Comissão de Acidentes Ambientais encerra coleta de
dados
Encerrado o prazo dado pela Fundação Estadual do
Meio Ambiente (Feam) para o cadastramento das barragens de rejeitos
no território mineiro, foram registradas 434 estruturas e informadas
suas dimensões, a natureza do rejeito que contêm, dados de
responsabilidade técnica e sobre o empreendimento. Até o final do
ano, a Feam espera apresentar um levantamento claro e preciso dessas
barragens. Empreendimentos que permanecerem na clandestinidade serão
descobertos por um sistema de geo-referenciamento via satélite e
serão autuados pela autoridade ambiental. Essas revelações foram
feitas pelo presidente da Feam, Ilmar Bastos dos Santos, na última
reunião de coleta de depoimentos da Comissão Especial de Acidentes
Ambientais da Assembléia, realizada nesta terça-feira
(19/8/2003).
"O acidente ocorrido em Cataguases até hoje nos
tira o sono", disse Ilmar Santos, acrescentando que o Termo de
Ajuste de Conduta assinado pela Indústria Cataguazes de Papel com o
Ministério Público só foi cumprido pela metade: "Foi feita apenas a
reparação da barragem rompida e o reforço da que não se rompeu. Eles
ainda não iniciaram a inertização do resíduo final". A Feam pretende
ainda, na renovação do licenciamento para as barragens cadastradas,
exigir a adoção de medidas de segurança sugeridas por uma análise de
risco e um plano de "descomissionamento", ou seja, de disposição dos
rejeitos após o encerramento das atividades. Das 434 estruturas
cadastradas, 232 são de mineração, concentradas no Quadrilátero
Ferrífero, e 202 industriais e outras.
"Emergenciomóvel" - O
secretário de Estado do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho,
reconheceu que o tempo de resposta da autoridade ambiental, no
acidente de Cataguases, foi "claudicante", mas disse que melhorou
muito no tombamento de vagões da ferrovia Centro-Atlântica em
Uberaba: "Em 30 minutos já estávamos no local, tomando as
providências mais urgentes, como o isolamento da área e o alerta
para interrupção da captação de água nos mananciais de abastecimento
da cidade". O presidente da Feam anunciou a montagem de um
"emergenciomóvel", veículo com sistema de localização e celular via
satélite, além de equipamentos de proteção individual para que a
equipe de emergência possa atuar com segurança, rapidez e eficiência
em qualquer acidente ambiental.
José Carlos Carvalho anunciou também a
interiorização da presença da autoridade ambiental, transformando os
sete escritórios regionais do Instituto Estadual de Florestas (IEF)
em escritórios regionais do Copam, com técnicos também do Igam e a
Feam. Segundo ele, voltou a gestão ambiental no Estado, focada nos
princípios de monitoramento, licenciamento e fiscalização, mas que
estava com uma ênfase absurda no licenciamento em moldes cartoriais,
sem inteligência e sem vinculação a metas de qualidade
ambiental.
O secretário dissertou também sobre o passivo
ambiental em Minas. "Nosso Estado tem mineração no nome e faz
mineração há três séculos, o que nos legou um passivo ambiental
muito grande, que exige políticas específicas", disse ele. Carvalho
considera inaceitável que a população ribeirinha de Cataguases,
abaixo da barragem, não tivesse sido alertada para "uma
bomba-relógio daquela magnitude armada sobre ela". Anunciou o fim da
era em que se privatizava o lucro da utilização dos recursos
naturais e se socializava o prejuízo ambiental.
Licenciamento dos empreendimentos rurais custa
caro
Carlos Alberto Santos Oliveira, da Federação da
Agricultura de Minas Gerais, disse que a única maneira de evitar
inconformidades nos empreendimentos agrícolas com a legislação
ambiental é o licenciamento ambiental, mas disse que os empresários
enfrentam uma espera de dois anos e meio pelo licenciamento e de dez
meses para uma outorga de água. Informou ainda que o custo do
licenciamento em Minas é duas vezes mais caro do que nos demais
estados, e que por isso, menos de 1% das propriedades estão
licenciadas. Oliveira sugeriu que a Assembléia vote recursos
orçamentários para reforçar o Igam e o IEF no cumprimento de suas
finalidades.
Respondendo à questão dos altos preços do
licenciamento levantada pela Faemg, o secretário José Carlos de
Carvalho revelou que está para ser assinado um convênio com as
universidades federais de Viçosa e de Lavras para aperfeiçoar e
atualizar a Deliberação 1/90 do Copam. "A partir desses estudos
vamos planilhar os custos e cobrar o que for justo", assegurou
Carvalho.
O consultor de gestão ambiental do Instituto
Brasileiro de Mineração, João Carlos de Melo, defendeu a mineração
como o único setor que a Constituição obriga a recuperar as áreas
degradadas. Preocupado com a demora no licenciamento ambiental,
sugeriu que o empresariado custeasse a infra-estrutura e novas
contratações para agilizar os serviços da Feam e do Igam. Sua idéia
não teve repercussão durante a reunião.
Outro defensor da mineração foi o professor da
Universidade Federal de Ouro Preto e consultor do Sindiextra, Jorge
Valente. "A indústria da mineração não é a vilã do ambiente. Os
acidentes de Cataguases e Uberaba não foram causados pela mineração.
A mineração acontece onde Deus pôs a jazida. O máximo que se pode
fazer é mudar um pouco a localização da barragem de rejeitos. A
sociedade deve definir se quer ou não que haja mineração. Se quiser,
deve usar toda a tecnologia possível para diminuir o risco e
investir bastante na educação ambiental", aconselhou o
professor.
Copasa é vítima dos rompimentos de
barragens
O superintendente de Recursos Hídricos e Meio
Ambiente da Copasa, Valter Vilela Cunha, afirmou que a Copasa é
vítima quando se rompe uma barragem de rejeitos de mineração. "Há 11
barragens de minerações na Serra do Itatiaiuçu, e já enfrentamos
vários rompimentos que ameaçaram o sistema Serra Azul. Acima do
sistema Rio Manso, de onde bombeamos 8 mil litros de água por
segundo, há várias barragens paralisadas, que representam um grande
risco. A Copasa construiu barragens preventivas para conter esses
rejeitos que podem vazar", disse Valter Cunha. O superintendente
disse também que os acidentes com cargas perigosas estão ficando
cada vez mais freqüentes, e que a Copasa mantém plantões no final de
semana para interromper a captação em mananciais porventura
atingidos.
O ex-deputado federal João Paulo Pires de
Vasconcelos, hoje consultor da CUT Vale do Aço e do Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria Extrativa de Minas, cobrou maior rigor da
Feam na fiscalização do setor extrativista mineral. "É preciso uma
fiscalização permanente, porque a atividade interfere diretamente
nos cursos dágua. Acidentes ocorridos por omissão e negligência
exigem ação rigorosa e a definição de responsabilidades. Há sete
anos denunciei a destruição dos lençóis freáticos da Serra da Moeda,
causada pela mineração da Mannesmann. Na época, a Feam me respondeu
que a atividade não interferia nos lençóis freáticos, mas a
realidade é diferente", afirmou Vasconcelos.
José Maria Soares, também da FTiemg, lamentou a
perda de vidas no acidente da Mineração Rio Verde, ocorrido em 2002.
"A Rio Verde poderia ter sido interditada, mas a autoridade hesita
em tomar uma atitude mais firme, alegando o problema social que a
interdição causaria. No entanto, não há dinheiro que pague as vidas
ali perdidas".
Um bom dinheiro deverá ser pago pelos responsáveis
pelos acidentes ambientais. É o que garante Jarbas Soares, que tem
12 anos de atuação na Promotoria do Meio Ambiente do Ministério
Público. Soares explicou que o MP é responsável pela proteção
jurídica do meio ambiente, e que lhe cabe ingressar em juízo com
ações punitivas contra os responsáveis e contra possíveis omissões
dos órgãos ambientais, e reparatórias para ressarcir danos causados
ao ambiente ou a terceiros. Revelou que o MP conta com 18
especialistas para assessorar os procuradores e que foram designados
cinco promotores para cuidar exclusivamente da bacia do São
Francisco. Soares considera que a ação do Ministério Público no caso
da Mineração Rio Verde foi "exemplar".
Centro-Atlântica teve 24 acidentes reportados ao
Ibama
O gerente executivo do Ibama em Minas, Roberto
Messias Franco, disse não acreditar em "risco zero". O risco sempre
existe, e tem três atores, segundo ele: o empresário, que provoca o
risco; o licenciador, que controla o risco; e a vítima, que sofre o
dano. Messias Franco pregou o trabalho integrado entre o Ibama, a
Feam e o Crea, e revelou que nos últimos dois anos foram reportados
ao Ibama 24 acidentes na ferrovia Centro-Atlântica. Outro risco
denunciado pelo gerente é o do uso inadequado de agrotóxicos, que
causa acidentes muito dispersos pelo Estado, mas que são
cumulativos, porque o agrotóxico se concentra no fígado do
agricultor.
Ao final da reunião, que teve a participação de
seis deputados, os membros efetivos da Comissão fizeram sua
avaliação dos depoimentos. Para Fábio Avelar (PTB), "foi a melhor
das seis reuniões, pela qualidade das revelações trazidas". A
constatação mais chocante, segundo Avelar, foi a falta de um núcleo
de atendimento emergencial para acidentes, o que só começou a ser
corrigido após o acidente de Cataguases. Doutor Ronaldo (PDT)
confessou que imaginava que as reuniões da Comissão seriam "uma
batalha", mas que depois se sentiu "orgulhoso em ver tantos
profissionais de várias áreas que trouxeram suas contribuições".
Para encerrar, a deputada Maria José Haueisen (PT)
recordou sua infância em Teófilo Otoni, quando era normal atear fogo
aos pastos. "Hoje isso é crime ambiental. Aos poucos, a educação
ambiental vai chegando a todos, particularmente às crianças, que
retêm melhor esses ensinamentos. Tenho grande esperança também no
ensino ético da engenharia, para que os futuros engenheiros tenham
responsabilidade ambiental", declarou a deputada.
Presenças: Deputados Maria
José Haueisen (PT), presidente; Doutor Ronaldo (PDT), vice; Fábio
Avelar (PTB), Leonardo Moreira (PL), Mauro Lobo (PSB) e Biel Rocha
(PT). Além das autoridades citadas, compareceram também Ana Luíza
Dolabela de Amorim Mazzini, do Conselho Regional de Química; Luiz
Augusto Almeida, da Cemig; Joaquim martins da Silva Filho,
procurador-chefe da Feam; José Fernando Neves Domingues, coordenador
da Emater-MG; Ricardo Castilho, do Sindiextra; João César Cardoso do
Carmo, do Crea-MG; Miguel Ângelo dos Santos Sá, do Crea-MG;
Alexandre de Oliveira, do Dnit; Leonardo Mitre Alvim de Castro, do
Igam; Plauto D. Pontes, da Ruralminas; Altair de Carvalho, da
Ruralminas; e Heitor Schiavon Couto, do Ima.
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