Papel de cooperativa na relação trabalhista gera polêmica em
reunião
A possibilidade de empresas legalmente constituídas
poderem contratar os serviços das cooperativas de trabalho foi
discutida durante audiência pública da Comissão do Trabalho, da
Previdência e da Ação Social, nesta terça-feira (23/9/2003). Pontos
de vista em defesa ou atacando a maneira como as cooperativas têm
sido utilizadas nas relações trabalhistas no Brasil foram
apresentados pelos convidados e público presente. Para o professor
de Direito da PUC-Minas e da UFMG, Márcio Túlio Viana, 99,99% das
cooperativas de mão-de-obra são fraudulentas. "Discordo de quem
enxerga nessas cooperativas um meio para acabar com o desemprego.
Por trás dessa roupa nova existe, na realidade, a velha relação
subordinada de emprego", acredita. Opinião contrária tem Gustavo
Arouca, diretor jurídico da Organização das Cooperativas do Estado
de Minas Gerais (Ocemg): "A generalização é perigosa e nos incomoda.
Obviamente existem fraudes, mas não posso afirmar que todas as
sociedades cooperativas são fraudulentas".
De acordo com o juiz do trabalho aposentado e
ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), Dárcio
Guimarães Andrade, as cooperativas são um meio legal de contratação
de mão-de-obra, previsto no artigo 5o, inciso 18 da
Constituição Federal, que também veda a intervenção do Estado nas
cooperativas. "A intervenção do Ministério Público constitui abuso
de autoridade", disse ele, se referindo aos documentos do MP
atestando que algumas cooperativas são ilegais e fraudulentas.
Ronaldo Pires, presidente do Sindicato das Cooperativas de Trabalho
(Sindicoop), também concorda que o Ministério Público do Trabalho
não tem legitimidade para julgar ou extinguir uma cooperativa. Mas
ele tem a posição de que a cooperativa não se propõe a alocar
mão-de-obra, já que seu objetivo é prestar serviços a empresas,
entidades ou instituições públicas.
O presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas
Gerais, Aloísio Lopes, discordou do juiz Dárcio Guimarães Andrade em
relação a alguns pontos, posicionou-se contra a cooperativa como
intermediação de mão-de-obra e elogiou a ação do Ministério Público
do Trabalho "que tem tentado impedir diversas irregularidades no que
diz respeito às relações de trabalho". Para Aloísio Lopes, as
cooperativas que intermediam a mão-de-obra tornam precárias as
relações de trabalho. "As cooperativas enquanto fonte de geração de
renda, espaço para o trabalho são importantes e devem continuar
existindo. As picaretas devem ser extirpadas", opinou. O professor
Marco Túlio também defendeu o Ministério Público do Trabalho ao
dizer que ele corrige distorções e os auditores fiscais completam o
trabalho. "Devemos ter orgulho dessas duas frentes", opinou.
Cooperativa: uma opção para o trabalhador?
Para Geraldo Magela da Silva, presidente da
Federação das Cooperativas de Trabalho em Minas Gerais (Fetrabalho),
o direito do cidadão de se organizar em entidades associativas,
inclusive cooperativas, está presente na Constituição Federal. "Não
defendo a ilegalidade, a cooperativa usada para fraudes. Defendo o
direito do cidadão de optar por um sistema de trabalho", disse
Geraldo Magela. Essa posição foi questionada por um ouvinte da
reunião, o coordenador-geral do Sindicato dos Eletricitários de
Minas Gerais, Marcelo Corrêa: "Onde está a livre adesão no momento
em que o trabalhador tem que escolher entre a miséria, o desemprego
ou se associar a uma cooperativa?".
Outras pessoas presentes à reunião também
apresentaram suas opiniões durante a audiência pública, entre eles
sindicalistas e trabalhadores. Eles defenderam a verdadeira
cooperativa do trabalho, como prestadora de serviço, mas condenaram
a intermediação, a terceirização e a "quarteirização" do trabalho,
acentuando a precariedade das relações.
Deputados e convidados querem aprimorar o
debate
Geraldo Magela, da Fetrabalho, defendeu o debate
construtivo para aprimorar o modelo de cooperativa. Essa sugestão
também foi levantada pelo deputado Adalclever Lopes (PMDB), um dos
autores do requerimento solicitando a audiência: "Como legisladores,
estamos aqui para aprender, discutir e lapidar a questão da
diminuição dos postos de trabalho". O deputado perguntou ainda de
onde foi retirado o dado, apresentado pelo professor Márcio Túlio,
de que 99,9% das cooperativas são fraudulentas. Em sua defesa,
Márcio Túlio disse que não é contra as cooperativas de trabalho e
sim as de mão-de-obra, essas últimas, segundo ele, não 99,9%
fraudulentas, mas 100%. "Retiro esses dados de uma lógica, não de
uma estatística. A subordinação nessas cooperativas é incompatível
com a idéia de cooperação, de autonomia dos cooperados".
A deputada Marília Campos (PT), que também
solicitou a realização da audiência, disse que ainda não tem a
resposta do que seria uma boa ou má cooperativa, o que é fraude nas
relações de trabalho. "O fato é que a cooperativa tem sido utilizada
para a prática da fraude. Nesse sentido acredito que elas devam ser
extintas", opinou. Segundo o deputado Doutor Viana (PFL), essa
discussão abre perspectivas para outros debates. Ele defendeu a
importância das cooperativas na sua concepção original.
Presenças - Compareceram à
reunião os deputados Alberto Bejani (PL), presidente da comissão;
Marília Campos (PT), vice; Adalclever Lopes (PMDB) e Doutor Viana
(PFL).
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