Cooperativas reclamam de contratação direta pela
Fiemg
A contratação direta de mais de 500 professores e
instrutores de cursos ministrados pelo Sistema Fiemg, anunciada há
dias pela Delegacia Regional do Trabalho (DRT) como um dos grandes
êxitos trabalhistas desta gestão, foi contestada por duas
cooperativas de mão-de-obra na reunião da Comissão de Direitos
Humanos da Assembléia, nesta terça-feira (28/10/2003). Dirigentes da
Cooperativa de Núcleo Avançado e Tecnológico Ltda (Coopernat) e a
Cooperativa de Tecnologia Empresarial e Educacional Ltda (Cooptee)
denunciaram aos deputados que foram excluídos da negociação que
envolveu a DRT, o Ministério Público do Trabalho, o Sindicato dos
Professores e a própria Federação das Indústrias do Estado de Minas
Gerais.
O requerimento da audiência pública foi feito pelo
deputado Paulo Piau (PP), sob o argumento, anunciado pelo presidente
da comissão, deputado Durval Ângelo (PT), de que o direito
constitucional ao trabalho é um direito humano e qualquer
cerceamento a ele interessa à Comissão de Direitos Humanos. Heliane
Gomes Azevedo, presidente da Cooptee, afirmou que, embora sua
cooperativa esteja absolutamente em dia com suas obrigações legais,
vem sendo vítima de perseguição pelo Ministério Público do Trabalho.
Deivson Oliveira Vidal, da Coopernat, apresentou queixa semelhante,
dizendo que a Fiemg era seu grande cliente, mas que lhe fechou
bruscamente as portas em julho, depois de pressionada pelos
procuradores do Trabalho.
Mudança na CLT deturpou objetivo
O representante do MPT, Geraldo Emediato de Souza,
disse que as cooperativas do trabalho se proliferaram a partir de
1994, ao ser criada uma brecha na CLT, quando a finalidade foi
deturpada. A maioria dessas cooperativas seria fraudulenta, ou seja,
seria mera fornecedora de mão-de-obra, onde os "cooperados" não têm
autonomia e nem recebem os lucros do fruto do seu trabalho, como
deve acontecer nas cooperativas autênticas. Emediato rebateu as
acusações de cerceamento, afirmando que, ao ser provocado por uma
denúncia, o Ministério Público tem obrigação de investigar e ajuizar
ações que tenham fundamento. "Se não atuarmos, estaremos
prevaricando. Não temos liberdade para não atuar. Nossa ação é no
sentido de coibir a fraude e impedir a intermediação pura e simples
de mão-de-obra".
No caso das cooperativas que forneciam mão-de-obra
à Fiemg, as investigações do MPT teriam demonstrado que haveria essa
intermediação. Como evidências de desvirtuamento da finalidade,
Emediato citou casos de cooperativas onde o membro não conhece a
diretoria e jamais participou de uma assembléia. "As cooperativas
típicas de trabalho são as dos taxistas, por exemplo, onde os
motoristas detêm os meios de produção, que são seus carros, e
participam dos benefícios da atividade. Da mesma forma as dos
serviços de entrega em motocicleta, onde os cooperados se beneficiam
da organização da atividade", disse o procurador
Magistratura é contra precarização
O presidente da Associação dos Magistrados do
Trabalho, Orlando Tadeu de Alcântara, afirmou que "a Amatra jamais
seria contrária ao sistema cooperativista", mas que tem observado
que nos últimos anos "inúmeras ações contra cooperativas estão
sobrecarregando a magistratura. Para ele, a alteração feita em 1994
foi infeliz. "Precisamos verificar a quem serve a cooperativa, quem
está auferindo os lucros da atividade. O cooperado não pode
trabalhar em condições de subordinação, porque isso configura desvio
de finalidade. A magistratura é avessa à precarização dos direitos
trabalhistas", disse o magistrado.
Para o advogado da Cooptee, Vlader Marden Mendes, o
Ministério Público teria exorbitado, "invadindo a seara das relações
civis", e contrapôs que "não existe a obrigatoriedade de que o
cooperado conheça a diretoria e compareça às assembléias". Para ele,
compete à diretoria afixar os editais de convocação em local
visível, mas o cooperado tem o direito de não comparecer. Heliane e
Deivson completaram que muitos dos professores que lecionam no
Sistema Fiemg são aposentados que dão cursos de 2 a 3 dias, sem
interesse de entrar para o sistema celetista. Alguns deles, com
pós-graduação e sólida carreira, considerariam uma humilhação estar
sujeitos ao cartão de ponto. "Diferentemente dos bóias-frias e dos
colhedores de café do Jequitinhonha, que são explorados por falsas
cooperativas, nós somos empreendedores do nosso próprio talento",
disse Heliane Azevedo.
Opiniões sobre contrato celetista são contrárias
Durante boa parte da reunião, o presidente Durval
Ângelo administrou a palavra para dar vazão às argumentações dos
dois lados. As autoridades do trabalho apresentavam as razões para
sua atuação em favor do contrato celetista para os professores e os
dirigentes cooperativistas reafirmavam que foram excluídos das
negociações e que a maioria dos cooperados foi coagida a aceitar o
contrato celetista.
Carlos Calazans, delegado regional do trabalho,
disse que compareceu à solenidade de assinatura das carteiras de
trabalho e que, desde então, não recebeu sequer uma queixa dos cerca
de 500 professores contratados. Calazans considera o evento um
grande êxito e motivo de comemoração para a DRT o fato de, neste
ano, apesar da economia combalida, a Região Metropolitana de Belo
Horizonte ter batido recordes de formalização de contratos de
trabalho em carteira.
"A terceirização foi a coqueluche dos anos 90, mas
agora estamos observando um refluxo. Os empresários observaram que a
produtividade do terceirizado, seu compromisso com os objetivos da
empresa, não são os mesmos de um empregado direto. A Açominas está
desterceirizando e retomando o vínculo empregatício com mais
de mil trabalhadores. Isso é um feito extraordinário", saudou o
delegado regional do Trabalho.
A deputada Marília Campos (PT), também pertencente
à Comissão do Trabalho, relatou que, durante sua militância
sindical, a principal saída para combater o desemprego "era a idéia
de retirar um pouco da proteção do trabalhador, a 'flexibilização'
dos direitos trabalhistas. Isso sempre me incomodou, e também não
deu resultado, porque o desemprego não foi solucionado. O
desvirtuamento trazido pelo artigo 442 da CLT deve acabar", propôs a
deputada.
Geraldo Carneiro Santos, da fiscalização da DRT,
apoiou a proposta de Marília Campos, pela revogação do parágrafo 1º
do artigo 442 da CLT, e relatou casos "gritantes" de simulação de
cooperativismo, como o de 16 mil colhedores de café em Capelinha, no
Jequitinhonha, e de uma empresa que demitiu todos os empregados e os
recontratou via cooperativa.
Fiemg aponta riscos
O vice-presidente da Fiemg, Osmani Teixeira de
Abreu, também apresentou suas opiniões sobre o cooperativismo e
distinguiu essa forma de trabalho da terceirização. Confirmou que há
profissionais que se sentem humilhados por bater cartão de ponto.
Ele admitiu que a Federação avaliou a insegurança jurídica e o risco
trabalhista representado pelas cooperativas, antes de se decidir
pela contratação direta. "A legislação em geral se presta a muitas
interpretações", argumentou.
O presidente Durval Ângelo considerou que o
objetivo da convocação da reunião estava esvaziado, mas que o alto
nível do debate sugeria manter as discussões em caráter pedagógico
mais amplo. No entanto, o deputado Paulo Piau voltou a considerar
que houve "exacerbação" do MP sobre a Fiemg para afastar as
cooperativas. "O Brasil deveria estar facilitando o cooperativismo.
Aqui, apenas 4% das pessoas são cooperadas, enquanto nos Estados
Unidos são 35% e na Alemanha mais de 40%", argumentou.
O juiz Orlando Alcântara replicou ao deputado que
os exemplos do Primeiro Mundo devem ser mirados também do ponto de
vista da proteção ao trabalho. Geraldo Emediato negou que tenha
havido exacerbação, e que os professores estavam inseridos dentro da
realidade cotidiana da Fiemg.
Presenças: Dep. Durval
Ângelo (PT), presidente; dep. Roberto Ramos (PL), vice; dep. Biel
Rocha (PT), dep. Marília Campos (PT), dep. Paulo Piau (PP).
|