Inserção de surdos no mercado de trabalho é benéfica para
empresas
A grande capacidade de concentração dos surdos no
trabalho pode aumentar a produtividade das empresas. Essa opinião,
unânime entre os participantes do Ciclo de Debates "Surdos no
Trabalho - Dê ouvidos a essa a idéia", realizado pela Assembléia
Legislativa nesta segunda-feira (26/8/2002), contraria a visão
assistencialista de quem considera o portador de deficiência
auditiva incapaz de realizar tarefas. "O preconceito e a falta de
informação ainda são obstáculos para a inserção dessas pessoas no
mercado, apesar de a legislação determinar reserva de vagas em
empresas públicas e privadas", afirmou o deputado Luiz Tadeu Leite
(PMDB), autor do requerimento que deu origem ao encontro e seu
coordenador.
O Instituto de Previdência dos Servidores do Estado
de Minas Gerais (Ipsemg), órgão que mais emprega surdos em Minas,
utilizou inicialmente essa mão-de-obra para atender à legislação.
Segundo o presidente do órgão, João Diniz Pinto Júnior, foi
necessário que a empresa e os funcionários passassem por um período
de adaptação nos primeiros meses. Hoje, dois anos depois, é
considerável a melhoria do funcionamento dos setores que receberam
esses profissionais, segundo Diniz. São 154 pessoas, distribuídas
pelas categorias funcionais de pintor, marceneiro, eletricista e
auxiliar de escritório, entre outras.
O presidente do Ipsemg citou exemplos de ganho de
produtividade, como na Seção de Manutenção e Reparos, que levava até
30 dias para recuperar um material estragado. Com o trabalho dos
portadores de deficiência auditiva, o prazo diminuiu para um dia.
Nos serviços de pintura, o setor conseguiu reduzir o tempo de dez
para dois dias. As contratações do Ipsemg são feitas em parceria com
a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis).
"Essa experiência promove a integração social e o exercício da
cidadania", lembrou Diniz. "O surdo é capaz de trabalhar como outra
pessoa qualquer. Devemos ter cuidado para não dar a ele
prerrogativas que o diferenciem dos outros", ressalvou a
representante da Secretaria Municipal de Saúde, Janete Maria
Ferreira, que, no setor de digitação, conta com o trabalho de 100
surdos.
NÚMERO DE VAGAS AINDA É PEQUENO
Os surdos representam 1,8% da população do Estado.
Em Belo Horizonte, são cerca de 35 mil. Dados de instituições
ligadas ao assunto indicam que, em 1994, 100 deles ocupavam vagas de
trabalho na capital. Neste ano, já são 721 trabalhadores, o que
representa 0,054% da população economicamente ativa da capital. "É
ainda muito pouco, tendo em vista que as empresas ganham, além de
produtividade, humanização. Os outros funcionários tendem a
valorizar mais suas funções com a convivência com os surdos",
analisou a gestora de pessoas surdas Adriana Meirelles de Mello.
A psicóloga Fabíola Fernanda do Patrocínio, do
Centro de Integração de Deficientes Rogéria Amato (Sesi/Cira),
enfatizou a necessidade de se prepararem tanto a empresa quanto o
candidato à vaga. A empresa precisa identificar quais as áreas de
trabalho indicadas para absorver o profissional, além de se
preocupar com a sensibilização dos colegas de trabalho. Já o
candidato precisa se capacitar, adquirindo conhecimentos sobre
marketing pessoal e planejamento financeiro, por exemplo. "O
primeiro emprego dos surdos costuma ser com 30 anos", afirmou.
O consultor de inclusão social Romeu Kasumi
Sassaki, que há 42 anos trabalha com portadores de deficiência,
lembrou que outro fator dificultador da inserção é a desigualdade
social. "Hoje temos que encaixar as pessoas nas vagas oferecidas,
mas o processo deveria ser o inverso. Em empresas inclusivas, o
funcionário tem chance de trabalhar, receber treinamento e ser
promovido."
Surda e com deficiência visual parcial desde a
infância, Rejane Mary Assumpção contou que, apesar das dificuldades,
conseguiu estudar e hoje é professora e especialista em Educação
Especial. "Para construir a cidadania dos surdos, é preciso entender
nossa cultura, centrada no visual, no gestual e no corporal. Nem
todos assimilam o Português como eu", completou.
Este é o segundo ciclo de debates promovido pela
Assembléia Legislativa para discutir as necessidades dos surdos. O
debate anterior, realizado em dezembro de 2001, teve como tema "A
Educação que nós, surdos, queremos".
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