Pacientes de doenças intestinais crônicas pedem remédios
gratuitos
A marcação de uma audiência com o secretário de
Estado da Saúde, Marcus Pestana, com uma comissão de deputados,
médicos e pacientes foi um dos resultados da reunião realizada pela
Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa, nesta quinta-feira
(14/8/2003). A reunião discutiu as dificuldades dos portadores das
doenças de Crohn e retocolite ulcerativa, em conseguir,
gratuitamente, os medicamentos no Estado, apesar de a Portaria
1.318/2002, do Ministério da Saúde, prever tal custeio desde
setembro do ano passado.
Participaram da reunião o representante da
Secretaria, Benedito Scaranci Fernandes, superintendente de atenção
à saúde, os deputados da comissão, todos médicos, pacientes das
doenças e os médicos especialistas - gastroenterologistas e
coloproctologistas. O representante da SES ficou de levar o debate
ao secretário e marcar a audiência. Foi sugerido por requerimento do
deputado Fahim Sawan (PSDB) que seja encaminhado à Frente
Parlamentar em Defesa da Saúde, da Câmara de Deputados, um pedido
para que os remédios para tratamento de doenças raras,
especificamente a doença de Goücher - que em Minas consome 60% dos
recursos do setor -, sejam custeados diretamente pelo Ministério da
Saúde, sem passar pelos custos do Estado, para que sobrem mais
recursos para as demais doenças. A doença de Goücher, hematológica,
tem 60 pacientes no Estado.
Doenças vêm aumentando no Brasil
As doenças de Crohn e retocolite ulcerativa são
enfermidades inflamatórias intestinais crônicas. Caracterizam-se por
uma sintomatologia que causa problemas sociais aos seus portadores.
Eles são acometidos por diarréias hemorrágicas freqüentes, que
provocam anemia e emagrecimento. Tal quadro leva a constantes
afastamentos das atividades profissionais. As enfermidades são mais
freqüentes na Europa, acometendo pessoas de classes sociais mais
altas. Segundo os especialistas, no Brasil, a incidência da doença
está crescendo muito e atacando pessoas mais pobres.
Os remédios mais usados são a mesasalazina,
sulfasalazina e infliximabe, todos de alto custo comercial. Não há
um levantamento preciso do número de pessoas acometidas pelas
doenças em Minas, mas na Secretaria da Saúde já existe um cadastro
com 20 mil pacientes interessados em receber os medicamentos. No
Estado está sendo criada uma associação dos portadores das doenças
de Crohn e retocolite ulcerativa, o Grupo de Apoio aos Portadores de
Doenças Inflamatórias Intestinais (Gadii), que já conta com 60
integrantes. Em São Paulo foi criado há mais tempo o primeiro grupo
do Brasil, a Associação Brasileira de Doença de Crohn e Retocolite
(ABCD).
Ministério não fez repasse de recursos
O representante da Secretaria da Saúde, Benedito
Fernandes, disse que a portaria não está sendo seguida, porque o
Estado não tem recursos. Apesar de reconhecer como legítimo o
direito dos portadores das duas doenças, o médico destacou que o
Ministério da Saúde aumentou de 42 para 91 os medicamentos a serem
fornecidos pelas secretarias estaduais, "mas não fez qualquer
repasse de recursos, permanecendo o mesmo valor de quando eram
fornecidos os 42 tipos".
Ele disse que foi feito um acordo com os
laboratórios, com a supervisão do Ministério da Saúde, para a
redução do ICMS, com o compromisso de diminuição do preço final para
os pacientes. Segundo Benedito Fernandes, os laboratórios não
abaixaram os preços. Diante disso, em reunião realizada em março, no
Ministério, o secretário Marcus Pestana pediu mais recursos, e criou
uma subsecretaria de Novação e Logística, encarregada de fazer o
cronograma das necessidades de distribuição dos medicamentos. Ele
reclamou da legislação de licitações, que atrasa muito o processo de
reposição dos medicamentos. Mesmo assim, Benedito acredita que, até
o final do ano, a distribuição dos medicamentos para tratamento
dessas doenças esteja normalizado.
Doença dolorosa e tratamento caro
Além dos problemas psicológicos causados pela
doença, com constantes afastamentos e os incômodos dos sintomas, o
paciente da Retocolite Ulcerativa e da Doença de Crohn enfrenta o
alto custo do medicamento. O deputado Neider Moreira (PPS), autor do
requerimento que originou a reunião, mostrou uma receita de um
paciente tratado com a mesasalazina. Para a dosagem recomendada do
remédio, o doente precisaria gastar cerca de R$ 780 por mês, com o
uso de seis a sete comprimidos diários. Uma caixa com 52 comprimidos
custa R$ 192.
A representante do Gadii, Elizeth Nardi, advogada
do grupo e portadora da doença de Crohn, lembrou as dificuldades dos
pacientes e disse que os afastamentos constantes pelo INSS ficam
mais caros que o fornecimento dos remédios. Ao seu pedido, a
paciente Alessandra Castro prestou um depoimento sobre suas
dificuldades em conseguir o remédio na Secretaria da Saúde, que
culminaram com um mandado de segurança, que lhe garantiu o direito
de receber o remédio. Elizeth Nardi pediu que a solução não viesse
através do Judiciário, mas de um entendimento com a Secretaria da
Saúde, com o apoio dos deputados.
A médica Sinara Mônica de Oliveira Leite,
especialista em coloproctologia, afirmou que há um crescimento das
duas doenças no Brasil, que ao contrário da Europa, vem atacando nas
classes mais pobres, "incluindo a população rural". A
gastroenterologista Maria das Graças Pimenta Sanna disse que a
doença compromete a integridade da pessoa, "por isso, a visão da
assistência ao paciente tem de ser multidisciplinar, envolvendo o
médico, o terapeuta, o psicólogo e os grupos de apoio que estão se
formando". Segundo ela, tais pacientes, bem assistidos, têm uma vida
de quase normalidade em outros países. Ela informou ainda que os
médicos da área estão se organizando para criar uma central comum de
informações e que dentro de um ano, já haverá uma projeção da
incidência das duas doenças no País.
O presidente da comissão, que também é médico,
deputado Ricardo Duarte (PT), disse que a comissão está aberta a
encontrar soluções com os pacientes, tendo acatado a sugestão de se
trabalhar com a Frente Parlamentar da Saúde da Câmara de Deputados.
Fahim Sawan propôs que, na audiência com Marcus Pestana, seja pedido
o cumprimento da exigência constitucional que obriga o Estado a
aplicar 10,5% na saúde este ano e 12,5% no próximo. Ele destacou
ainda a "situação absurda" da dívida do Estado na área da saúde: R$
1 bilhão.
Presenças - Além dos
convidados, participaram os deputados: Ricardo Duarte (PT),
presidente; Neider Moreira (PPS) e Fahim Sawan (PSDB).
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