Mobilização é chave para reverter mudanças em curso
superior
A continuidade da mobilização de estudantes,
professores, entidades de classe e políticos é apontada como o
caminho para reverter as medidas que constam de pareceres do
Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre cursos de ensino superior.
Os pareceres prevêem, entre outras medidas, a redução da carga
horária de cursos superiores, possibilitando graduações em três
anos; a não-obrigatoriedade do cumprimento de determinadas
disciplinas do curso de Direito e a monografia opcional. Nesta
sexta-feira (9/8/2002), os segmentos interessados no assunto e, em
especial, estudantes de Direito, discutiram o tema em audiência
pública da Comissão de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia, no
Plenário.
Abaixo-assinado - O
deputado Rogério Correia (PT), autor do requerimento que solicitou a
reunião, lembrou que são políticas as ações da Assembléia para
combater essa visão mercantilista do ensino. Respondendo à sugestão
dos estudantes, acrescentou que a Comissão vai colher assinaturas,
entre os parlamentares, para um abaixo-assinado contra os pareceres,
a ser remetido às autoridades competentes. Gestões políticas no
Ministério da Educação (MEC) e na Câmara dos Deputados também serão
feitas. Correia argumentou, por outro lado, que acredita "ser
difícil viabilizar uma política tão radical de abertura de
faculdades a qualquer custo". Na opinião dele, o assunto é grave e
não se pode apenas observar os acontecimentos, sem nenhum tipo de
reação.
OAB CRITICA GOVERNO FHC E DIZ QUE PARECER NÃO FOI
PUBLICADO
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil/Seção
Minas Gerais (OAB/MG), Marcelo Leonardo, fez uma retrospectiva da
atuação da entidade nesse processo - que se pautou também pela
divulgação e posição contrária aos pareceres. Criticou, ainda, o
governo federal. Segundo ele, ao longo dos oito anos das gestões
Fernando Henrique Cardoso e de Paulo Renato no MEC, foi feita a
opção política de aumentar o número de universitários no Brasil,
"custe o que custar". "O MEC tem sido extremamente liberal na
autorização de cursos superiores e, em particular, dos de Direito."
Marcelo Leonardo lembrou que a OAB emitiu parecer
prévio contrário, inúmeras vezes, à criação de novos cursos
jurídicos. No entanto, em cerca de 80% dos casos, o curso foi
autorizado. Ele também citou números para ilustrar a proliferação
das faculdades de Direito. Há cinco anos, havia em Minas 20 cursos
jurídicos cujos alunos tinham se submetido ao exame da OAB. Hoje,
são mais de 40. Somente em Belo Horizonte, são cerca de 10 os cursos
existentes.
O que diz o parecer -
Marcelo Leonardo informou que chegou a ser assinada, pela ministra
da Educação interina, resolução homologando o Parecer nº 146/2002.
Esse parecer tem uma resolução anexa que traz novas diretrizes
curriculares para o curso de Direito. Entre as determinações, estão
as seguintes: monografia opcional; atividades complementares e
estágio sem definição de carga horária; e não-obrigatoriedade do
cumprimento de certas disciplinas.
O parecer, contudo, acabou não sendo publicado no
Diário Oficial da União, depois de uma audiência entre a OAB federal
e o ministro Paulo Renato de Souza. Segundo Marcelo Leonardo, a OAB
obteve do Ministério da Educação o compromisso de rever a decisão de
homologar o Parecer nº 146/2002. A entidade já encaminhou,
inclusive, sugestões de mudança. Marcelo Leonardo acrescentou que os
atos administrativos precisam ser publicados para terem validade. No
seu entendimento, continua valendo, portanto, a Portaria 1.886/94,
que trata das diretrizes curriculares para criação de cursos de
ensino jurídico.
PARECER QUE REDUZ GRADUAÇÃO PARA TRÊS ANOS AINDA
ESTÁ NO CNE
O coordenador-geral do Centro Acadêmico Afonso Pena
(CAAP) da Faculdade de Direito da UFMG, Márcio Duarte, leu carta aos
deputados solicitando o envio de um abaixo-assinado da Assembléia às
autoridades competentes, contrário às decisões do Conselho Nacional
de Educação (CNE). Ele lembrou que o Parecer nº 100/2002, que
possibilita a graduação em três anos, foi reencaminhado ao CNE para
revisão, tendo em vista as pressões da OAB e da sociedade civil.
Esse parecer abrange outros cursos, como os de Ciências Econômicas e
Administração.
Duarte fez várias críticas ao governo federal e ao
que chamou de "mercantilização do ensino superior". Segundo ele, os
pareceres que tramitaram no CNE terão como conseqüências, entre
outras, a formação de tecnólogos de ramos do Direito e não de
operadores do Direito. A opinião foi compartilhada pelo presidente
do Diretório Acadêmico da UNI-BH, Murilo Andrade, e pelo coordenador
de Graduação do Curso de Direito da UFMG, Alexandre Gomes. "Como ter
uma formação humanista e entender a complexidade do curso de Direito
em três anos?", questionou.
O diretor eleito da Faculdade de Direito da UFMG,
Aloísio Gonzaga de Andrade Araújo, e o coordenador-executivo do
Procon/BH e professor, Bruno Burghareli, concordaram que a questão
carrega um embate ideológico entre o neoliberalismo e o Estado
Social de Direito; entre um modelo mercadológico e outro que
privilegia o preparo não somente técnico e profissional, mas também
teórico e cidadão. Aloísio Araújo foi um dos que lamentaram o
público reduzido da audiência. Ele informou, ainda, que na próxima
semana, em encontro no Rio de Janeiro, será definida uma coordenação
de Faculdades de Direito das instituições federais, para influir no
processo de criação de cursos de ensino jurídico.
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