Alca pode ser ameaça à soberania nacional, diz Ivo
José
"As discussões do II Fórum Minas Por Um Outro Mundo
vão ser fundamentais para o futuro e a soberania do nosso país".
Essa foi a mensagem do deputado Ivo José (PT), saudando os
participantes na abertura do evento. Segundo o parlamentar, na I
Cúpula de Chefes de Estado das Américas, em Miami (EUA), com a
participação dos 34 países das Américas, exceto Cuba, em 1994, foram
estabelecidas as bases para a criação da Alca (Aliança para o Livre
Comércio das Américas), que deveria entrar em vigor, no máximo, até
2005. Essa reunião definiu o objetivo principal da aliança, de
ampliar a abertura comercial entre as nações americanas e, sob o
pretexto de garantir a propriedade intelectual, estabeleceu que não
haveria nenhuma proteção aos países e às populações detentoras das
matérias primas dos medicamentos.
Para Ivo José, em tese, as economias dos países
emergentes seriam beneficiadas com o aumento do mercado. Mas na
prática, o acordo pode não ser tão bom para todos. Os críticos da
Alca alertam que o acordo seria bom só para os Estados Unidos e
prejudicaria principalmente o Brasil. Apenas os grandes
conglomerados, mais competitivos, conseguiriam concorrer, deixando
as pequenas e médias empresas em situação difícil, ocasionando
perdas financeiras e a conseqüente diminuição do nível de empregos.
Em última instância, estaria ameaçada a própria soberania nacional,
segundo Ivo José. Ele afirmou ainda que esses debates servirão de
preparação para o 3º Fórum Social Mundial, em janeiro de 2003, e
para o plebiscito sobre a Alca, de 1º a 7 de setembro.
AUDITORIA DA DÍVIDA EXTERNA
O deputado Rogério Correia lembrou sua participação
e de outros deputados da Assembléia de Minas no último Fórum Social
Mundial, dizendo sentir-se honrado pelo Legislativo de seu Estado
poder sediar esta etapa do próximo FSM. O parlamentar defendeu a
auditoria da dívida externa brasileira, para que o povo saiba quem
fez essa dívida e em que bases financeiras. Ele lamentou a atitude
da grande imprensa nacional que comemorou o empréstimo de 34 bilhões
de dólares do FMI como se fosse um grande achado. "Quem pagará a
dívida externa e esse dinheiro novo? Certamente o povo brasileiro",
disse Correia. E acrescentou que nenhum centavo desse empréstimo
será aplicado na área social, mas somente para matar a sede dos
investidores internacionais.
DESEQUILÍBRIOS INTERNOS E EXTERNOS
Para o secretário de Planejamento e
Coordenação-geral da Prefeitura de Belo Horizonte, Maurício Borges
Lemos, representando o prefeito Fernando Pimentel, o Brasil ainda
não conseguiu nem resolver os seus desequilíbrios regionais
internos. "Como então podemos pensar numa abertura externa, ainda
mais quando negociamos com um gigante como os Estados Unidos?",
alertou ele.
A representante do Comitê Mineiro do Fórum Social
Mundial, Dirlene Marques, afirmou que a responsabilidade dos
participantes não é apenas com o povo brasileiro, mas com todos os
povos da América Latina. De acordo com ela, as atitudes recente do
governo norte-americano já demonstram sua vontade de colocar toda a
América a seus pés. O fast-tracking, o golpe militar na Venezuela, a
ocupação militar da Colômbia, são prenúncios desse movimento maior
de anexação econômica dos países pobres do continente por parte dos
Estados Unidos, que irá culminar com a Alca. Como homenagem ao povo
trabalhador do Brasil e das Américas, Dirlene convidou outra
participante do Comitê Mineiro do FSM para entoarem juntas o Hino da
Internacional Socialista.
SOBERANIA NACIONAL E POPULAR
Sob o lema "soberania sim, submissão não", o frei
Gilvander Luís Moreira, tratou do modelo de soberania desejado pelo
povo brasileiro, na sua opinião. Segundo ele, o que se busca hoje é
uma soberania nacionalista, mas não um nacionalismo xenófobo, e sim
o que valorize as raízes culturais do país contra o fascínio das
forças externas e que defenda a integração dos povos. Além disso, a
soberania tem que ser democrática e popular, forjada a partir da
sociedade organizada, defendendo a independência e a economia
nacionais. O religioso prega que a soberania deve ser também plural
e integral, exercendo-se não só na política, na economia, no trato
com a dívida externa, bem como na questão alimentar e agrícola e no
terreno da cultura.
MST PROMETE GUERRA CONTRA OS PRODUTOS
TRANSGÊNICOS
O ideólogo do Movimento dos Sem-Terra, João Pedro
Stédile, foi uma atração à parte na abertura do Fórum. Começou
elogiando a coragem da Assembléia Legislativa de Minas Gerais de
realizar um evento desses, e disse que "são raras hoje as casas
legislativas no Brasil que acolheriam membros do MST". Antes de
iniciar uma série de precisos ataques à estratégia da ALCA, Stédile
fez um alerta: "Somos brasileiras e brasileiros e estamos aqui para
defender os interesses do povo brasileiro".
Contra a proposta da ALCA, Stédile disse que não
representa um acordo de comércio, e nisso o ex-presidente Clinton
teria sido honesto, em 94, quando passou a chamar a ALCA de "área"
de livre comércio das Américas, concebida com o objetivo de manter e
expandir a hegemonia econômica e militar do Império Americano no
continente.
O coordenador do MST citou que há consenso entre
analistas econômicos de que nos últimos três anos ocorre uma crise
no centro da economia americana, e que essa crise não é cíclica, nem
periférica, mas pode ser estrutural como a de 1929. Para tentar
reerguer a economia americana, um fórum das 200 maiores corporações
teria estabelecido uma estratégia em três fases:
1) reinvestir na indústria bélica, porque o poder
de destruição das armas tem a capacidade de revigorar o capitalismo.
"A IBM tem uma área que faz sistemas de orientação para mísseis, e
mesmo a inocente Monsanto, que nos quer impingir os seus
transgênicos, produz bombas de desfolhantes que estão sendo usadas
na Colômbia", denuncia João Pedro Stédile.
2) transformar o trecho da Patagônia até o Alasca
em território livre para a expansão dessas 200 corporações. Stédile
afirma que a Fiesp estima a perda anual da indústria paulista em US$
1 bilhão depois da implantação da ALCA.
3) nas próximas duas décadas, reciclar as empresas
americanas para os filões mais lucrativos que os cientistas apontam
para o século 21: a biotecnologia, a transformação de materiais e a
biopirataria, para a qual seria fundamental o controle da
biodiversidade.
AMAZÔNIA SERIA ALVO DE COBIÇA DOS ESTADOS
UNIDOS
Seguindo sua linha de raciocínio, o líder do MST
acusa os norte-americanos de cobiçarem a Amazônia, que seria o maior
repositório natural da biodiversidade, ao ponto de terem instalado
bases militares ao redor de toda a área, com exceção da Venezuela.
Em seguida Stédile fez duros ataques ao governo FHC por ter cedido a
base militar de Alcântara aos ianques. "Aquilo ali foi um atestado
de burrice da diplomacia brasileira. O Itamaraty só aprende a servir
cafezinho para americano", criticou.
João Pedro deplorou também a submissão do governo
brasileiro ao fazer contratos para a construção de novas
hidrelétricas, que prevêem a propriedade privada da água por parte
dos consórcios construtores. Disse que o Brasil tem 25% da água
potável do planeta e que o MST terá que lutar também contra isso, e
não apenas contra os latifundiários. Outra luta que o líder promete
é contra o domínio dos transgênicos da Monsanto e da Dupont na
agricultura nacional: "Se tentarem nos obrigar, vamos fazer uma
guerra contra os transgênicos", ameaçou.
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