Fiscalização sobre clínquer importado gera
reclamações
A importação de clínquer para a produção de cimento
é fundamental para assegurar a competição no mercado e nem sempre a
utilização dessa matéria-prima traz riscos de contaminação
ambiental. Essa é a opinião de representantes da indústria
cimenteira e da comunidade de Santa Luzia, na Grande BH, que
participaram nesta terça-feira (10/12/2002) de reunião da Comissão
de Turismo, Indústria e Comércio. O objetivo do encontro era
discutir o Projeto de Lei (PL) 2.452/2002, do deputado Ivair
Nogueira (PMDB), que dispõe sobre os procedimentos para a utilização
de clínquer importado na fabricação de cimento.
Produzido a partir do processamento térmico do
calcário e da argila, o clínquer é o principal insumo utilizado na
fabricação do cimento CP II, que leva ainda em sua composição 4% de
gesso. Em algumas fábricas, o alto-forno em que é produzido o
clínquer também serve para incinerar resíduos industriais, que podem
contaminar o meio ambiente. Esse clínquer produzido em
co-processamento também pode ser tóxico. Para evitar possíveis
contaminações, o PL 2.452/2002 torna obrigatória a fiscalização do
clínquer importado, que só poderá ser utilizado após a emissão de
laudo de vistoria expedido pelos órgãos estaduais competentes.
A proposta foi duramente criticada pelos convidados
da reunião. O diretor industrial da Cimento Davi S.A., Túlio Pinto
da Silva, alegou que nem todas as fábricas produzem o clínquer em
co-processamento, por isso, nem todo clínquer é nocivo à saúde. Além
disso, para Túlio, é preciso fiscalizar também o clínquer produzido
no Brasil, não apenas o importado, como propõe o PL 2.452/2002. O
diretor da Cimento Davi, Luís Gustavo Rocha Oliveira, também
reclamou da exigência de vistoria da matéria-prima importada.
"Existem outras maneiras de fiscalizar o produto sem embaraçar a sua
importação. Poderiam ser aceitos certificados internacionais, por
exemplo, em vez de laudos dos órgãos estaduais", sugeriu.
Fiscalização pode gerar concentração no mercado
Para o diretor da Cimento Davi, empresa que detém
1,5% do mercado de cimentos, Luís Gustavo Rocha Oliveira, a
fiscalização vai inviabilizar a importação de clínquer, e isso vai
prejudicar apenas sua empresa, pois suas concorrentes utilizam
matéria-prima nacional. "E ainda negam à Cimento Davi o acesso ao
clínquer brasileiro, para minar a concorrência. Somos obrigados a
importar esse insumo, e mesmo assim conseguimos produzir cimento de
melhor qualidade, o CP III, por um preço competitivo", disse. De
acordo com Luís Gustavo, as concorrentes da Cimento Davi também
negam à empresa o acesso à escória siderúrgica, outra matéria-prima
do cimento CP III.
O representante da Secretaria de Acompanhamento
Econômico do Ministério da Fazenda, Miguel Ragoni, lembrou que, caso
aprovado, o PL 2.452/2002 pode prejudicar a concorrência no setor
cimenteiro. "A necessidade de gerar economia de escala dificulta a
entrada de novos concorrentes e faz com que o mercado de cimento
tenda à concentração. Se a concorrência for prejudicada por esse
projeto, o consumidor será penalizado e o setor da construção civil,
que emprega 6% da população economicamente ativa brasileira, também
vai ser diretamente afetado", alertou.
População de Santa Luzia também é contra o
projeto
Empresários e consumidores não são os únicos que
temem ser prejudicados com a aprovação do PL 2.452/2002.
Representantes da sociedade civil de Santa Luzia, onde fica a
fábrica da Cimento Davi, também compareceram à reunião da Comissão
de Turismo, Indústria e Comércio para protestar.
O diretor de desenvolvimento e meio ambiente da
Prefeitura de Santa Luzia, Deusdedite Ferreira de Aguiar, lembrou
que a empresa é responsável por 10% da arrecadação de ICMS na
cidade, emprega 80 pessoas e gera outros 150 empregos indiretos, e
seu fechamento pode trazer enormes prejuízos para a cidade.
Para o representante da comissão de meio ambiente
da Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Luzia, Mário Werneck, e o
diretor da ONG Circuito da Vida, Welinton Rodrigues, a fiscalização
sobre o clínquer será praticamente impossível, e quem vai ser
prejudicada com a aprovação do projeto é a população de Santa
Luzia.
Deputados defendem fiscalização
O relator do PL 2.452/2002, deputado Pastor George
(PL), que pediu a realização da reunião antes de elaborar seu
parecer, levou em consideração as críticas feitas. "Esses
questionamentos trarão mudanças ao projeto", garantiu. Mesmo assim,
o deputado não abre mão da fiscalização sobre o clínquer.
Por sua vez, o autor do projeto, deputado Ivair
Nogueira, disse que não tinha a intenção de prejudicar nenhuma
empresa com a fiscalização. "Parece até que eu quero fechar uma
fábrica em Santa Luzia, mas o objetivo não é esse. Não sou doido,
sou a favor da competição e não quero penalizar ninguém",
defendeu-se.
Os dois deputados lamentaram a ausência de
representantes da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), que
foram convidados para prestar esclarecimentos sobre os danos
ambientais causados pelo clínquer produzido em co-processamento. A
votação do parecer sobre o PL 2.452/2002 está na pauta desta
quarta-feira (11/12/2002) da Comissão de Turismo, Indústria e
Comércio.
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