Direitos Humanos constata seguranças armados em fazenda
ocupada
Fitas de vídeo que mostram a presença de um
segurança armado na entrada da Fazenda Canoas, em Montes Claros,
serão encaminhadas para o ouvidor agrário nacional, desembargador
Gercino José da Silva Filho, do Ministério da Reforma Agrária, e
para o Comando da Polícia Militar de Minas Gerais. A gravação foi
feita pelos integrantes da Comissão de Direitos Humanos da
Assembléia Legislativa de Minas Gerais, que participaram, na manhã
desta segunda-feira (27/10/2003), de reunião na Câmara Municipal da
cidade norte mineira. O encontro foi solicitado pelo vice-presidente
da comissão, deputado Roberto Ramos (PL), para discutir os conflitos
agrários no Norte de Minas.
Segundo o presidente da Comissão, deputado Durval
Ângelo (PT), é preciso tomar uma providência, já que a visita à
Fazenda Canoas e ao assentamento da Fazenda Sanharó, próximas a
Montes Claros, mostraram evidências de violências. A Liga dos
Camponeses Pobres do Norte de Minas denunciou à Comissão, as
violências cometidas contra os dois assentamentos. A visita foi
feita de surpresa, antes da reunião. Da Fazenda Canoas, foi
constatada a queima de barracos onde estavam as famílias.
Acusações de lado a lado
Os debates foram marcados por acusações mútuas
de intransigência. De um lado, os representantes de sem-terra,
liderados pelos MST, Liga Camponesa, Comissão Pastoral da Terra, da
igreja Católica, Federação dos Trabalhadores da Agricultura de Minas
Gerais (Fetaemg). E de outro, a Sociedade Rural de Montes Claros e
Cooperativa Agropecuária Regional de Montes Claros, além da Polícia
Militar.
Os sem-terra acusaram os fazendeiros de usarem
milícias armadas, compostas por pistoleiros. Segundo o representante
da Liga Camponesa, Gerson Guedes Lima, existem problemas mais
urgentes nas Fazendas Santa Fé, em Manga, e Rio Verde, em Jaíba. Na
primeira o assentamento é de 120 famílias acampadas há cerca de
cinco meses e, na cidade de Jaíba, o assentamento é de 34 famílias,
despejadas em março e acampadas fora das terras da cidade. Ele disse
que já denunciou a presença das milícias armadas, há a instauração
de processos, mas eles não prosseguem. Na última ação dos
pistoleiros, segundo Gerson Lima, na Fazenda Santa Fé, a Polícia
Militar identificou dois carros, um caminhão e apreendeu uma
espingarda, munição e cartuchos.
Na Fazenda Sanharó, cujo acampamento é liderado
pelo MST, existem cerca de 250 famílias acampadas desde março
passado. A polícia militar alega que não consegue entrar no
acampamento, para verificar denúncias de armas, por parte dos
acampados.
O presidente da Sociedade Rural, Alexandre Viana,
negou que os fazendeiros estejam criando milícias particulares, mas
invocou o Código Penal, para defender o direito de manterem intactas
suas propriedades. Para ele, "o instituto da propriedade privada no
País ainda está em vigor, o que nos dá o direito de nos
defendermos".
Viana disse que o Ministério Público vem tratando o
caso com parcialismo, "beneficiando claramente os sem-terra". Ele
denunciou que não há o mesmo tratamento, quando os fazendeiros
denunciam os desmatamentos que os acampados fazem nas fazendas,
"como ocorreu em Jaíba". Ele criticou especialmente o e coordenador
do Centro de Apoio Operacional de Apoio à Promotorias de Direitos
Humanos, Conflitos Agrários e Apoio Comunitário, promotor Afonso
Henrique de Miranda Teixeira.
Ministério Público vai tomar providências
O coordenador da Promotoria de Direitos Humanos e
Conflitos Agrários Afonso Henrique Teixeira garantiu que, depois da
visita e das filmagens feitas na fazenda Canoas e no acampamento
Sanharó, vai tomar medidas urgentes. "Só vou estudar a melhor forma
de fazer isso, para que os processos não parem", enfatizou.
Ele fez um relato das ações do Ministério Público
na região, destacando sobretudo o conflito no acampamento Sanharó,
cuja reintegração de posse já foi pedida pelo proprietário Alceu
Proença. O promotor disse que o ato é ilegal, já que Proença é
"apenas arrendatário da empresa Usifer, que também não era a dona
das terras". Segundo Afonso Henrique, o juiz da Vara Agrária deu
reintegração de posse a alguém que não detinha nem a posse e nem a
propriedade das terras.
Tanto para a Liga Operária, como para o
representante da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Paulo Faccion, o
problema arrasta-se desde a década de 60, quando toda a região Norte
foi ocupada por grileiros, que expulsaram os legítimos donos das
terras, os herdeiros e remanescentes de quilombos. Para Faccion, as
terras são devolutas, pertencendo ao Estado.
Para o comandante do 10º Batalhão em Montes Claros,
a Polícia Militar está no meio de uma disputa e não toma partido de
ninguém. "A Polícia apura as irregularidades". A representante do
Incra, Moema Rocha, admitiu que não há agilidade nos processos de
desapropriação e reconheceu a falta de recursos. Ela criticou a
legislação "que contribui para emperrar os processos".
Dados do Iter
O representante do Instituto de Terras de Minas
Gerais (Iter) Élcio Teixeira informou que são 59 acampamentos no
Norte de Minas, com 4.189 famílias e mais de 30 ações na Justiça. No
Estado são 14 mil famílias em acampamentos. No Norte os
assentamentos estão liderados pelo MST (6), pela Liga Camponesa
(21), pela Fetaemg (30) e de três a quatro por outras entidades.
O deputado Roberto Ramos disse que ficou
impressionado com a situação da Fazenda Canoas e que a Comissão vai
contribuir para que sejam procuradas alternativas de pacificação no
campo. O deputado Carlos Pimenta (PDT) afirmou que há dois anos vem
denunciando os conflitos na região, e que o governo estadual não
agiu com a rapidez que deveria ter agido, naquele tempo.
Presenças - Compareceram à
reunião os deputados Durval Ângelo (PT), presidente; Roberto Ramos
(PL), vice e Carlos Pimenta (PDT).
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