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Governo não paga indenização a torturados pela
ditadura
Mais de uma centena de vítimas de tortura durante o
regime militar e seus familiares lotaram o auditório da Assembléia
nesta quarta-feira (11/6/2003), para debaterem com os deputados da
Comissão de Direitos Humanos a paralisação dos pagamentos das
indenizações a que têm direito por força da Lei 13.187/99. São 805
as vítimas que apresentaram requerimento de indenizações individuais
no valor de R$ 30 mil. O governo de Minas, na administração Itamar
Franco, pagou a 89 pessoas. Outros 129 processos concluídos e
previstos para serem pagos no início do governo Aécio Neves tiveram
seus empenhos cancelados sob a alegação de falta de recursos.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos,
deputado Durval Ângelo (PT), disse que o valor das indenizações não
é importante. "Importante é alertar a sociedade para o papel
vergonhoso a que o Estado se prestou, colaborando na tortura
institucionalizada nas delegacias policiais", afirmou o
parlamentar.
Gilce Cosenza, do Fórum Estadual de Direitos
Humanos, e também requerente, ressaltou que muitas das vítimas vivem
hoje em dificuldades financeiras, com problemas de saúde e seqüelas
psicológicas; e que essa quantia lhes seria benvinda. Mas ponderou
que "o dinheiro não paga o absurdo da tortura praticada contra nós.
Devemos assegurar que governante algum permita tortura em órgãos sob
sua responsabilidade".
Geração aniquilada pela tortura
O presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte,
Betinho Duarte, deu o mais veemente depoimento sobre as
arbitrariedades que sofreu. "Estamos todos acima dos 50 anos. Somos
sobreviventes de uma geração aniquilada pela clandestinidade, pela
prisão, pelo exílio e pela tortura. Nosso papel aqui é resgatar a
história que não foi contada, porque quem esquece o passado está
condenado a revivê-lo", exaltou-se o vereador.
O promotor de Justiça Antônio Aurélio Santos, da
Promotoria de Direitos Humanos, disse que o Conselho Estadual de
Direitos Humanos (Conedh) está "esfacelado". Denunciou que as
entidades que mais violam os direitos humanos têm assento no
Plenário do Conselho, enquanto faltam ali entidades como o Movimento
Negro Unificado e a própria Comissão de Direitos Humanos da
Assembléia. "O trabalho é difícil e não é gratificante. Sabemos que,
nos casos de tortura, só podemos contar com a denúncia da vítima e
nos entristece saber que, neste momento em que estamos aqui, há
pessoas penduradas nos paus-de-arara das delegacias", desabafou o
promotor.
A secretária do Conedh, Caroline Bastos Dantas,
relatou a montagem dos processos de indenização, onde as histórias
de uns requerentes corroboram as de outros, tornando-se um processo
coletivo. Informou ainda os deputados sobre as marchas e
contramarchas dos processos dentro da burocracia do Estado, os
cortes de previsões orçamentárias, as suplementações e a
peregrinação para bater nas portas certas em busca de
solução.
Comissão vai ao governador
Hélio Rabelo, superintendente de Direitos Humanos
da Secretaria de Desenvolvimento Social e Esportes, resumiu que o
problema não é de caixa, nem do órgão que deve fazer as liberações.
"A questão é política e só se resolverá politicamente, com pressão
dos deputados e das vítimas", afirmou. Essa posição foi reiterada
pelo deputado Doutor Viana (PFL), que cobrou objetividade no
encaminhamento da reunião. "Lamentamos que tudo isso tenha ocorrido,
mas não podemos deixar o assunto morrer. Proponho irmos ao
governador, que tem demonstrado ser um homem sensível e humano. Ele
saberá resolver", assegurou Viana.
Diversas pessoas da platéia se sucederam ao
microfone, relatando sua experiência pessoal, mas também sugerindo
que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi preso por sua
militância sindical, entrasse na luta pelas indenizações; e também
propondo que as indenizações fossem cobradas na Justiça, já que
estão previstas em lei estadual. Esta proposta foi descartada pela
maioria dos componentes da Mesa, que preferem esgotar a alternativa
da negociação política. Um dos participantes lembrou que o
ex-governador Itamar Franco foi convencido a pagar indenizações às
vítimas por solicitação do ex-deputado Aécio Cunha, pai do
governador Aécio Neves.
Vigília - Ao final da
reunião, o deputado Durval Ângelo colocou várias proposições em
votação. Foram aprovados requerimentos de pedido de audiência da
comissão com o governador; de envio de correspondência à Agência
Brasileira de Inteligência (Abin) insistindo para que forneça
informações do antigo SNI para compor processos incompletos de
indenização; e também um requerimento ao presidente Lula e ao
ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para que se engajem na
luta pelas indenizações. Gilce Cosenza, do Fórum Estadual de
Direitos Humanos, convocou os presentes a se vestirem de branco e
participarem de uma vigília diante do Palácio da Liberdade, na noite
do próximo dia 2 de julho.
Presenças - Participaram da
reunião os deputados Durval Ângelo (PT), presidente; Roberto Ramos
(PL), vice-presidente; Mauro Lobo (PSB), Roberto Carvalho (PT), a
deputada Marília Campos (PT) e o deputado Doutor Viana
(PFL).
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