Comissão de Agropecuária discute reforma agrária
mineira
Cada família assentada em projetos decentes de
reforma agrária custa um investimento inicial de pelo menos R$ 40
mil aos cofres públicos. Há pelo menos 5,5 mil famílias mineiras
vivendo em assentamentos absolutamente precários, sem eletricidade,
sem estradas, sem escolas, sem crédito e sem assistência à produção.
Essas foram as principais revelações do debate entre o secretário
extraordinário de Reforma Agrária, Marcelo Gonçalves, e os deputados
da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial, realizado
nesta terça-feira (27/5/2003), na Assembléia.
O secretário, que é deputado estadual licenciado,
mostrou indignação com a situação das terras devolutas do Estado que
foram entregues arbitrariamente a grandes empresas siderúrgicas ou
de reflorestamento. Marcelo Gonçalves revelou aos deputados que a
Florestaminas possui hoje 70 mil hectares de terras devolutas
demarcadas pela própria empresa e que exige R$ 10 milhões para
devolvê-las ao Estado. Há casos como o da Italmagnésio, que detém 52
mil hectares, e outras empresas que burlaram a lei ao repassar
terras devolutas recebidas para outras empresas. No entanto,
Gonçalves revela ter conseguido um acordo razoável com o Grupo
Gerdau, que detém 50 mil hectares. A Gerdau se comprometeu a
reflorestar 15 mil hectares e devolver os restantes 35 mil ao poder
público.
O convite ao secretário da Reforma Agrária surgiu
de requerimento do deputado Leonardo Moreira (PL), que mostrou sua
preocupação com o abandono dos assentamentos por parte das famílias
que receberam lotes. "Minas tem que alcançar êxito nos
assentamentos. Não podemos aceitar que os jovens deixem a terra por
falta de oportunidades e se exponham ao narcotráfico e à
marginalidade na periferia das grandes cidades. A permanência dos
agricultores e suas famílias no campo é fundamental", disse
Moreira.
Geo-referenciamento via GPS
Marcelo Gonçalves esclareceu que o governo de Minas
não tem assentamentos próprios de reforma agrária e que compete ao
Incra desapropriar terras produtivas. O Instituto de Terras de sua
Secretaria está incumbido da arrecadação e titulação de terras
devolutas e da intermediação de conflitos. A Secretaria atua nos
assentamentos do Incra em regime de parceria, mas ainda não tem
lastro orçamentário para contribuir na infra-estrutura dos
assentamentos. "Não existe saúde sem saneamento básico, não existe
educação sem eletrificação, não existe produção sem crédito e
assistência técnica, nem escoamento da produção sem estradas", disse
o secretário, para ilustrar que o governador Aécio Neves está
mobilizando todas as áreas do seu governo para que a reforma agrária
em Minas seja bem-sucedida.
O deputado Padre João (PT) pediu ao secretário para
esclarecer se a finalidade da Secretaria é arrecadar terras
devolutas para cedê-las a empresas de reflorestamento ou para fazer
reforma agrária. Gonçalves respondeu que a maior parte das terras
devolutas serve apenas para reflorestamento, mas que as terras
apropriadas serão destinadas à reforma agrária. E acrescentou que
fez um convênio com o Incra e com o Instituto de Geociências
Aplicadas (IGA) para um processamento geo-referenciado via satélite
das propriedades rurais em Minas, o que possibilitará a solução de
muitos conflitos agrários e neutralizar a cobiça dos grandes
proprietários.
Invasão de propriedade no Norte de Minas gera
polêmica
O deputado Carlos Pimenta (PDT) relatou a invasão
pelo MST da Fazenda Senharó, no Norte de Minas. Segundo ele, a
propriedade de 700 hectares é produtiva, tem 400 reses e dois
conjuntos de irrigação para a formação de pastagens e que os
invasores já teriam abatido 40 cabeças. Um mandado judicial de
reintegração de posse não teria sido cumprido pela PM. "Nossa região
está se tornando um barril de pólvora", afirmou o deputado,
revelando sua preocupação com a formação de milícias armadas
dispostas a defender as propriedades a qualquer custo. Pimenta
denunciou também a invasão de parte do Projeto Jaíba, onde
militantes da Liga dos Camponeses Pobres ocuparam glebas de 5
hectares de terra irrigada e não produzem nada. "São gente sem
aptidão para agricultura. Deus tem que perdoá-los. Se nada for
feito, estou alertando: muita gente vai morrer."
As denúncias de Carlos Pimenta provocaram polêmica
entre os deputados Leonardo Moreira e Padre João. Moreira disse que
nos assentamentos se encontram marginais entre pessoas de bem e
condenou as invasões, argumentando: "Será legítimo que algum de nós,
que esteja precisando de dinheiro, invada um banco para tirá-lo? Não
concordo com esses invasores que desrespeitam a lei, destroem casas,
equipamentos e benfeitorias".
Padre João retrucou que "o Brasil tem uma dívida
agrária de 500 anos com os índios, com os negros vítimas da falsa
Abolição e depois com os trabalhadores rurais, por causa da
legislação que facilitou sua expulsão da terra". Para ele, "o
desrespeito à lei começou primeiro com o poder público, que não
cumpre o que a Constituição assegura: moradia, educação e saúde para
todos". O religioso afirmou que as pessoas simples não conseguem
chamar atenção para suas necessidades se não reclamarem, se não
realizarem protestos.
Leonardo Moreira contra-argumentou que, se os
sem-terra não são capazes de respeitar os bens alheios, seria
preciso educá-los primeiro, antes de assentá-los. A posição do
secretário Marcelo Gonçalves foi de equilíbrio. Ele garantiu que o
governo de Minas não iria mobilizar a Polícia para expulsar
trabalhadores por pressão de grandes fazendeiros, mas que também não
iria compactuar com a baderna e a desordem.
Requerimento - A comissão
aprovou requerimento do deputado Padre João requerendo ao Instituto
de Terras que envie um relatório sobre as terras devolutas do
Estado, aprovou o parecer do deputado Gilberto Abramo sobre projeto
de utilidade pública em Iraí de Minas e designou relatores para
outros dois projetos.
Presenças - A reunião foi
presidida pelo deputado Doutor Viana (PFL) e teve as presenças dos
deputados Padre João (PT), Gilberto Abramo (PMDB), Leonardo Moreira
(PL), Carlos Pimenta (PDT) e Leonídio Bouças (PTB).
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