Violência responde por mais de 10% das mortes no País

No Brasil, 120 mil pessoas morrem, a cada ano, vítimas de homicídios, acidentes de trânsito e traumas causados por ac...

08/08/2002 - 11:44
 

Violência responde por mais de 10% das mortes no País

No Brasil, 120 mil pessoas morrem, a cada ano, vítimas de homicídios, acidentes de trânsito e traumas causados por acidentes de trabalho, acidentes domésticos, suicídios e outras lesões e envenenamentos. Os óbitos por "causas externas" representam 13% das mortes em todo o País, e as estatísticas mostram que as mortes como conseqüência da violência têm aumentado nos últimos anos. Esses dados foram apresentados nesta segunda-feira (20/5/2002) por participantes do Seminário Regional "Violência Urbana e Saúde Pública", no Plenário da Assembléia Legislativa de Minas Gerais.

O Seminário, que prossegue na manhã desta terça-feira (21/5), com a realização da plenária final, está sendo promovido pela Assembléia de Minas, pelo Conselho Nacional de Saúde e pela Comissão de Movimento Urbano da Câmara dos Deputados. O evento é um desdobramento do Seminário Nacional sobre Violência Urbana e Segurança Pública, promovido, em outubro do ano passado, pela Câmara dos Deputados, por meio da Subcomissão Especial de Violência Urbana e Segurança Pública. Participaram da organização do evento representantes de entidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, todas com o mesmo objetivo: debater o quadro agravante da violência e saúde pública na região e encontrar o melhor caminho para que a população tenha uma qualidade de vida melhor.

Exclusão social - O deputado Antônio Júlio (PMDB), presidente do Legislativo mineiro, abriu os debates ressaltando o conjunto de fatores que caracterizam a violência urbana e a exclusão social. Em seu pronunciamento, o presidente disse que as conseqüências diretas da violência urbana podem ser constatadas pelo elevado número de ocorrências policiais, de atendimentos nos hospitais e centros de saúde.

Diante dos índices crescentes de violência e criminalidade, e da Constituição, que deixa claro o dever do Estado e o direito de todos à segurança, o presidente mostrou a necessidade de um esforço conjunto, envolvendo os poderes públicos, as instituições da sociedade civil e a população de modo geral, para melhorar esta situação. A Assembléia mineira vem desenvolvendo, nos últimos anos, uma série de ações com vistas a sensibilizar autoridades e população sobre o problema da segurança, como debates, audiências públicas, recebimento de queixas e denúncias, formação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), em situações específicas, e o lançamento, no ano de 2000, do "Movimento pela Segurança e Vida".

Investimento pequeno - Rubens Furlan, presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados e autor de um projeto, em tramitação naquela Casa legislativa que dá poder de polícia às guardas municipais, disse que nos últimos oito anos foram feitos poucos investimentos em segurança pública. Segundo ele, em São Paulo morre uma pessoa assassinada por hora, sendo a média de 26 mortes por dia.

Elias Rassi Neto, representante do ministro da Saúde, Barjas Negri, ressaltou a importância da relação da violência com a democracia. "O entendimento e a compreensão da politização do olhar na saúde e segurança leva ao conhecimento de uma profunda epidemia, de uma situação atual trágica nos setores", disse. De acordo com o deputado José Augusto, representante do presidente da Assembléia Legislativa de São Paulo, Walter Feldman, a violência urbana reflete no serviço de saúde, sendo responsável por 8% dos custos das internações em São Paulo. Ele afirmou, ainda, que 60% das mortes naquele Estado são de jovens, causando "a perda de gerações inteiras". Para ele, a violência de aglomeração (falta de educação, saúde e outros pontos básicos que o número elevado de uma população traz ) muitas vezes é causa da "violência de sangue".

O deputado mineiro Edson Rezende (PT), um dos autores do requerimento que deu origem ao seminário, lembrou os trabalhos feitos na Assembléia que confirmam a situação grave no setor de saúde e na violência urbana. O quadro alarmante do IML e dos presídios da região metropolitana, a violência no trânsito e o grande número de mortes causadas pelas mineradoras em Minas, na sua opinião, são fatos que não tiveram respostas satisfatórias da parte do governo.

SOCIEDADE PRECISA SE MOBILIZAR

A deputada federal Maria do Carmo Lara (PT/MG) disse que a preocupação atual não está mais centrada no desemprego, mas, sim, na violência urbana. "Representantes de várias entidades, conselhos estaduais e Assembléias reuniram-se para organizar o Seminário. É importante que todos, neste momento, ajudem também a encontrar soluções para este fato. O ideal é somarmos experiências para que possamos viver com tranqüilidade", disse a deputada.

O secretário de Saúde de São Paulo, José da Silva Guedes, informou que de 1980 a 1999 as chamadas "causas externas" (mortes por traumas, acidentes, assassinatos) cresceram em 27% e que, hoje, 80% das internações do SUS são por causas externas. Para o secretário, é necessário que haja "uma ação geral da política do País" para um desenvolvimento sustentável do cidadão, para que as pessoas tenham chance também de participação e acesso ao lazer e atividades esportivas.

Minas Gerais - O secretário de Estado da Saúde de Minas Gerais, Carlos Patrício Freitas Pereira, defendeu ações integradas e intersetoriais na busca de soluções para o problema da violência urbana e saúde pública. Ele foi um dos expositores da parte da manhã do Seminário Regional "Violência Urbana e Saúde Pública", realizado pela Alemg e promovido pela Câmara dos Deputados, Conselho Nacional de Saúde e Assembléias da Região Sudeste, entre outros. Pela manhã, foi discutido o tema "Os impactos da violência na saúde", reunindo secretários de Estado da Região Sudeste, estudiosos e interessados. "As políticas públicas devem ser intersetoriais, envolvendo segmentos como saúde, justiça, segurança, educação, lazer e comunicação", ressaltou Carlos Patrício.

Números deficientes - A deficiência das estatísticas também foi apontada pelo secretário como um problema. Na opinião dele, é preciso traçar estratégias que conduzam à melhoria do sistema de informações sobre mortalidade. "É necessário tornar mais objetivas as informações, pois as estatísticas são pouco confiáveis", disse. O secretário da Saúde informou que, em 1999, foram registrados cerca de 100 mil óbitos em Minas, sendo cerca de 10 mil devido a causas externas - que abrangem desde um simples acidente doméstico até acidentes de trânsito, estupros e mortes por arma branca e de fogo, entre outros. Cerca de 3 mil óbitos tiveram como causa acidentes de transporte, em 1999. No Hospital João XXIII, foram atendidos, em 2001, 15 mil pacientes vítimas de acidentes de trânsito e 9 mil vítimas de agressões. Sessenta mil foram classificados como vítimas de "outros acidentes" (acidentes com cortes, sem cortes, quedas, queimaduras e por fogos de artifício).

Carlos Patrício comentou, ainda, as ações desenvolvidas pelo Executivo estadual em parceria com os municípios e o governo federal. Segundo ele, o plano de urgência e emergência conduzido pelo Estado deverá estar concluído no final de 2002. Ele não informou os números do investimento. O plano abrange, entre outras, as seguintes ações: medidas na área de resgate, com participação do Corpo de Bombeiros Militar; criação das Centrais de Regulação, que vão encaminhar as vítimas da unidade de resgate para as unidades de assistência (hospitais e prontos-socorros); seleção de unidades com equipamentos e condições de receber os pacientes e capacitação de pessoal. A criação das centrais envolve recursos federais, contrapartida pelo governo estadual e também parcerias com os municípios.

IML - Sobre o Instituto Médico Legal (IML), cujas problemáticas condições têm sido alvo de matérias na imprensa, o secretário da Saúde informou que deverão ser iniciadas ainda este ano as obras de construção da Central de Vigilância de Óbitos. Essa central se encarregaria de conduzir as necropsias em pacientes suspeitos de doenças infecto-contagiosas. Carlos Patrício informou que, agora, estão sendo mantido contatos entre as Secretarias da Saúde e da Segurança Pública e o município de Belo Horizonte.

DESEMPREGO TAMBÉM É FORMA DE VIOLÊNCIA

Na opinião do professor Elias Jorge, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que atuou como debatedor, a "mãe de todas as violências" é a questão orçamentária. Ele ressaltou que foi escolhida como política pública prioritária, desde 1994, a política de estabilidade da moeda, apresentando números sobre o comprometimento do Orçamento da União com o pagamento de juros e amortização da dívida. Tanto Elias Jorge quanto Maria Natividade Gomes Teixeira, que representa os trabalhadores em saúde no Conselho Nacional de Saúde, enfocaram o desemprego como uma forma de violência. "Não há violência maior que o cidadão estar desempregado", enfatizou Elias Jorge. Para Maria Natividade, criar postos de trabalho faz parte do rol de ações de combate à violência.

Carta de Brasília - A representante do Conselho Nacional de Saúde enfatizou que o problema da violência só será resolvido com esforço conjunto do Estado e sociedade. Maria Natividade criticou o modelo de gestão do Estado classificado por ela como neoliberal; e o fato de o Brasil sempre ter tido modelos agrários de latifúndios que expulsam o homem do campo. A conselheira também lembrou a necessidade de se instituírem políticas públicas de recursos humanos para capacitar os trabalhadores da saúde - os primeiros a lidarem com o cidadão vítima de violência. Ela chamou a atenção para a importância de se discutir, no seminário regional, a Carta de Brasília, resultado do Seminário Nacional sobre Violência Urbana e Segurança Pública, realizado em outubro de 2001, em Brasília. Ele foi promovido pela subcomissão que trata desses temas vinculada à Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados.

MORTE POR CAUSAS VIOLENTAS É DE 120 MIL NO ANO

A Carta de Brasília, em seu item 15, ressalta que, no que diz respeito à saúde e violência, as chamadas "causas externas" (que provocam o trauma e incluem os homicídios, acidentes de trânsito, acidentes de trabalho e domésticos, suicídios e outras lesões e envenenamentos) constituem hoje, no Brasil, o segundo grupo de causa de morte. Elas respondem por cerca de 120 mil óbitos a cada ano e a 13% do total de mortes. Considerando também que os fatores associados a esse crescimento da violência não têm causa isolada, a Carta de Brasília propõe uma série de ações. Entre elas, a implementação de uma política nacional de redução da morbimortalidade por acidente e violências a partir de ações articuladas e integradas de diversos setores do governo e da sociedade; e medidas como a redução de promoção, uso e disponibilidade de arma de fogo; e a criação de uma base de dados sobre trauma e violência como início de um esforço nacional de priorizar a informação visando à implementação das políticas públicas de combate à violência.

Para o professor da Faculdade de Medicina da Unesp/Botucatu Milton Flávio Latenschlager, a violência deve ser encarada como epidemia. O momento atual da violência no País, acrescentou, não decorre, provavelmente, de ações equivocadas ou de não ações dos atuais governantes. "Os jovens vítimas ou praticantes da violência representam uma geração perdida, abandonada por governos que deveriam ter tido responsabilidade há dez, doze anos", disse. Na opinião dele, o problema da violência deve preocupar Executivo, Legislativo - que estabelece a destinação orçamentária dos recursos que o Estado arrecada; e Judiciário - que, para ele, tem protelado decisões.

A ação do Estado foi também abordada pelo secretário de Estado da Saúde do Espírito Santo, Carlos José Cardoso, expositor da manhã. Segundo ele, o Estado tem sido ineficaz em combater a violência e resolver os crimes. Se os órgãos estaduais estão deficientes, mas há envolvimento da sociedade, podem ser buscadas as soluções, completou o secretário. Já o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), co-autor do requerimento que deu origem ao seminário, espera propostas concretas para enfrentar o problema da violência urbana e saúde pública.

 

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