Audiência em Sabará discute patrimônio histórico
A determinação do Ministério Público de interditar
cinco igrejas em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte,
devido às suas más condições de conservação, foi tema de audiência
pública da Comissão de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia,
nesta quinta-feira (3/7/2003). A interdição, a sétima acatada pela
prefeitura, foi realizada na quarta (2). O encontro reuniu, na
cidade histórica, representantes da Polícia Civil, do Corpo de
Bombeiros, do Ministério Público e de órgãos federais e estaduais
envolvidos na preservação do patrimônio histórico, que reclamaram da
falta de recursos humanos e financeiros. A reunião foi requerida
pelo deputado Célio Moreira (PL), que participou com o deputado
André Quintão (PT), políticos da região, padres e moradores.
"Infelizmente, teve que ocorrer o incêndio na
Igreja das Mercês para todos os envolvidos começarem a debater, com
a comunidade, as dificuldades na conservação do patrimônio
histórico", afirmou a promotora Marise Alves da Silva, que solicitou
a interdição. Ela destacou duas medidas que considera necessárias e
urgentes: impedir o trânsito pesado em torno das igrejas históricas
e regulamentar a Lei 14.130, de 2001, que trata da prevenção contra
incêndio e pânico no Estado, permitindo ao Corpo de Bombeiros
realizar interdição - e não apenas sugerir.
"As interdições causam transtornos, mas são
necessárias neste momento", disse o comandante do Corpo de Bombeiros
em Sabará, subtenente Marcelo Queiroz. Ele se queixou de que a
imprensa só destaca situações problemáticas e que chamam a atenção,
impossibilitando que a comunidade tome conhecimento do trabalho da
corporação: "O Corpo de Bombeiros trabalha dia e noite correndo
riscos. Recentemente, tivemos seis incêndios, um deles em uma
caçamba, no meio da rua, cujas chamas atingiram quatro metros",
defende.
Vistorias - O subtenente
fez questão de reforçar que foi pedida a interdição de várias
edificações, como o Clube Mundo Velho, por risco de desabamento, e a
Mina Mundo Velho, por risco de incêndio: "Todo o patrimônio em
Sabará foi e está sendo vistoriado, a começar pelo próprio prédio
dos Bombeiros, que já foi recuperado". Ele deu exemplo de outros
problemas sérios, como a quantidade de velas nas residências das
cidades da região e a falta de hidrantes em Caeté.
O 1º Batalhão do Corpo de Bombeiros, responsável
por Sabará, atua da região Centro-Sul de Belo Horizonte à cidade de
Ponte Nova. "A prevenção do patrimônio histórico é indispensável,
apesar de complexa. Qualquer edificação precisa de um projeto
específico de prevenção contra incêndio e pânico, que seja
compatível com o risco instalado", explicou o comandante do 1º
Batalhão, tenente-coronel Etvan Geraldo Fonseca. Ele apontou, no
próprio Teatro Municipal, onde aconteceu a reunião, pontos
vulneráveis "facilmente visíveis" de ativação de fogo, que indicam
que a edificação sofreu intervenções imprevistas. O comandante dos
bombeiros de Sabará informou que a vistoria no Teatro está marcada
para a próxima segunda-feira, 7 de julho.
Prefeito cobra punição para vândalos
O prefeito de Sabará, Wander Borges, afirmou que a
preservação não é mais a única dificuldade, referindo-se aos atos de
vandalismo registrados com freqüência na cidade. "As ações
criminosas, como a que ocorreu na Capela do Bom Jesus e a que
acredito ter acontecido na Igreja das Mercês, estão impunes. As
autoridades precisam apresentar os culpados", apontou Borges. Ele
disse que R$ 200 mil já foram aplicados na preservação do patrimônio
histórico da cidade, em 2003.
O delegado de polícia de Sabará, Milton Gomes
Pereira, afirmou que os laudos das Polícias Civil e Federal estão
sendo feitos e que várias pessoas já foram ouvidas e intimadas a
depor. Ele fez um alerta: "A ocasião faz o ladrão. Vários prédios
públicos não têm vigilância nem estrutura física como proteção. O
delegado lembrou que a Polícia Civil faz a investigação, mas a
fiscalização preventiva cabe ao policiamento ostensivo.
O deputado Célio Moreira leu ofício encaminhado
pelo delegado da Polícia Federal Magno José Teixeira em que afirma
que o Ministério Público Federal é a única instituição que pode
exigir providências do governo federal sobre o risco de fogo e
desmoronamento das igrejas, como a da Nossa Senhora da Conceição. A
Polícia Federal atuaria, segundo ele, como força repressiva; a ação
após uma ocorrência seria limitada, pela dificuldade de identificar
causas e autores. O delegado informou que visitou o imóvel e
constatou "condições precárias" e enviou, junto com o ofício, cópias
de notificações do Corpo de Bombeiros e da Promotoria de Justiça. O
Ministério Público Federal foi convidado a participar da reunião,
mas não enviou representante.
Órgão federal só tem nove técnicos em MG
Criado em 1937, o Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional (Iphan) conta com apenas nove técnicos em Minas
Gerais, para atender 200 tombamentos isolados e 11 conjuntos que
totalizam 5 mil edificações. Treze desses bens estão em Sabará. Além
da falta de recursos financeiros e humanos - o último concurso
público foi realizado há 25 anos, o superintendente regional do
instituto, Raimundo Rodrigues, destaca como principal dificuldade a
inconstância das políticas do setor. "O ideal seriam medidas
preventivas, mas o que se vê é um direcionamento de políticas de
incentivo fiscal que destacam empresas que optam pela restauração de
patrimônios, em detrimento de critérios técnicos", criticou. O Iphan
é responsável por 16 mil imóveis, 50 sítios históricos e mais de 15
mil sítios arqueológicos. É esperada abertura de concurso para 400
profissionais.
O técnico do Iphan em Sabará, arquiteto Sérgio
Fagundes, é responsável também pela capital e outras cidades, como
ocorre com os demais técnicos. "Apesar do quadro dramático de
pessoal, não estamos omissos", frisou. Fagundes afirmou, por
exemplo, que o instituto faz alertas ao Ministério Público sobre a
recuperação da Matriz Nossa Senhora da Conceição desde 2001, assim
como já existem projetos antigos sobre as igrejas do Rosário e de
Santana. "O próprio Museu do Ouro, patrimônio do Iphan, está
precário", avaliou, lembrando que a Casa de Borba Gato e Igreja do Ó
já foram restauradas. A arquiteta do Instituto Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) Delmari Ribeiro ressaltou a
falta de recursos também do órgão estadual. O Iepha não tem
orçamento próprio para execução de obras de recuperação,
utilizando-se de leis de incentivo à cultura.
Deputado vai solicitar informações
O deputado Célio Moreira afirmou que vai apresentar
requerimentos pedindo informações sobre a possibilidade de
disponibilizar para o município carros recolhidos em investigação
policial, sobre a aplicação do Fundo Estadual de Recuperação do
Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico e sobre a
possibilidade, junto ao Ministério da Cultura, de aumentar o número
de técnicos no Estado. "O Brasil ainda não tem difundida a
consciência de preservação da nossa memória histórica. É fundamental
uma integração institucional entre os órgãos públicos, inclusive na
co-responsabilidade no financiamento de políticas públicas",
analisou o deputado André Quintão
Presenças - Participaram
da reunião os deputados Célio Moreira (PL) e André Quintão (PT),
além das autoridades citadas na matéria.
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