Para deputados, Solaris foi beneficiada na compra de ações da
Comig
Em uma reunião que durou cinco horas e contou com a
presença de 12 deputados, a Comissão de Fiscalização Financeira e
Orçamentária da Assembléia Legislativa ouviu, nesta quinta-feira
(4/12/2003) depoimentos sobre a venda de ações da Companhia
Mineradora de Minas Gerais (Comig) para a empresa Solaris Company
Limited e o financiamento de obras pela Comig. A suspeita de que
houve beneficiamento para a Solaris na venda de 2,5% da ações da
Comig - que pertenciam à Companhia de Desenvolvimento do Vale do São
Francisco (Codevasf) - foi um consenso entre os participantes. Essas
ações foram vendidas em um leilão no dia 4 de dezembro de 2001,
quando a Comig, mesmo tendo contratado a Corretora Itaú para a
negociação, deixou de comprar essas ações. No edital autorizando a
transação, estava previsto que seria necessário o pagamento de
apenas 10% do valor das ações em dinheiro vivo. O restante seria em
moedas podres. Foi o que a Solaris fez, desembolsando R$ 120 mil.
Logo depois, embolsou R$ 1,1 milhão dos dividendos anuais da Comig
correspondentes às suas ações.
O que chamou a atenção dos participantes foi como a
Comig, sabendo do valor dos dividendos que seriam entregues, não
adquiriu essas ações. Para o promotor estadual da Coordenadoria de
Defesa do Patrimônio Público, Carlos André Mariane Bitencourt, é
preciso averiguar os fatos com a quebra de sigilo bancário dos
envolvidos na transação. Segundo ele, o Ministério Público tomou
conhecimento dos fatos em outubro do ano passado e as investigações
apontam como "espantosa" a conversa entre o contador da Comig, de
nome Reginaldo, responsável pela negociação da venda, e o corretor
do Itaú, Mário Rossec. O promotor disse que o corretor induziu a
perda da proposta, mas isso não justifica o fato de a Comig não ter
autorizado a compra dessas ações, já que o processo de venda foi
aberto no dia 16 de novembro e a compra ocorreu 19 dias depois. "A
Comig deveria ter ordenado cobrir qualquer lance que surgisse. Isso
não ocorreu", opinou. Na época, o presidente da companhia era
Henrique Hargreaves, atual chefe de representação do governo de
Minas em Brasília.
Segundo o atual presidente da Comig, Oswaldo Borges
da Costa, o governo cogitou a possibilidade de desapropriar as ações
da Solaris para investigar os fatos, mas a assessoria jurídica da
Comig se deparou com impedimentos legais. Em função disso, Oswaldo
explicou que a Comig adotou medidas administrativas, ente elas a de
enquadrar a divisão de dividendos, que anteriormente era baseada na
totalidade dos lucros. "Enquadramos essa divisão para o mínimo de
6%, como prevê o estatuto". Com isso, a transferência anual para a
Solaris, que chegou a R$ 1,1 milhão em 2001, foi de R$ 70 mil nesse
ano. "Essas medidas administrativas serão eficazes porque não nos
sentiremos mais usados por essas pessoas", disse Oswaldo,
ressaltando que, se houver embasamento legal para desapropriar as
ações, a Comig está pronta para fazê-lo.
Perguntado pelo deputado Rogério Correia (PT) qual
seria o custo para a Comig dessa desapropriação, Oswaldo Borges
disse que seria de pouco mais de R$ 2 milhões, que é o valor atual
das ações. Segundo o promotor estadual da Coordenadoria de Defesa do
Patrimônio Público, Leonardo Duque Barbabela, o fundamento para
desapropriar as ações seria de que o Estado não poderia ter uma
empresa integrante que seja obscura como a Solaris.
Dificuldades nas investigações
O promotor Carlos André disse aos deputados das
dificuldades enfrentadas em obter informações sobre a Solaris, com
sede nas Bahamas, e quem são os sócios dessa empresa. O presidente
da Comig, Oswaldo Borges da Costa, disse que seria fundamental dar
um ponto final nessa história e investigar a origem do problema.
Atualmente, segundo o advogado Genival Tourinho, os dividendos da
Solaris estão sendo depositados em juízo em uma conta do Citibank,
totalizando cerca de R$ 800 mil.
Todos os deputados demonstraram sua estranheza em
relação à venda das ações. O deputado Ermano Batista (PSDB),
presidente da comissão, ressaltou o fato "intrigante" que foi essa
venda e que a Assembléia está sendo cobrada para esclarecer os
fatos. Já o deputado Chico Simões (PT), autor do requerimento
solicitando a reunião, cobrou que seja apurado quem aproveitou de
conhecimento e poder para se beneficiar da transação. "Quero saber o
responsável, os autores dessa proeza", disse.
Na opinião do deputado Irani Barbosa (PL), o Estado
é benevolente com pequenos acionistas como a Solaris, que "surgem ao
vento". Já o deputado Mauro Lobo (PSB) disse que é difícil acreditar
que a venda dessas ações foi uma operação normal. Outro
questionamento levantado pelo deputado Zé Maia (PSDB) foi de
procurar saber por que um ex-presidente da Comig, Carlos Cota, foi
também presidente da Codevasf, ex-proprietária das ações vendidas à
Solaris.
Já o deputado Gustavo Valadares (PFL) defendeu o
governo e a diretoria atual da Comig e concordou que o tráfico de
influência deve ser analisado. Os deputados Fábio Avelar (PTB) e
Adalclever Lopes (PMDB) ressaltaram a importância de investigar o
caso sem fazer pré-julgamentos.
Investimento da Comig em obras é
questionado
O deputado Laudelino Augusto (PT) apresentou casos
que indicam problemas nos convênios firmados com a Comig, entre 1999
e 2002, principalmente nas obras na BR-383, entre Maria da Fé e
Cristina, e em Ouro Preto, na estrada entre a cidade o distrito de
Cachoeira do Campo, e na ampliação do abastecimento de água na
região dos Inconfidentes. Segundo o presidente da Comig, Oswaldo
Borges da Costa, "é pelo menos curioso" o posicionamento de efetuar
obras um pouco fora do que se previa para a companhia. "O governador
Aécio Neves determinou a suspensão de qualquer convênio de obras
como estava ocorrendo no governo passado", disse Oswaldo.
O advogado Rogério Peret Teixeira, autor de uma
ação popular contra os obras em Ouro Preto, disse que
irregularidades foram cometidas com recursos da Comig - cerca de R$
4,5 milhões - e que somente 30% a 40% da obra foi concluída. Segundo
ele, depois que a ação popular foi impetrada, a prefeitura acelerou
as obras para que a perícia não constatasse a não-execução da obra.
Entre as irregularidades apontadas pelo Ministério Público, está o
asfaltamento de trecho inexistente em Cachoeira do Campo. Na defesa
da prefeitura, o advogado Francisco Galvão disse que o Judiciário
tem tomado decisões fundamentadas contra todas as ações populares
impetradas. "A obra é real e a prefeitura contratou auditoria. A
Comig está sendo envolvida em uma massa de manobra nessa briga
paroquial", opinou.
Requerimentos aprovados
Foram aprovados dois requerimentos. Um do deputado
Chico Simões (PT), que solicita o envio pela Comig de cópia do
contrato com a Itaú Corretora para representá-la no leilão da venda
de ações da Comig; e outro do deputado Adalclever Lopes (PMDB),
convidando Laura Maria Mourão, autora da ação popular contra a
Comig, para prestar esclarecimentos nesta comissão.
Presenças - Compareceram à
reunião os deputados Ermano Batista (PSDB), presidente; Chico Simões
(PT), Doutor Viana (PFL), Mauro Lobo (PSB), Adalclever Lopes (PMDB),
Irani Barbosa (PL), Zé Maia (PSDB), Rogério Correia (PT), Laudelino
Agusto (PT), Gustavo Valadares (PFL), Leonídio Bouças (PTB) e Fábio
Avelar (PTB).
|