Audiência em Uberlândia reflete polêmica em torno das
hidrelétricas
Representantes de órgãos ambientais, políticos,
ambientalistas e centenas de pessoas acompanharam audiência pública
da Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais, realizada em
Uberlândia nesta quarta-feira (25/6/2003), para discutir os impactos
da construção das usinas hidrelétricas de Capim Branco I e II, no
Rio Araguari. Várias críticas foram feitas ao empreendimento, que
começará em setembro próximo e terá potencial de 450 megawatts.
"Essa energia atenderia a um milhão de pessoas, se destinada ao uso
residencial", ponderou o deputado Weliton Prado (PT), que solicitou
a reunião. A audiência foi dirigida pelo deputado Doutor Ronaldo
(PDT), vice-presidente da comissão e acompanhada também pelo
deputado Márcio Passos (PL).
O primeiro desdobramento da audiência foi a
aprovação de quatro requerimentos do deputado Márcio Passos (PL),
solicitando: explicação à Feam sobre a concessão das licenças
ambientais, sobre os documentos exigidos e sobre a divergência
técnica entre o seu parecer, contrário à construção da usina e a
decisão do Copam de autorizar a obra; a presença na Assembléia da
advogada Terezinha Souza, que é a responsável por uma ação popular e
que fez denúncias de irregularidades; informações à Fundação
Nacional de Saúde, sobre a possibilidade de uma epidemia de
Leishmaniose na região, devido à construção das barragens e um
pedido ao Consórcio para que encaminhe à Comissão de Meio Ambiente,
o Plano de Controle Ambiental do empreendimento.
Deputado faz histórico do empreendimento
Segundo Weliton Prado, Capim Branco I, que será
construída perto da Ponte Pau Furado, inundará área de 18,66 km² e
Capim Branco II, na Ilha de Sabe Tudo, 45,11 km². No início da
reunião, o deputado apresentou um histórico sobre a construção da
usina, lembrando que toda a enegia gerada será de uso exclusivo das
empresas participantes do consórcio. Segundo ele, a Cemig começou a
estudar a obra em 1977 e, dez anos depois, verificou a viabilidade
da construção. Em outubro de 2000, a Aneel realizou o leilão de concessão, vencido pelo Consórcio Energético Capim
Branco, formado por cinco empresas: Cemig, Vale do Rio Doce,
Companhia Mineira de Metais (grupo Votorantim), Camargo Correia
Cimento e Comercial Agrícola Paineiras (grupo Suzano de Celulose).
Em agosto de 2001, foi publicado decreto
presidencial permitindo a concessão, válida por 35 anos. No final de
2002, liminar da 1ª Vara da Justiça Federal - cassada em maio
passado - impediu o início das obras, após ação movida por moradores
e desapropriados de Uberlândia. Segundo os procuradores Cléber
Eustáquio Neves e Cléver de Oliveira Lima, o Ministério Público
Federal já entrou recentemente com ação questionando a obra.
Região do Triângulo tem 22 usinas
A superintendente do Instituto Estadual de
Florestas (IEF) na região, Marina Lígia Rocha, lembrou que o
Triângulo já possui 22 usinas construídas, sendo quatro no Rio
Araguari, contando com Capim Branco, além de estudos para instalação
de mais 16 usinas. Ela ressaltou os impactos negativos dessas obras
para o meio ambiente e afirmou que é preciso rever, com a
participação da sociedade, esse modelo de obtenção de energia.
A advogada que conduz a ação popular contra a
construção da obra, Terezinha de Fátima Souto, que é especialista em
Ecologia e Meio Ambiente, relatou uma série de aspectos de Capim
Branco considerados por ela inconstitucionais. Para ela, essa
construção é ilegal e imoral, porque beneficiará um ente particular
que usará um serviço público, que é a produção e transmissão de
energia. Outra irregularidade seria a falta de autorização da
Assembléia Legislativa para a participação da Cemig em
empreendimentos que envolvem a iniciativa privada, conforme
determina a Constituição Estadual. Ela sugeriu que a Assembléia
instale uma CPI para investigar a participação da Cemig.
A advogada questiona também o leilão feito pela
Aneel: "O valor total da concessão saiu a R$ 38 milhões, que o
consórcio começará a pagar a partir do 7º ano, com prazo de 35 anos,
quando o negócio vale R$ 500 milhões". Outros entraves seriam o
desrespeito à Convenção Internacional de Biodiversidade, do qual o
Brasil é signatário, e ao Código Florestal, que proíbe derrubada de
árvore em áreas de preservação permanente, caso das matas do
Araguari.
Representante de consórcio contesta críticas
"O impacto sócio-econômico do empreendimento é
pequeno. Serão 63 famílias desapropriadas, que totalizam 147 pessoas
que receberão toda a assistência necessária", contestou o gerente
regional de Meio Ambiente do Consórcio Energético Capim Branco, José
Rodrigues. Segundo ele, o consórcio nunca negou que haverá impacto
ambiental, em maior ou menor grau, mas que cabe ao empreendimento
identificar os impactos e projetar medidas que compensem os
problemas. E garantiu que a empresa já tem um plano de controle
ambiental com 76 "medidas compensatórias". Entre elas, estaria a
construção de duas unidades de conservação com ações como replantio
de mudas, salvamento e criatório de peixes.
O gerente foi questionado pelo deputado Weliton
Prado sobre a arrecadação de taxas para os três municípios
envolvidos. Ele falou sobre taxas como ITBI, "que são pequenas".
Sobre os royalties que a empresa terá de pagar, pela exploração das
águas, José Rodrigues afirmou que para "Uberlândia o valor não é
muito expressivo, já que representaria apenas 1% da receita da
cidade, ou R$ 3 milhões anuais. Para Araguari o recolhimento já
seria mais significativo, representando 10% da receita da cidade,
com uma arrecadação anual de R$ 6 milhões". Segundo José Rodrigues,
a empresa tem o compromisso de aproveitar a mão-de-obra de pelo
menos mil trabalhadores da região, entre os 2.500 que trabalharão no
momento de pico da obra (16º/17º mês de construção).
Ambientalistas denunciam morte do Rio
Araguari
Com a construção de Capim Branco I e II, nos 110
quilômetros restantes de corredeira do rio, os ambientalistas
presentes garantiram que não sobreviverá mais nenhuma espécie viva
no Araguari. Para o professor Antônio Luiz Nishiyama, geógrafo e
professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), a propostas
compensatórias do consórcio não resolvem o problema do dano
ambiental, citando como exemplo de degradação a usina de Miranda, no
mesmo rio, cujo índice de oxigênio é de 0,6% miligrama por litro,
quando o necessário para a sobrevivência de peixes é de 2%
miligramas de oxigênio. Para ele, o lado da usina vai dar condições
para que o vetor da Leishmaniose se propague atingindo a uma
população de quase 600 milhões de pessoas, de Uberlândia e
Araguari.
O assesssor especial de Meio Ambiente da Prefeitura
de Uberlândia, Cristiano Barbosa, afirmou que a prefeitura não está
contra o empreendimento, mas pediu que a empresa começasse a
implantar o plano de controle ambiental antes das obras e não ao
final, como está previsto, ou que pelo menos, encaminhasse um
cronograma físico-financeiro com esta implantação.
Representando o Sindicato dos Eletricitários da
região, o funcionário da Cemig, Fábio Carvalho, tentou desmistificar
a informação da empresa sobre a geração de empregos, garantindo que
todas as usinas construídas, após o período de pique da obra,
desempregam muito, mantendo um número muito pequeno de
trabalhadores. "São Simão tem hoje somente 49 empregados, quando
teve 152. Emborcação tem 27 e chegou a ter 140 e Miranda tem hoje 21
e em seu período de maior atividade teve 4.300 trabalhadores", disse
ele.
Liderando uma barulhenta comitiva de Araguari, o
presidente da Câmara daquela cidade, vereador Garibalde Carpaneda,
insistiu na questão do emprego, garantindo que a construção da usina
representará a redenção de Araguari. E afirmou: "não sou
ambientalista, não entendo nada de meio ambiente, só defendo o meu
povo e o direito deles de trabalhar".
Presenças - Participaram
da audiência os deputado Doutor Ronaldo (PFT), vice-presidente;
Márcio Passos (PL) e Weliton Prado (PT); além de vereadores da
região, professores da universidade, ambientalistas, promotores,
diretores de escolas.
|