Faltam instrumentos legais para proteger vítimas de violência

A Assembléia Legislativa deve entrar no combate à violência colocando a TV Assembléia à disposição para exibir vinhet...

01/10/2003 - 15:16
 

Faltam instrumentos legais para proteger vítimas de violência

A Assembléia Legislativa deve entrar no combate à violência colocando a TV Assembléia à disposição para exibir vinhetas educativas sobre a assistência às vítimas de crimes violentos. Esta foi uma das decisões anunciadas pelo deputado Durval Ângelo, na reunião especial da Comissão de Direitos Humanos, nesta quarta-feira (1º/10/2003), que discutiu a atuação do Núcleo de Atendimento às Vítimas de Crimes Violentos (NAV-CV), órgão ligado à Subsecretaria de Direitos Humanos, da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes.

Ouvidos representantes de órgãos, do NAV, de especialistas e vítimas, a conclusão do encontro é de que é preciso fazer uma mudança na Constituição Federal, para que a vítima de crimes tenha os mesmos direitos oferecidos legalmente para os autores de crimes. O professor de Direito Penal e membro da Sociedade Brasileira de Vitimologia, promotor Lélio Braga Calhau, e a coordenadora do NAV, Vânia Valadão, destacaram a falta de instrumentos legais para a proteção das vítimas, enquanto os réus têm dezenas de artigos de proteção na Carta Magna. "É preciso fazer uma alteração no Artigo 5º da Constituição Federal, para que os direitos das vítimas tenha o mesmo espaço do que o dos réus", assegurou Lélio Braga.

Núcleo representa o resgate à vítima

A reunião desta quarta-feira foi proposta pelo deputado Mauro Lobo (PSB), com o objetivo de mostrar o trabalho desenvolvido pelo NAV, para demonstrar "que a Comissão de Direitos Humanos preocupa-se com a amplitude dos direitos de todos". E como forma de atender ao anseio da sociedade, "que sempre cobra que a voz da vítima seja ouvida", destacou Lobo.

Em sua exposição, o subsecretário de Direitos Humanos, João Batista de Oliveira, falou da intenção de expandir o trabalho do NAV para o interior, com a criação dos núcleos de Governador Valadares e Uberlândia, já em andamento, e de Montes Claros e Juiz de Fora, para o próximo ano. Ele disse que a demanda do Núcleo vem crescendo e hoje já são feitos cerca de 20 atendimentos por mês. João Batista anunciou ainda a parceria entre a subsecretaria e a Comissão de Direitos Humanos, com a nomeação de dois funcionários que trabalharão permanentemente com os deputados. A subscretaria já oferece um telefone gratuito de denúncia de violências: 0800 311119.

A coordenadora do NAV, Vânia Valadão, explicou que o programa foi implantado em Minas, em 2000, em parceria com o governo federal, após a criação, pelo Ministério da Justiça, do programa de Apoio Pisco-social às Vítimas. O programa funciona em 12 capitais. Em Minas, o atendimento prioritário é para os crimes considerados mais violentos: estupro, latrocínio, homicídio e atentado ao pudor; embora o NAV atenda às demais modalidades, como crimes de trânsito.

Entre 2000 a setembro de 2003, o NAV manteve 372 pessoas cadastradas, fora as famílias, com 2.554 sessões de atendimento. O homicídio é o campeão entre os crimes relatados, com 32,43% dos atendimentos, seguido do estupro, com 16,55%. Vânia informou que entre janeiro de 2002 e janeiro de 2003, houve um crescimento de 11% nas denúncias de estupro, o que não significa aumento do crime, mas pelo menos, aumento das denúncias. No atendimento por idade, há a clara demonstração de que a violência acontece entre jovens e adolescentes: 50,51% dos casos ocorrem na faixa etária entre 0 e 21 anos, e 50,23% das denúncias são de vítimas do sexo feminino.

Mudança de comportamento

Para o promotor Lélio Braga, autor de um livro sobre a vítima, o Núcleo é a forma mais moderna de se resgatar a cidadania. Juizes e promotores vivem diariamente nos fóruns, segundo ele, a frustração de não contar com instrumentos para punir os infratores. Lélio Braga acha que o NAV é um novo momento na criminologia e vitimologia.

O presidente da Associação Nacional de Assistência Judiciária Rede SOS Racismo, José Antônio Carlos Pimenta, acredita que os programas como o Núcleo, o Pró-Vida (de proteção às testemunhas) devem ser prioridade dos governos. Na opinião dele, a violência é fruto da desigualdade social, "plantada ao longo de 500 anos, pelas elites brasileiras". O SOS Racismo é uma Organização Não Governamental que trabalha em parceria com o Núcleo.

O representante da Polícia Militar, tenente Cláudio Duani Martins, discorreu sobre a nova postura da PM, em relação aos direitos humanos. Segundo ele, o policial hoje é treinado para ser um promotor desses direitos, pois é ele quem está na rua, que mantém o primeiro contato com a vítima, "por isso, nosso trabalho tem sido o de priorizar o atendimento à vítima, encaminhando-a para o Núcleo, ou outro órgão, prestando a informação correta", destacou.

Violência assustadora

Exemplificando a violência, o deputado Durval Ângelo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos, apresentou uma vitima de violência, que foi encaminhada naquele momento ao Núcleo. Trata-se da dona de casa Maria Emília Dias Pires, moradora da Vila Ipê, em Contagem. Visivelmente transtornada pelo seu drama, ela relatou, com a ajuda do advogado Dilton Procópio de Andrade, a violência sofrida por ela e sua família. Maria Emília teve três filhos e o companheiro assassinados por um fugitivo da Casa de Detenção Dutra Ladeira, em fevereiro. O crime foi identificado, precipitadamente, segundo Durval Ângelo, como relacionado ao tráfico de drogas, quando não passou de um caso envolvendo um relacionamento afetivo antigo entre o fugitivo e a filha de Maria Emília, uma das vítimas.

Maria Emília também foi agredida com 11 tiros. O advogado informou que está preparando uma ação de reparação por danos materiais e morais contra o Estado, já que o assassino estava sob a guarda do Estado, cuja fuga só foi comunicada à polícia civil, dois meses e meio após ocorrer. Foram ouvidos ainda o depoimento de dois jovens, sobre agressões que teriam sofrido de um policial militar, não fardado. Os dois foram encaminhados à Corregedoria da Polícia Militar e ao Ministério Público.

O deputado Durval Ângelo anunciou ainda o atendimento gratuito oferecido a vítimas, pela Comissão de Direitos Humanos, através de dois escritórios de advocacia, que ofereceram a prestação de serviço e também através do Núcleo de Atendimento da PUC.

Requerimentos

Foram aprovados os seguintes requerimentos: do deputado Padre João (PT), solicitando a apuração de denúncias de abuso policial de soldados do 31º Batalhão de Conselheiro Lafaiete; cinco requerimentos do deputado Durval Ângelo: - pedindo informações aos presidentes do Tribunal de Justiça e de Contas, sobre orientação para ingresso funcional nos dois órgãos. O requerimento acatou sugestão do advogado Mário Ottoboni, que recomendou ainda dois livros sobre APACs aos tribunais; audiência sobre a ocupação de famílias ao longo da Via Expressa, sobretudo as que vivem sob o viaduto da avenida Silva Lobo, ameaçadas de remoção pela Prefeitura de Belo Horizonte.

E ainda: - realização de um debate sobre os 40 anos da Revolução de 1964, que serão completados em março de 2004; visita da comissão com promotores públicos à área da Fazenda Tapera, em Contagem, objeto de audiência pública realizada pela comissão, com compradores de lotes no local, que até hoje não conseguiram licença de construção; - audiência pública dia 9/10, para debater projeto da Câmara Municipal de Belo Horizonte, transformado em lei municipal, recentemente, que revogou direitos de deficientes físicos, ao diminuir a exigência de adaptação de ônibus coletivos para deficientes, de 80, para 5% da frota belo-horizontina.

Presenças: Participaram da reunião os deputados Durval Ângelo (PT), presidente; Roberto Ramos (PL), que dirigiu os trabalhos, inicialmente, e Mauro Lobo (PSB). Além dos convidados, estavam no auditório técnicos da Sedese, da área dos Direitos Humanos, e de outros órgãos.

 

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