Especialistas divergem sobre eficácia da legislação e papel da CTNBio

A eficácia da legislação brasileira sobre biotecnologia e a atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CT...

18/09/2002 - 18:24
 

Especialistas divergem sobre eficácia da legislação e papel da CTNBio

A eficácia da legislação brasileira sobre biotecnologia e a atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) dividiram as opiniões dos especialistas que participaram, na manhã desta quarta-feira (18/9/2002), na Assembléia Legislativa de Minas, do segundo painel do Fórum Técnico "A Biotecnologia e Você: Mitos, Verdades e Fatos", que abordou o tema "Biotecnologia e aspectos legais". Para Eder Luiz Bolson, presidente da Associação dos Produtores de Sementes e Mudas de Minas Gerais, o Brasil não está desamparado no que diz respeito à legislação sobre biotecnologia, pois a Lei Federal 8.794/95, que regula o uso de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) no País e criou a CTNBio, atende ao objetivo de minimizar os riscos potenciais para os seres humanos e para o meio ambiente. Já na opinião de Sílvio Valle, coordenador dos cursos de Biossegurança da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a lei restringe-se a regulamentar a questão dos transgênicos e não trata adequadamente dos assuntos ligados à biossegurança, ao mesmo tempo em que a CTNBio não consegue controlar os experimentos transgênicos no País.

Legislação - Hoje, tramitam no Congresso Nacional nada menos que 25 projetos de lei, duas propostas de emenda à Constituição, um substitutivo e dois projetos de decretos legislativos relativos à biotecnologia e à biossegurança. A Lei Federal 8.794, de 6 de janeiro de 1995, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização quanto à construção, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, liberação e descarte de OGMs. Cabe à CTNBio, integrada por 36 membros representantes da sociedade civil, da área científica e do governo, decidir se a produção de um OGM pode ser liberada.

Segundo Sílvio Valle, artigos importantes da lei aprovada pelo Congresso Nacional em 1995, conhecida como "Lei de Biossegurança", teriam sido vetados pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, e hoje há um caos no setor. "Não existe política de biossegurança no Brasil", analisou, questionando a ação da CTNBio, que estaria liberando, como sendo experimentos, plantios de transgênicos em áreas de dezenas de hectares, além de ter autorizado uma empresa a realizar experiências com "gene confidencial". Para o professor da Fiocruz, na verdade não há proibição de plantio comercial de OGMs, mas, sim, exigências de estudos de impacto ambiental, que muitas vezes não são feitos. Ao finalizar, Sílvio Valle ressaltou que é contra a moratória na produção de transgênicos, proposta por alguns setores, e defendeu a necessidade de controle social sobre a biotecnologia e a possibilidade de os estados federados legislarem sobre o assunto, a exemplo do que acontece nos Estados Unidos.

Contrabando de soja transgênica

Já o presidente da Associação de Produtores de Sementes e Mudas defendeu a atuação da CTNBio, afirmando que os transgênicos são "mais testados que os alimentos convencionais e que os agrotóxicos", e que não há, no mundo, registros de problemas médicos acarretados pelo consumo de OGMs. Eder Bolson assinalou que a Medida Provisória 2.137, de janeiro de 2001, reforçou o caráter decisório da Comissão. "O risco de escape gênico sempre existe, não há risco zero. Por isso é preciso tomar precauções e avaliar antes de tomar decisões. Mas a maioria dos cientistas asseguram que a soja e o algodão geneticamente modificados não oferecem riscos", observou. Ele lembrou, ainda, que atualmente de 65% a 70% da soja plantada no Rio Grande do Sul é transgênica, sendo as sementes contrabandeadas da Argentina. "Hoje, com certeza já consumimos óleo de soja transgênico", disse. Eder Bolson refutou, também, as alegações de que há risco de monopólio no setor biotecnológico. "Em 1930, quando o milho híbrido foi lançado nos Estados Unidos, também se falou em monopólio, mas isso não aconteceu", completou, pedindo a injeção de recursos nas pesquisas.

Ação judicial - Roberta Jardim de Morais, assessora adjunta para Assuntos Internacionais do Governo do Estado de Minas Gerais, criticou as ações judiciais contrárias à liberação, pela CTNBio, do plantio de soja transgênica no País. Segundo ela, as ações foram ajuizadas sob alegação de que a comercialização de produtos geneticamente modificados no Brasil não era regulamentada, e um juiz concedeu liminar suspendendo o comércio de soja transgênica. Posteriormente, em primeira instância, houve sentença vedando o plantio comercial de qualquer tipo de OGM. Atualmente, o processo está em segunda instância, no TRF, e a juíza relatora, após estudar a questão da biotecnologia, concluiu que a CTNBio estava correta ao liberar o plantio da soja transgênica. Outros dois juízes pediram vista do voto da juíza, e o assunto ainda está pendente. Para Roberta Morais, é preciso haver diálogo entre as áreas jurídica e científica, a fim de ter uma legislação mais clara, que não dê margem a duplas interpretações e permita o fortalecimento do sistema de biossegurança. "Talvez seja o caso de transformar a CTNBio em uma agência reguladora", sugeriu.

Bioética - Outro expositor do painel, o professor Aluízio Borém, do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa (UFV), falou sobre os impactos da bioética na ciência e na sociedade. "Hoje, já é possível escolher o sexo do bebê, mas, amanhã, outras características também poderão ser selecionadas a priori", assinalou. De acordo com ele, a questão dos transgênicos engloba aspectos de soberania tecnológica, econômicos, morais e até mesmo religiosos, mas o principal é a preocupação com a biossegurança, que envolve avaliação de riscos para a segurança alimentar e para o meio ambiente. "É necessário assegurar a biossegurança antes de se colocar um produto no mercado", defendeu.

O debate foi coordenado pelo deputado Eduardo Hermeto (PFL).

 

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