
leishmaniose visceral. O autor do requerimento pedindo a audiência
pública, deputado Gil Pereira (PP), apresentou o quadro atual da
zoonose, transmitida principalmente pelos cães. Segundo ele, a
doença tem avançado nos últimos anos, atingindo cerca de 3 mil casos
em 2003 no Brasil, e apresentando uma taxa de mortalidade alta, de
cerca de 10%. Só no Norte de Minas, região que apresenta o maior
número de casos no Estado, ao lado do Vale do Jequitinhonha e Região
Metropolitana de Belo Horizonte, foram 78 ocorrências, de acordo com
o deputado. Pereira acrescentou que já existe uma vacina para a
leishmaniose visceral, só que a um custo ainda alto - cerca de
R$30,00 a dose. Ainda assim, ele defendeu a inclusão da vacina nos
programas governamentais de combate à doença.
A diretora da Secretaria de Estado da Saúde, Simone
Marrocos, disse que a doença vem se expandindo no país e de maneiras
diferenciadas em cada região, o que já seria um problema no controle
da leishmaniose. Ela exemplificou que, ao contrário do Nordeste
brasileiro, onde as maiores vítimas da zoonose são menores de quatro
anos, em Minas, os mais atingidos são adultos, entre 20 e 64 anos,
principalmente pessoas debilitadas. Em 2003, segunda ela, de um
total de 811 casos no Estado, 410 foram na RMBH e 331 em Montes
Claros.
Prevenção - Simone
informou que medidas para prevenir a leishmaniose devem ser voltadas
tanto para o homem quanto para o cão. Para o homem, ela sugere que
seja evitada a exposição à noite, quando há maior atuação do inseto
transmissor - o flebótomo -, e uma maior divulgação da doença.
Medidas preventivas quanto ao animal seriam evitar banho freqüente e
tosas entre novembro e abril (quando aumentam os insetos), usar
coleiras ou dar banho com inseticidas. Quanto à vacina, a diretora
ressaltou que não foi ainda comprovada sua total eficácia. Sobre
esse último assunto, o assessor da Secretaria, Francisco Lemos,
acrescentou que, antes de se adotar a vacina, deve-se avaliar a
relação custo-benefício dessa ação, mesmo porque só a vacina não
resolveria o problema. Questões ambientais e referentes ao controle
do vetor (inseto transmissor) também devem ser contempladas, no
entendimento dele.
Maiores vítimas são pessoas debilitadas e em
condições precárias
A técnica da Secretaria Municipal de Saúde de Belo
Horizonte, Vanessa Pires Fiúza, registrou que a leishmaniose
visceral ocorre na cidade desde 1994, mas após 2001, aumentaram os
casos. O controle da doença é complexo porque o fator
sócio-econômico é determinante. Pessoas debilitadas fisicamente e
expostas a condições precárias seriam as principais vítimas. Por
esse motivo, a prefeitura tem concentrado o combate à doença
principalmente em vilas e favelas, fazendo borrifações de
inseticida. Vanessa defendeu mais campanhas educativas sobre a
doença, além da atuação conjunta dos três níveis de governo.
Pobreza - O presidente da
Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais
(Anclivepa), Vítor Márcio Ribeiro, avalia que "as maiores causas das
doenças infecciosas são a pobreza e a injustiça social". Como o
Brasil investe pouco em saúde, o quadro vem se agravando, segundo
Ribeiro, que questionou a ação do poder público no controle da
zoonose, principalmente o sacrifício do animal suspeito de ter a
doença. "Se o uso do colar de inseticida na população canina elimina
80% da possibilidade de transmissão, por que matar
indiscriminadamente os cães?", lamenta.
Laboratório afirma que vacina tem eficácia
comprovada
Contrariamente ao que afirmou a Secretaria de
Estado da Saúde, Ingrid Mens, representante do Laboratório Fort
Dodge, fabricante da vacina Leishmune, declarou que o medicamento
teria sim, eficácia comprovada. Ela informou que o laboratório
passou por todas as etapas exigidas pela Organização Mundial de
Saúde (OMS), para atingir o sucesso da vacina. Para a imunização do
animal, seriam necessárias três doses anuais da vacina, com
intervalos de aplicação de 21 dias, o que representaria um grande
avanço em relação à política atual de combate à doença. Ingrid disse
que atualmente o órgão de vigilância sanitária notifica o dono do
cão da doença, faz um inquérito epidemiológico e sacrifica o animal.
Ela defendeu que, se a vacina fosse incluída nas políticas públicas
de prevenção, seria possível fazer um diagnóstico antes da
vacinação, emitir-se certificados de vacinação e atestados finais
para cães comprovadamente imunizados. Com isso, se evitaria a
eutanásia de animais.
Representando a empresa Intervet, que fabrica a
coleira contra leishmaniose, Marcel Cabral, realçou que "a prática
da eutanásia compulsória dos cães, adotada no Brasil, é inadmissível
na Europa". De acordo com Cabral, a coleira libera um princípio
ativo por quatro meses, continuamente, controlando picadas de
moscas, pulgas e carrapatos em cães. Lançada em 2001 no Brasil, o
produto preveniria a zoonose em 96% dos casos, o que seria
comprovado por pesquisas, segundo Cabral. Os estudos realizados no
Brasil, Itália e Irã mostraria ainda que a coleira seria também mais
eficaz que o sacrifício dos cães.
Controle - A professora do
Departamento de Parasitologia do ICB/UFMG, Marilene Michalick, disse
que o controle da doença é complexo e delicado. "Medidas aplicadas
com sucesso no passado hoje não se aplicam mais, porque o meio
ambiente mudou muito", explicou. Ela também julga necessário
estimular as cooperações para combater a doença das esferas
governamentais entre si e com a sociedade, principalmente com ações
na área de educação.
O presidente da Comissão de Saúde, deputado Ricardo
Duarte (PT) lamentou, ao final da reunião que "o governo estadual,
infelizmente, não cumpre a Emenda Constitucional que prevê gastos de
12% do orçamento na saúde. Ele informou que o gasto do Hospital das
Clínicas de São Paulo seria o mesmo que o investimento anual do
Estado na saúde: R$800 milhões.
Presenças - Participaram
da reunião os deputados Ricardo Duarte (PT), presidente da Comissão
de Saúde, Carlos Pimenta (PDT) e Célio Moreira (PL); Gil Pereira
(PP), presidente da Comissão de Política Agropecuária e
Agroindustrial; e Padre João (PT), vice.
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