Secretária de Justiça não explica rebelião em Neves

Apesar dos questionamentos dos deputados da CPI do Sistema Prisional sobre a rebelião na Penitenciária José Maria Alk...

26/11/2002 - 21:35
 

Secretária de Justiça não explica rebelião em Neves

Apesar dos questionamentos dos deputados da CPI do Sistema Prisional sobre a rebelião na Penitenciária José Maria Alkmim, em Ribeirão das Neves, no início de novembro, a secretária de Estado da Justiça e Direitos Humanos, Ângela Pace, dedicou a maior parte da sua fala para fazer um balanço dos seus três anos de gestão. Alguns pontos defendidos pela secretária foram: municipalização do sistema carcerário, expansão das Associações de proteção e Assistência ao Condenado (Apacs), parcerias nas políticas públicas de recuperação dos presos e construção de presídios federais.

Ângela Pace compareceu à reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Prisional desta terça-feira (26/11/2002), depois de ter faltado a reunião anterior em que havia sido convidada. Ela afirmou que a Secretaria está investindo em um novo paradigma, trabalhando com Políticas Públicas de Recuperação dos Direitos Humanos, e derrubando o modelo de que bastava deixar o preso atrás das grades. Segundo Ângela Pace, a Secretaria tem 192 parceiros em projetos de qualificação dos recuperandos e dos agentes penitenciários.

Sobre a penitenciária José Maria Alkmim, Pace apenas justificou que esse centro de recuperação tem mais de 80 anos e já foi considerado modelo no Estado. Com a defasagem de construção de novas penitenciárias, a José Maria Alkmim começou a receber sentenciados com perfis completamente diferentes. A secretária afirmou ainda que há no Brasil a cultura do "bode expiatório" e que foi criada uma corregedoria que abre sindicância para apurar todos os atos ilícitos dos funcionários. Em três anos, segundo ela, foram abertas 750 sindicâncias que resultaram em 250 condenações.

Ângela Pace negou a informação de que o diretor-geral da José Maria Alkmim, o coronel da PM Isaac de Oliveira e Souza, não entra na penitenciária. Às acusações de irregularidades, mostradas em fotos pelo deputado Alberto Bejani (PFL), a secretária respondeu dizendo que nem todos os dados divulgados são verdadeiros. Ela questionou ainda a autenticidade de algumas fotos e o fato de funcionários antigos da penitenciária não terem sido ouvidos pela CPI. Quanto à utilização de telefones públicos pelos presos, ela disse que é permitida, havendo na penitenciária uma central para controle das ligações. Já os telefones fixos encontrados nas celas, segundo Ângela Pace, foram levados pelos presos durante a rebelião. A secretária exibiu ainda slides com as obras de melhoria realizadas na penitenciária. O deputado Irani Barbosa (PSD), no entanto, ponderou: "Não adianta subir os muros se os presos saem pela porta da frente".

O índice de fugas e a superlotação das penitenciárias foram também temas abordados durante a reunião. Os deputados quiseram saber por que no ano 2000, 236 dos 596 presos matriculados na José Maria Alkmim fugiram. Em 2001, segundo dados do Ministério Público, apresentados pelo deputado Alberto Bejani, 526 presos deram entrada na penitenciária e 273 fugiram. A secretária de Justiça contestou os dados informando que, segundo as estatísticas da Secretaria, foram 126 fugas do regime semi-aberto em 2000 e nove do regime fechado em 2001. Ângela Pace disse que há uma divergência conceitual quanto aos regimes e que, no semi-aberto, se o preso atrasa 15 minutos para chegar à penitenciária, já é considerado fuga.

O presidente da CPI, deputado Ermano Batista, perguntou ainda sobre a situação dos presos que já cumpriram pena e continuam na penitenciária. Ângela Pace explicou que as Varas de Execução têm, cada uma, particularidades que interferem no andamento dos processos. O presidente quis explicações também sobre o remanejamento dos presos que, segundo a secretária é feito, em um primeiro momento, por comarca. "É preciso regionalizar para depois municipalizar, porque os presos precisam ficar próximos às famílias, explicou a secretária que insistiu ainda na necessidade de construção de presídios federais. "É uma covardia com os municípios obrigá-los a receber os presos federais. Só em Minas são 1.093 nessa situação, sendo 193 só na penitenciária de Ribeirão das Neves", enfatizou a secretária.

Os deputados Ermano Batista e Irani Barbosa questionaram a manutenção de presos com históricos criminais e regimes diferentes em uma mesma penitenciária. Segundo Ângela Pace, a opção foi manter os presos próximos às suas famílias as quais são, na opinião da secretária, o único canal de recuperação do detento. A Secretaria está providenciando a licitação da divisão dos regimes penitenciários.

A secretária informou ainda que as Apacs são a grande aposta da Secretaria, e também estão contempladas no plano de governo de Aécio Neves. Ângela Pace pediu a ajuda dos parlamentares para que apresentem emendas ao Orçamento destinando recursos para a construção dessas Associações. Ela disse que a construção de novas penitenciárias encontra muita resistência junto à comunidade, que parece ter o "trauma Carandiru e Bangu". "A superlotação é criticada, mas ninguém quer uma penitenciária em sua cidade." Para o presidente da CPI, deputado Ermano Batista, o preconceito em relação às penitenciárias pode ser reflexo de sua má administração.

ADVOGADO VÊ INTENÇÃO DE PRIVATIZAR SISTEMA

Para o advogado Paulo Valério Notini Cançado, que atuou como defensor público contratado na penitenciária José Maria Alkimim entre 1995 e 2002, e que também foi ouvido nesta terça-feira (26), o sistema prisional se deteriorou acentuadamente nos últimos quatro anos. Em depoimento voluntário à CPI, ele afirmou que o governo estadual permitiu essa situação com o objetivo de privatizar as penitenciárias.

Questionado se o aumento dos casos de fugas e rebeliões nos últimos anos faz parte de uma estratégia para se criar uma "cortina de fumaça" a fim de colocar a opinião pública a favor da privatização, o advogado respondeu afirmativamente. Quanto à posição da secretária Ângela Pace, que se colocou contrária ao repasse das penitenciárias à iniciativa privada, Cançado disse que "a palavra muitas vezes não corresponde à ação".

Os deputados Ermano Batista (PSDB) e Irani Barbosa (PSD) questionaram o depoente a respeito do pagamento de propina a diretores e agentes penitenciários, para permitirem o contato dos presos com os advogados. Ele disse que essa é uma questão que "ouve-se falar", mas não tem conhecimento nem provas para afirmar isso. No entanto, confirmou saber de diretores que, em troca de suborno, ofereceram vantagens a alguns presos. Autorizado pelo presidente da comissão, deputado Ermano Batista, Cançado não citou nomes.

O pastor evangélico Roberto Luiz da Silva, membro do Conselho da Vara de Execuções Penais de Belo Horizonte, também prestou depoimento voluntário à CPI.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Ermano Batista (PSDB), Dilzon Melo (PTB), Alberto Bejani (PFL), Irani Barbosa (PSD), Márcio Kangussu (PPS), Antônio Genaro (PSD), Rêmolo Aloise (PFL), Chico Rafael (PMDB), Antônio Andrade (PMDB) e Geraldo Rezende (PMDB), além dos convidados Ângela Pace, Paulo Valério Notini Cançado e Roberto Luiz da Silva.

 

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