Regime de capitalização faliu na América Latina
O regime de capitalização, parâmetro da proposta de
reforma previdenciária brasileira, está falido nos países onde foi
implantado na América Latina. A constatação foi feita pela
professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Laura
Tavares Soares, na manhã desta terça-feira (15/04/2003) no segundo
dia do Fórum Técnico da Reforma da Previdência, realizado pela
Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Tavares, especialista em
Economia do Setor Público, disse que as propostas da reforma contêm
muitos mitos, e que a seguridade social é superavitária e não
deficitária.
A professora tomou como base de sua exposição a
reforma chilena de 1990, imposta pelo Fundo Monetário Internacional
(FMI) e Banco Mundial, financiadores da economia daquele país, no
período. O modelo imposto, baseado na previdência privada, tem como
parâmetro a superação do déficit fiscal dos países, com o
enxugamento dos gastos do estado. Laura Tavares afirmou que hoje os
próprios técnicos dos dois organismos criticam o modelo, por
considerá-lo excludente e de alto custo de administração. No Chile,
a administração custa 25% do Produto Interno Bruto (PIB) e não
atinge a 40% dos trabalhadores do país.
Mitos caem
Os mitos do sistema de capitalização começam a ser
derrubados, segundo Laura Tavares. Ao contrário do que se divulga, a
cobertura é baixa, não há formação de poupança interna e nem aumento
de emprego, afirma ela. O dinheiro dos fundos de pensão vai para o
pagamento da dívida governamental, num índice que atinge até 57%. A
privatização da previdência, em sua avaliação, terá custo muito
alto, ou 202% do PIB, no período de transição. Além disso, o sistema
não tem nenhum poder redistributivo, há gigantesca transferência de
recursos públicos para o setor privado, e não há retorno dessa
poupança para a geração de empregos.
Em países onde há uma democracia social mais
estruturada, a previdência é baseada no modelo de repartição, atual
sistema brasileiro, destacou a professora, lembrando que somente
países da América Latina e do Leste europeu fizeram reformas nos
parâmetros do FMI. Para ela, a previdência social por repartição é a
melhor forma de redistribuição de renda. "Se não houvesse a
previdência, a pobreza hoje não estaria atingindo 67% da população
brasileira, mas 73%, agregando todos os velhos".
PL 9 deve ser retirado
O deputado federal Carlos Mota (PL), membro da
Comissão Especial da Reforma da Previdência, disse que o PL 9, que
permite a criação da aposentadoria complementar privada para o setor
público, deve ser retirado de tramitação na Câmara de Deputados.
"Ele é um engano, não tem o apoio dos deputados, além de não atender
à União, Estados e Municípios, que não têm como bancar os custos de
sua implantação". Servidor público há 27 anos, Mota criticou também
a proposta de contribuição dos inativos, questionando: "por que não
taxar a fortuna, a especulação e os juros?" Carlos Mota disse
concordar com algumas mudanças, como a moralização das
aposentadorias especiais e a elevação da idade.
Direitos adquiridos
O presidente da Associação dos Magistrados Mineiros
(Amagis), Doorgal Borges de Andrade, também criticou a proposta de
privatização da previdência dos servidores públicos. Para ele, não
haverá reversão de déficit, uma vez que os benefícios que já são
pagos terão de permanecer, por causa do direito adquirido. "O que
acontecerá é perda de receita do sistema, com a diminuição da
cobrança pela imposição de teto". Ele disse que o teto é a maior
falácia e que, segundo estudos de federações de trabalhadores, ele
tenderá a cair para 2 ou 3 salários mínimos, "porque teto é
facilmente manipulável".
Doorgal Andrade lembrou que o saldo previdenciário
brasileiro é um verdadeiro filão, por isso é motivo da disputa pelos
bancos. " Hoje são 27 milhões de contribuintes no Regime Geral, mais
17 milhões no Regime Próprio do Servidor Público e 40 milhões que
hoje estão fora e poderão ser incluídos, pelo menos a metade, o que
dá um total de 70 milhões de contribuintes, mais do que a população
de dois a três países europeus juntos".
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