Presidente afirma que reforma ajudará a corrigir distorções
sociais
A reforma tributária é uma reivindicação urgente de
todos os setores da sociedade. A afirmação foi feita pelo presidente
da Assembléia, deputado Mauri Torres (PSDB), na abertura do
Seminário Legislativo "Minas na Reforma Tributária", nesta
segunda-feira (16/6/2003). Segundo ele, a reforma poderá ser um dos
instrumentos do governo para corrigir as distorções na distribuição
da riqueza nacional, combatendo o desemprego e a informalidade,
através de um novo sistema que garanta a eqüidade e justiça fiscal,
fortalecendo as empresas brasileiras, que terão suas exportações
desoneradas.
Para o presidente Mauri Torres, o foco da reforma
não deve ser o aumento da arrecadação, mas sim, o equilíbrio
regional, que propiciará ao país uma nova ordem tributária, com
justiça social e desenvolvimento econômico. O seminário, que conta
com cerca de mil pessoas inscritas, prossegue nesta terça-feira e
será encerrado na quarta, com a realização da plenária final.
Três pontos - O deputado
federal Mussa Demes (PFL/PI), presidente da Comissão Especial sobre
o Sistema Tributário Nacional, destacou que a reforma tributária não
foi implementada até hoje porque há interesses conflitantes, entre
os entes federativos (União, Estados e Municípios) e entre os
diversos segmentos econômicos (indústria, comércio, serviços e
contribuintes). De acordo com Demes, a proposta do governo federal,
considerada tímida por ele, por ser menos abrangente que o ideal,
toca em três pontos básicos: a federalização da legislação do ICMS
(Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços); a
transferência do ITR (Imposto Territorial Rural) da União para os
Estados; e a constitucionalização da Lei Kandir, que desonera as
exportações.
O deputado avaliou que a "a reforma vai precisar de
muitos ajustes" e que "foge da questão mais importante": para ele, a
cobrança do ICMS deveria ser feita no destino, onde o produto é
consumido, e não na origem (como é, majoritariamente, hoje). Ele
acredita que essa mudança eliminaria a guerra fiscal. Mussa Demes
informou também que ao projeto do governo, enviado ao Congresso
Nacional, já foram apresentadas até agora cerca de 200 emendas. O
prazo final para apresentação de mudanças encerra-se nesta
terça-feira (17/6).
Professora da UFMG defende cobrança do ICMS na
origem
A professora de Direito Tributário da UFMG, Mizabel
de Abreu Machado Derzi, discordou da opinião do deputado Mussa Demes
quanto à cobrança do ICMS no destino. Ela defendeu a cobrança na
origem, por entender que o sistema de compensação das alíquotas,
como é feito hoje, é o mais adequado por não interromper a cadeia
débito/crédito. Antes de tratar especificamente da reforma
tributária, a professora teceu críticas ao sistema tributário
nacional. Segundo Mizabel Derzi, ele promove a concentração da renda
ao tributar fortemente o consumo e tributar com mais suavidade a
renda, o que acaba penalizando os mais pobres.
Federalismo - Com a
constituição de 1988, segundo a professora, houve um início da
desconcentração dos impostos, o que foi interrompido pouco depois,
quando a União voltou a concentrá-los. Ela julga que o projeto atual
é favorável ao federalismo, no sentido de que federaliza legislações
estaduais e trará menos problemas para estados e municípios, o que
não significa que seja "necessariamente bom para a democracia
republicana". Isso porque, segundo ela, a proposta não é justa do
ponto de vista do cidadão, e também devido à pouca participação dos
poderes legislativos estaduais na definição da legislação
tributária.
Para Mizabel Derzi, as assembléias legislativas,
que já não influenciavam muito nas leis sobre o ICMS (estabelecidas
pelo Confaz - Conselho de Política Fazendária), perderão ainda mais
poder com a reforma tributária.
Professor não vê compromisso com crescimento e
distribuição de renda
Em sua exposição, o professor da Fundação João
Pinheiro, Fabrício Augusto de Oliveira, tratou da estratégica por
trás da reforma. No governo Lula, segundo ele, a diretriz apregoada
é a de crescimento econômico com redistribuição de renda. Mas o
professor afirma não perceber esses princípios aplicados até agora:
"por mais que eu me esforce, não consigo identificar esse
compromisso na proposta de reforma tributária do governo Lula".
Fabrício Oliveira lembrou os pilares de cada uma
das reformas tributárias mais recentes: no regime militar, a meta
era o crescimento econômico com exclusão social. Em 1988, com a nova
Constituição, buscou-se a descentralização, beneficiando-se estados
e municípios, como reação ao poder centralizador da União. Nos anos
90, a lógica da reforma foi a do ajuste fiscal, referendado pelo
acordo com o FMI, que visava garantir superávits para manter a
estabilidade econômica.
Entrave - Hoje, o grande
entrave para que se cumpra a promessa de crescimento com
distribuição de renda, segundo Fabrício Oliveira, seria o
comprometimento total com o ajuste fiscal, o que emperraria um
segundo movimento a ser realizado, no sentido de desobstruir os
caminhos do crescimento econômico e do emprego, através da
desoneração de produtos e investimentos, do aumento das exportações
e do fortalecimento do mercado interno. Todos esses pontos, que
deveriam ser tratados pela reforma, não foram, na avaliação de
Fabrício Oliveira, além de outros que ele cita: tributação maior da
renda e revisão do modelo federativo no Brasil, com a redefinição
das competências e recursos dos entes federados.
Diretor da Fiemg critica alta carga tributária e
reforma proposta
"Não estamos diante de uma reforma, mas, no máximo,
de um remendo. Não se vislumbra uma diminuição da carga tributária,
mas, sim, seu aumento." Com essas palavras, o vice-presidente do
Conselho de Política Tributária da Federação das Indústrias (Fiemg),
Milton Cláudio Rebouças, expressou sua indignação com a atual
tributação do setor produtivo brasileiro, que já estaria atingindo
41% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
De acordo com ele, apesar de a reforma não aumentar
diretamente os impostos, ela fornece o meio para que eles cresçam
posteriormente, através de instrumentos previstos no projeto
federal. Ele criticou vários pontos da reforma proposta, entre eles,
a estadualização do ITR, mas sob a alçada do governo federal; a
perenização da CPMF; e a criação da contribuição substitutiva da
folha de pagamento, que seria acrescentada aos vários encargos já
cobrados.
Reforma pode trazer mais competitividade
O diretor de estudos macroeconômicos do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Ricardo Varsano, defendeu o
projeto de reforma tributária do governo federal, que, segundo ele,
poderá trazer maior competitividade à economia brasileira. Ao tratar
do aumento gradual da carga tributária (que passou de 25% do PIB, na
década de 80, para 29%, em 1999 e, em 2003, chega a 36%), Varsano
apregoou que ela não pode ser reduzida, em função dos altos gastos
do governo com pagamento de juros e aposentadorias, principalmente.
Ele acrescentou que hoje, com a economia mundial
globalizada, os governos não têm total soberania sobre a questão
tributária. "Não se pode, por exemplo, tributar o capital financeiro
e os negócios de modo muito diferente do que é feito em outros
países", afirmou. "Temos que assegurar a igualdade na competição
econômica, desonerar as exportações e aumentar a eficiência dos
produtos nacionais", analisou.
Procurador afirma que acordo penaliza
contribuintes
Um acordo tácito entre os contribuintes de direito
(os empresários) e o governo federal para manter a tributação
indireta, a "tributação dos inocentes". Esta é a opinião do
procurador Antônio Sérgio Tonet, do Ministério Público, que analisou
a proposta de reforma tributária do ponto de vista da capacidade
contributiva e dos impostos indiretos. Segundo ele, o governo mantém
ou aumenta a arrecadação, com o aumento das bases de incidência dos
tributos, enquanto que os empresários transferem para as cadeias
seguintes o que desembolsam.
Tonet sugere que a reforma desvie o foco da
tributação indireta para a direta, ou seja, aquela que incide sobre
capital, patrimônio e renda. "Somente assim o cidadão contribuinte
poderá ficar aliviado e sentir que o feijão ou a bicicleta do filho
ficaram mais baratos", enfatizou.
Sistema injusto - O
procurador reafirmou as críticas feitas por outros participantes do
seminário: a de que o sistema tributário nacional é um dos mais
injustos e perversos do mundo, tendo em vista o grau de
miserabilidade da população e a alta concentração de renda,
intimamente relacionados com a forma preferencial de tributação, que
é a indireta. "É o consumidor final, o cidadão comum que suporta a
carga tributária. E é este mesmo consumidor que não conhece a
extensão dos tributos que recaem sobre si", afirma. Outra crítica de
Tonet diz respeito à prorrogação, até 2007, do mecanismo de
Desvinculação da Receita da União (DRU). Esse mecanismo permite ao
governo utilizar livremente 20% de sua arrecadação, sem as
obrigações impostas pela Constituição. Ele defendeu que os
participantes do seminário posicionem-se contra essa medida.
Crimes - Outra ponderação
do Ministério Público é de que a reforma dê um tratamento melhor aos
crimes contra a ordem tributária. Segundo ele, houve um afrouxamento
da repressão a esse tipo de crime. "É oportuno que o Congresso
Nacional aprove leis que voltem a reprimir a sonegação fiscal, pois
esta interfere na livre concorrência, é base para corrupção de
servidores e faz com que o poder econômico mantenha seu domínio
sobre os demais poderes", completou. Antônio Sérgio Tonet destacou,
por outro lado, pontos que considera positivos na proposta de
reforma tributária: a tributação progressiva de impostos diretos e a
reduzida sobre produtos da cesta básica. Em contrapartida, afirmou
que as instituições financeiras são altamente privilegiadas e que a
facilidade de remessa de recursos para o exterior avilta o princípio
da capacidade contributiva.
Grupos de discussão apresentam propostas
A manutenção da capacidade contributiva do Estado e
a desoneração tributária sobre as empresas foram os temas mais
polêmicos discutidos pelo grupo de trabalho nº 1. O grupo, que
discutiu a relação entre tributação direta e indireta e a capacidade
produtiva, contou com a participação de representantes do governo,
das empresas e de entidades sindicais. Entre as principais propostas
discutidas, estavam a concentração da tributação na renda, no
consumo e na propriedade, a adoção da não-cumulatividade para os
tributos que incidem em cascata e a vedação da progressividade dos
impostos.
Quem coordenou os trabalhos do grupo 1 foi a
representante da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
(Fiemg), Alea Bretas Ferreira. O relator foi o representante da
Secretaria de Estado da Fazenda, José Eustáquio Ribeiro Vieira
Filho.
Quebra de sigilo bancário é ponto polêmico
A quebra do sigilo bancário de pessoas físicas e
jurídicas pelos Fiscos federal, estadual e municipal,
independentemente de autorização judicial foi o ponto mais polêmico
nas discussões do grupo 2. Esse grupo de trabalho, formado por 13
entidades da sociedade civil organizada, discutiu a desoneração do
processo de produção, exportação e investimentos. Outro ponto
bastante discutido pelo grupo foi a tributação adequada das
instituições financeiras.
Segundo dados da ABM Consulting, o lucro dos dez
maiores bancos privados brasileiros, em 2001, foi 180% maior que o
obtido em 1994. Em compensação, no mesmo período, houve uma redução
de 50% no valor dos impostos pagos. O grupo 2 foi coordenado pela
Olga Carvalho Hott, do Sindifisp. O relator eleito foi o Marcus de
Freitas, da Procuradoria da Fazenda Nacional.
Os grupos de trabalho discutem as propostas
apresentadas pelas Comissões Técnicas Interinstitucionais (CTIs).
Fizeram parte das CTIs o Sindicato dos Auditores Fiscais da
Previdência Social de Minas Gerais (Sindifisp/MG), Federação das
Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Associação Nacional dos
Auditores Fiscais da Previdência Social em Minas Gerais (Anfip/MG),
Associação dos Pequenos Municípios de Minas Gerais (Aspemg),
Conselho Regional de Contabilidade (CRC/MG), Federação Mineira de
Associações Microrregionais de Municípios (Femam), Instituto de
Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais
(Ipead/UFMG), Secretaria de Estado de desenvolvimento Econômico,
Secretaria de Estado da Fazenda, Sindicato dos Economistas de Minas
Gerais, Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de
Minas Gerais (Sinduscon/MG) e Sindicato Nacional dos Auditores
Fiscais da Receita Federal (Unafisco Sindical).
|