Criação de Reserva Florestal pode prejudicar moradores da
região
A ampliação de 20 para 50 mil hectares da área da
Reserva Biológica da Mata Escura, no município de Jequitinhonha,
entre os Vales do Jequitinhonha e Mucuri, pode prejudicar mais de
mil famílias assentadas na região. Este foi o principal argumento
usado durante a audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e
Recursos Naturais, realizada nesta quarta-feira (3/12/2003), a
pedido da deputada Maria José Haueisen (PT). A parlamentar
classificou como arbitrária a expansão da área, que, anteriormente,
era considerada parque ecológico. "A reserva foi criada por um
decreto do presidente Lula e da ministra do Meio Ambiente, Marina
Silva, sem que eles tivessem conhecimento das conseqüências que ele
poderia causar. É preciso reconhecer o erro e tentar revogá-lo",
afirmou.
A deputada Maria Tereza Lara (PT) também lamentou a
expansão da reserva e disse que não irá medir esforços para resolver
esta situação, "se não pelo diálogo, recorrendo ao Ministério
Público, para que ele impeça a concretização do decreto". Segundo o
representante da Comissão Pró-Mata Escura, Frei Pedro José de Assis,
cerca de 1100 famílias que vivem na área da reserva, que representam
24 mil habitantes, estão ameaçados de perder "suas raízes e
cultura". Segundo ele, a população não foi consultada e precisa de
ajuda para reverter o problema.
A ampliação da reserva também foi criticada pela
superintendente-executiva da Associação Mineira em Defesa do Meio
Ambiente (Amda), Maria Dalce Ricas, por "desconsiderar questões
sociais". Ela destacou a importância de uma ação conjunta entre as
entidades ambientais para agilizar a revogação do decreto que cria a
Reserva Mata Escura com maiores dimensões.
Sobrevivência depende da terra
O secretário da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura, Juracy Moreira Souto, enfatizou que a
área da Mata Escura é inferior à região prevista pelo decreto.
Segundo ele, há um consenso quanto à necessidade de preservação da
mata, mas a população que ali mora não pode ser desconsiderada. Para
Juracy Souto, é preciso suspender imediatamente o efeito do decreto
e voltar a discutir a extensão original da reserva, que são 20 mil
hectares.
O presidente da Federação dos Trabalhadores na
Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da
Silva, destacou que o desenvolvimento sustentável de uma área
depende não só da preservação ambiental, mas também das condições
sociais e econômicas de seus moradores. Os quilombolas
remanescentes, os índios e os agricultores que estão assentados na
região precisam da terra para sobreviver", reforçou. Segundo ele, a
produção agrícola da região é responsável por 80% do consumo dos
municípios de Jequitinhonha e Almenara. "Com a desocupação os
municípios ficariam desabastecidos", alertou.
Falta de recursos prejudica trabalho de
agricultor
Outro ponto discutido foi a falta de recursos
públicos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (Pronaf), uma linha de crédito para o agricultor que,
conforme explicou a advogada da Fetaemg, Sonia Mara Prata, está
desativada. A advogada sugeriu à comissão que envie um ofício ao
Ibama e ao Ministério do Meio Ambiente, solicitando a liberação da
linha de crédito. O representante dos atingidos da reserva biológica
Mata Escura, Santos Martins Prates, também pediu o apoio dos
deputados, pois "mais de 100 famílias estão impedidas de trabalhar
por falta de condições". Ele afirmou que, neste ano, quase R$ 200
mil deixarem de ser investidos na região.
O assistente técnico de Meio Ambiente da Polícia
Militar, capitão Arley Ferreira, disse que a polícia deve trabalhar
de maneira integrada com a sociedade na região, de forma a
possibilitar o cumprimento da lei e a colaboração com os interesses
comuns. Ele sugeriu que a comissão leve o problema da Mata Escura ao
comando da PM na região.
Biodiversidade também deve ser considerada
O coordenador da área de Proteção à Vida Silvestre
do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Ronaldo Cézar, estabeleceu
um contraponto com a fala dos demais convidados ao apontar os
atributos da biodiversidade da Mata Escura que serão preservados com
a criação da reserva. Ele considera legítima as reclamações dos
assentadas na região, mas alerta para o fato de que muitos não têm
licença ambiental para estar ali. Ele apontou a proteção do
ecossistema como fator importante e sugeriu que sejam pensadas
alternativas para expandir a área a ser preservada sem prejudicar a
população.
Requerimentos - Dois requerimentos foram
aprovados. O primeiro, da deputada Marília Campos (PT), solicita à
ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que receba a comissão para
discutir os problemas que afetam as famílias que moram na área da
Reserva Ecológica da Mata Escura. O outro, do deputado Gil Pereira
(PP), pede a realização de audiência pública em Montes Claros, para
discutir o Programa de Revitalização da Bacia do Rio Verde
Grande.
Projeto sobre transgênicos tem parecer
favorável
A comissão analisou pareceres sobre dois Projetos
de Lei (PLs). O PL 12/2003, do deputado Ricardo Duarte (PT), recebeu
parecer pela aprovação, na forma do substitutivo nº 1, da CCJ, e com
três emendas. O projeto estabelece normas de segurança e mecanismos
de fiscalização no uso das técnicas de engenharia genética e
liberação no meio ambiente de Organismos Geneticamente Modificados
(OGMs) no Estado.
Segundo destacou a relatora, deputada Maria José
Haueisen, o substitutivo ajustou o projeto, eliminando a duplicidade
de competências entre a lei federal, a ser editada, e o que deve ser
suplementado pelos Estados. "O substitutivo evita a superposição de
atribuições para o controle de OGMs, mantendo-se, porém, a
articulação com os órgãos e entidades da União e a obrigatoriedade
do acompanhamento e fiscalização das atividades e dos projetos
relativos ao setor", afirmou. A relatora lembrou que o novo texto
proposto pela CCJ mantém, ainda, a necessidade do registro, do
cadastro, do licenciamento e da comunicação por parte do
empreendedor, além de multa para possíveis infratores.
As emendas apresentadas, segundo Maria José
Haueisen, objetivam ampliar os instrumentos estaduais de controle
fiscalização de OGM. A de nº 1 inclui, no artigo 1º, a
comercialização dos transgênicos como item a ser observado pela
futura lei. A de nº 2 acrescenta parágrafo único ao artigo 2º,
determinando que compete aos órgãos estaduais de fiscalização e de
controle dos OGMs recomendar às autoridades competentes a suspensão
e a cassação de autorização ou licenciamento de ações em desacordo
com a lei. Já a emenda nº 3 inclui, onde convier, dispositivo para
que alimentos e ingredientes destinados ao consumo humano ou animal
produzidos com OGMs tragam no rótulo informações sobre essas
característica, sem prejuízo da legislação de rotulagem vigente.
Construção de barragens -
Já o PL 565/2003, do deputado Fábio Avelar (PTB), recebeu parecer
pela aprovação, com a emenda nº 1, da CCJ, e com a emenda nº3, que
apresentou, e pela rejeição à emenda nº2, também da CCJ. O projeto
cria a Política Estadual de Estímulo à Construção de Barragens e de
Desenvolvimento Econômico das Regiões dos Vales do Jequitinhonha, do
Mucuri e do Norte de Minas, com o objetivo de combater os efeitos da
seca e melhorar a oferta de água. O relator foi o deputado Leonardo
Quintão (PMDB).
A emenda nº 1, da CCJ, sobre a qual a Comissão de
Meio Ambiente é favorável, substitui, no artigo 1º, os Vales do
Jequitinhonha e do Mucuri pelo Nordeste de Minas. A mudança ajusta o
projeto à Lei 14.171, que cria o Instituto de Desenvolvimento do
Norte e Nordeste de Minas (Idene) e considera como Nordeste do
Estado também as bacias do Rio Pardo e do São Mateus, regiões
igualmente caracterizadas pelos problemas do semi-árido mineiro. Já
a emenda nº 2, da CCJ, suprime o artigo 4º sob o argumento de que a
matéria já é tratada pela legislação vigente. Mas, segundo o
relator, que opinou pela rejeição dessa emenda, "houve excesso de
rigor pela CCJ, pois a proposição orienta o poder público na
consecução dos objetivos propostos, redirecionando as ações do
governo estadual nesse sentido".
Já a emenda nº 3, apresentada pela Comissão de Meio
Ambiente, dá ênfase especial à conservação das águas de chuva por
meio da construção de microbarragens, acrescentando páragrafo único
ao inciso IV do artigo 2º do projeto. A emenda também dá nova
denominação às regiões, conforme proposto pela emenda nº 1, da CCJ.
Presenças - Participaram
da reunião as deputadas Maria José Haueisen (PT), presidente,
Marília Campos (PT) e Maria Tereza Lara (PT) e os deputados Fábio
Avelar (PTB), José Milton (PSDB), Leonardo Quintão (PMDB) e Ricardo
Duarte (PT), além dos convidados citados na matéria e a presidente
do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jequitinhonha, Valdete
Cerqueira dos Santos; o presidente do Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural Sustentável de Jequitinhonha, Deraldo Leandro
Mendes; e o ex-prefeito de Jequitinhonha, José Hertz.
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