Especialistas e deputados discutem qualificação das Oscips

O Projeto de Lei (PL) 8/2003, do deputado Leonardo Quintão (PMDB), que dispõe sobre a qualificação de entidades que d...

27/08/2003 - 20:53
 

Especialistas e deputados discutem qualificação das Oscips

O Projeto de Lei (PL) 8/2003, do deputado Leonardo Quintão (PMDB), que dispõe sobre a qualificação de entidades que desejem ser classificadas como organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips), foi discutido pela Comissão de Administração Pública em audiência pública realizada nesta quarta-feira (27/8/03. O projeto foi elogiado pelos dispositivos inovadores que contém e recebeu inúmeras sugestões de aperfeiçoamento em sua redação por parte dos convidados, mas em seguida foi duramente criticado pelos deputados do PT e pelos representantes dos conselhos de saúde e de assistência social e parte do público presente à reunião.

O PL 8/2003 é o desarquivamento de um projeto da legislatura anterior, de autoria do ex-deputado Sávio Souza Cruz. O próprio Leonardo Quintão apresentou um substitutivo no início da tramitação e agora pôs em discussão um segundo substitutivo. Os deputados André Quintão e Marília Campos, ambos do PT, requereram que o projeto seja distribuído também à Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social.

Leonardo Quintão foi o primeiro a receber a palavra, dizendo que se sentia feliz de participar da nova etapa de regulamentação das relações do Estado com o terceiro setor, e passou explicar, em forma de perguntas e respostas, o conteúdo de sua proposta de substitutivo, um texto detalhado que estabelece que tipo de entidade pode ou não pode candidatar-se ao título de Oscip, e a receber recursos públicos, imóveis do patrimônio do Estado e até cessão de funcionários públicos.

O projeto estabelece que sociedades comerciais, entidades de classe, instituições religiosas e partidos políticos, por exemplo, não podem se qualificar. Entre as que estão aptas destacam-se atividades de assistência social, promoção cultural, defesa do patrimônio histórico e artístico, educação suplementar gratuita e promoção gratuita da saúde, proteção ambiental e voluntariado. O regime de contratação de pessoal será o da CLT e as diretorias podem ser remuneradas com salários de mercado. O autor esclareceu que, até junho de 2003, havia apenas 87 Oscips registradas em Minas, e que, dentre as quase 2 mil solicitações protocoladas no Ministério da Justiça, 1.112 haviam sido deferidas e 680 indeferidas pelo Ministério da Justiça.

Anastasia louva institucionalização

O secretário de Planejamento e Gestão, Antônio Anastasia, não quis analisar o conteúdo do projeto, dizendo crer que os especialistas estavam em melhores condições de fazê-lo. Mas manifestou o seu apoio e considerou "louvável a iniciativa de institucionalizar essa relação que já existe". O secretário se referiu ao marco legal desta relação com o terceiro setor, que data de 1999, e assegurou que desde essa época não ouviu maiores críticas a esse relacionamento do Governo com as Ongs e as Oscips.

Anastasia lembrou que o excelente trabalho de Dona Zilda Arns com crianças carentes é feito através de uma Oscip, e também a maioria das entidades que assistem as vítimas da Aids. Para ele, a proposição permitirá ao Estado participar mais das parcerias com as entidades que se dispõem a executar políticas públicas, define com clareza a cooperação na área social e está redigido de forma mais rigorosa que a lei federal vigente.

Contratualização - Em seguida, falou o jurista Paulo Modesto, professor da Universidade Federal da Bahia. Ele revelou seus esforços para a elaboração da lei federal das Oscips e desde então vem estudando as congêneres estaduais. Tratou de conceituar que a legislação trata da "contratualização dos fomentos", e deve estabelecer controles contra perdas ou desvios. "Ao firmar contratos de gestão ou termos de parceria, o Governo passa a dar um cheque nominal a quem antes dava um cheque ao portador", afirmou o especialista.

Modesto fez alguns reparos técnicos ao projeto, "não por considerá-lo falho, mas para evitar argüição retórica contrária". Encerrou sua participação elogiando três pontos que considerou avanços em relação ao restante da legislação que já examinou: a proibição de parentesco da direção das Oscips com autoridades, a equiparação com as organizações sociais em termos de tributação e a ampla aplicação da publicidade.

Ministério Público quer integrar o controle social das Oscips

O representante do Ministério Público, Tomaz de Aquino Resende, explicou que a lei só admitia dois tipos de personalidade jurídica: associação ou fundação. As primeiras são 250 mil registradas no Brasil e as fundações apenas 6 mil. Para Resende, devem ser controlados não só os recursos recebidos do Erário, mas também os provenientes de carnês ou doações pela conta telefônica, que também devem ser entendidos como públicos e com finalidade específica.

O promotor acredita que será inócuo proibir agremiações políticas ou entidades religiosas de instituir Oscips. Defendeu a participação do Ministério Público no controle social das Oscips e fiscalização para comprovar seu funcionamento. "Elas podem estar com todos os documentos regulares e não funcionarem de fato".

Conselhos excluídos do controle

A crítica aos aspectos negativos da concepção das Oscips começaram com Renato Barros, da Coordenação Sindical do Funcionalismo. "É a recolocação do projeto de privatização do Estado, a transferência das responsabilidades constitucionais para a iniciativa privada. Se vamos entregar patrimônio público à iniciativa privada, deveríamos contemplar os aspectos sociais acima dos aspectos meramente gerenciais", afirmou o sindicalista. Barros criticou a gestão da Santa Casa de Misericórdia e cobrou os investimentos constitucionais em saúde. "Levamos uma vida para construir um sistema público de saúde. A instância de controle externo das entidades da saúde já existe: é o Conselho", disparou.

Patrícia Souza Lima, do Igam, explicou que os comitês de bacias hidrográficas e as agências de bacia que serão criadas vão funcionar como Oscips, inclusive gerando recursos com a outorga de uso das águas. Tereza de Lamare, do Conselho Estadual de Assistência Social, afirmou que o Conselho é órgão deliberativo das políticas sociais, e que lhe cabe estabelecer os critérios de partilha e as parcerias. Condenou a proposta das Oscips e defendeu o fortalecimento dos conselhos.

O presidente da Comissão, deputado Domingos Sávio (PSDB), avocou a si a relatoria do projeto, e interferiu na reunião, contemporizando as críticas. "O processo legislativo se enriquece quando a maioria ouve democraticamente a minoria e leva em consideração suas contribuições para aperfeiçoamento do projeto", disse o presidente. Assegurou que vai considerar as contribuições "fortes" de Renato Barros, da Patrícia Lima e Tereza De Lamare.

No entanto, o tom das críticas permaneceu elevado. O deputado André Quintão (PT) lembrou que a idéia de criação das organizações sociais (OS') provinha da teoria do Estado Mínimo proposta pelo ex-ministro Bresser Pereira, e que, no caso de criação das Oscips, é preciso assegurar que tenham padrões de atendimento, "para não ficarem vitaminadas ou desnutridas". E introduziu a variável do atendimento continuado. Para ele, não se pode estabelecer contratos finitos, que interrompam o atendimento a idosos, por exemplo. Ao requerer que o projeto seja discutido também na Comissão do Trabalho, André Quintão justificou: "Quem construiu historicamente as políticas públicas tem que participar agora desse debate. Lei sem povo não pega".

Marília Campos (PT), advertiu que a teoria do Estado mínimo levou o Brasil a um desastrado processo de privatizações. Para ela, as parcerias não podem ser encaradas como salvadoras, mas parte de um processo de discussão mais amplo, de um debate acadêmico mesmo sobre o Estado que a gente quer.

Chico Simões (PT) foi ainda mais veemente ao defender a opção estatal contra a privatista, "com unhas e dentes". "Quando a iniciativa privada se sobrepõe, é difícil mudar a rota", disse o deputado, que considera a Oscip "um verdadeiro estadinho: vai ter recurso público, ter imóvel público, funcionário público, mas vai poder contratar sem concurso e comprar sem licitação. É claro que falta controle para uma gestão decente", condenou. Outro item com que o deputado não concorda é com a remuneração dos diretores "de acordo com o mercado". Simões defende que a remuneração seja similar à dos cargos públicos correspondentes.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Domingos Sávio (PSDB), presidente, Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), Carlos Pimenta (PDT), Leonardo Quintão (PMDB), Marília Campos (PT), André Quintão (PT), Chico Simões (PT), Biel Rocha (PT), Sebastião Navarro Vieira (PFL).

 

 

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