Governo e sindicato divergem sobre Cemig
Se a desverticalização da Cemig não for aprovada
até o próximo dia 21 de setembro, prazo final dado pela Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a empresa estará sujeita a
"sérios riscos", inclusive a não renovação de concessões. A
advertência foi feita pelo presidente da Cemig, Djalma Morais, ao
participar, na manhã desta terça-feira (10/9/2002), na Assembléia
Legislativa de Minas, de audiência pública da Comissão de
Administração Pública que debateu o Projeto de Lei (PL) 1.416/2001,
do governador, que trata da desverticalização da Cemig. Contrário à
desverticalização, o coordenador do Sindicato dos Eletricitários
(Sindieletro), Marcelo Correia, que também participou da audiência,
disse que a medida, além de causar um aumento de 8% na carga
tributária, o que representará um prejuízo de R$ 321 milhões anuais,
abre as portas para a privatização das empresas subsidiárias a serem
criadas, sobretudo a de distribuição. Após os debates, a reunião foi
encerrada sem que o parecer sobre o projeto fosse votado.
Imposição - A
desverticalização, que consiste na separação dos sistemas de
geração, transmissão e distribuição de energia, com a criação de
empresas distintas para cada sistema, é uma exigência imposta pelo
Governo Federal em julho de 1997, quando foram renovadas concessões
da Companhia Energética de Minas Gerais. Inicialmente, o prazo para
a reorganização societária era até 31 de dezembro de 2000, mas foi
prorrogado para até o próximo dia 21. O projeto enviado para a
Assembléia em março do ano passado permite a desverticalização
mediante a criação de empresas subsidiárias integrais, juridicamente
independentes, para as atividades de geração, transmissão,
distribuição e comercialização.
PROJETO PRESERVA CEMIG
Segundo Djalma Morais, o modelo proposto, que em
vez da cisão pura e simples da empresa a transforma numa
holding em que cada subsidiária terá um CGC diferente, mantém
sob responsabilidade da Cemig o desenvolvimento de atividades nos
diferentes campos de energia, em qualquer de suas fontes, e assegura
ao Estado, em quaisquer circunstâncias, sempre a maioria das ações
com direito a voto. Ele lembrou que atualmente a Cemig já conta com
duas subsidiárias - Gasmig e Infovias - e, se o projeto for
aprovado, serão criadas outras três. Ao rebater os argumentos de que
a desverticalização facilitará a privatização, Djalma Morais avaliou
que isso não acontecerá em virtude da Emenda à Constituição nº 50,
aprovada pela Assembléia em outubro do ano passado, que determina
que a cisão de sociedade de economia mista e de empresa pública, bem
como a alienação de ações que garantam o controle direto ou indireto
dessas entidades pelo Estado, deve ser autorizada por lei aprovada
por no mínimo 3/5 dos deputados estaduais (48); e que a
desestatização de empresa prestadora de serviço público de geração,
transmissão e distribuição de energia elétrica será submetida a
referendo popular.
Prazo fatal - Para o
assessor especial do governador, Alexandre Dupeyrat, membro do
Conselho de Administração da Cemig, a aprovação do projeto é
necessária porque o Estado está diante de uma situação concreta que
é o "prazo final e fatal de 21 de setembro". De acordo com ele, não
há nenhum fundamento jurídico sólido que permita o questionamento
jurídico da cláusula contratual que obriga a desverticalização. "O
que está em causa no momento é afrontar, ou não, a norma existente,
expondo a Cemig à sanção da Aneel", analisou. Ainda segundo
Dupeyrat, o projeto não é o primeiro passo para a privatização, como
temem alguns, porque a fórmula encontrada pelo Governo do Estado
preserva a Cemig como uma empresa coesa, ao contrário do que queria
o Governo Federal, "que era um verdadeiro esquartejamento da
Cemig".
O superintendente jurídico da Cemig, Manoel
Bernardino Soares, disse que a exigência da Aneel não é arbitrária,
conta com fundamento legal, e que o interesse do Governo na
aprovação do PL 1.416/2001 não tem nada a ver com outro projeto em
tramitação na Assembléia, o PL 2.329/2002, do governador, que visa a
capitalização da Cemig.
CRÍTICAS À DESVERTICALIZAÇÃO
O presidente do Sindieletro, Marcelo Correia,
criticou a pressa do Governo para aprovar o projeto às vésperas das
eleições e poucos meses antes da posse dos novos governos federal e
estadual, o que seria uma contradição frente à postura que o Governo
vinha assumindo desde a posse de Itamar Franco em janeiro de 1999.
"Se o prazo de 21 de setembro já era conhecido desde o início do
ano, por que só agora o Governo mudou sua posição, da noite para o
dia?", indagou. Marcelo Correia frisou, ainda, que a única
justificativa possível para a desverticalização é preparar a empresa
para a privatização, e declarou que, hoje, isso já é discutido e
admitido por funcionários da Cemig.
Nulidade - Na avaliação da
assessora jurídica do Sindieletro, Rosângela Carvalho Rodrigues,
também presente à audiência desta terça-feira, a cláusula contratual
que obriga a desverticalização é nula de pleno direito, uma vez que
não houve autorização prévia da Assembléia para a assinatura do
contrato. Ela criticou o projeto dizendo que a proposição é genérica
e não especifica quais subsidiárias serão criadas. "É uma janela
aberta, ninguém sabe o que vai ser criado a partir de uma
autorização genérica", afirmou. A desverticalização também foi
condenada pelo presidente da Federação Nacional dos Urbanitários -
entidade que representa os trabalhadores das áreas de lixo,
saneamento e energia -, José Drumond Saraiva; pelo presidente da
Federação Brasileira de Geólogos, João César Freitas Pinheiro; e
pelo presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura
(Crea/MG), Marcos Túlio de Melo.
Questionamentos - Os
deputados Rogério Correia (PT), autor do requerimento que deu origem
à audiência pública, e Edson Rezende (PT), também condenaram a
pressa do Governo em aprovar o projeto. "Itamar Franco dizia que a
desverticalização era para privatizar. Agora, não temos clareza
sobre o modelo proposto, se é bom ou não, por isso não podemos
votá-lo", declarou Edson Rezende. Rogério Correia sugeriu uma ação
conjunta do Governo do Estado, Sindieletro e Assembléia,
questionando, junto ao Ministério Público, a imposição da Aneel.
Rogério Correia afirmou ter dúvidas, ainda, sobre a possibilidade de
o projeto ser aprovado por maioria simples pelo Plenário, uma vez
que a Emenda à Constituição nº 50 exige o voto favorável de 3/5 dos
deputados para cisão ou alteração na estrutura societária de empresa
pública.
HISTÓRICO DA TRAMITAÇÃO
O PL 1.416/2001 iniciou sua tramitação na
Assembléia Legislativa em 8 de março de 2001, sendo distribuído às
Comissões de Constituição e Justiça, de Meio Ambiente e Recursos
Naturais e de Fiscalização Financeira e Orçamentária. Em 25 de junho
de 2002, o projeto recebeu parecer da Comissão de Justiça pela
constitucionalidade, juridicidade e legalidade. Em seguida, o
projeto foi enviado à Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais,
que perdeu prazo para emitir seu parecer sobre a matéria. No dia 4
de julho de 2002, o Plenário aprovou requerimento do deputado
Rogério Correia (PT) solicitando que o projeto fosse apreciado
também pela Comissão de Administração Pública. No último dia 3 de
setembro, o Plenário aprovou requerimento apresentado pelo líder do
Governo, deputado Antônio Andrade (PMDB), solicitando regime de
urgência para a tramitação do projeto. Com isso, fica dispensada a
publicação prévia dos pareceres e demais proposições acessórias,
como emendas, e os prazos regimentais serão reduzidos à metade.
No dia 4, o relator do projeto na Comissão de
Administração Pública, deputado Eduardo Brandão (PL), apresentou
parecer favorável ao projeto com a emenda nº 1, que acrescenta, ao
texto da proposição, a expressão "observado o disposto no inciso II
do parágrafo 4º do artigo 14 da Constituição do Estado". Tal
dispositivo determina que a autorização para instituir, cindir e
extinguir sociedade de economia mista e empresa pública e para
alienar ações que garantam o controle dessas entidades pelo Estado
depende de lei específica a ser aprovada pela Assembléia. O parecer,
no entanto, não chegou a ser votado porque o deputado Rogério
Correia (PT) solicitou vista e apresentou requerimento, aprovado
pela Comissão, propondo a realização da audiência pública antes da
apreciação da matéria. Nesta terça-feira (10), após a audiência não
houve quórum para votação do parecer.
Depois de analisado pela Comissão de Administração
Pública, o PL 1.416/2001 ainda será debatido pela Comissão de
Fiscalização Financeira, antes de ser enviado para discussão e
votação no Plenário, em 1º turno. Na fase de discussão, o projeto
ainda pode receber emendas. Em 2º turno, o projeto passa apenas pela
Comissão de Fiscalização Financeira e pelo Plenário.
Presenças - Compareceram à
reunião os deputados Eduardo Brandão (PL), presidente da Comissão,
Antônio Andrade (PMDB), Rogério Correia (PT), Sargento Rodrigues
(PDT), Sebastião Navarro Vieira (PFL), Edson Rezende (PT), Bilac
Pinto (PFL) e Sávio Souza Cruz (PMDB).
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