União é fundamental para ampliar o poder de legislar
"O desafio de ampliar o poder de legislar passa por
coragem e determinação." A afirmação foi feita pelo presidente
Antônio Júlio (PMDB), na abertura do Ciclo de Debates "Ampliar o
Poder de Legislar", realizado nesta sexta-feira (5/7/2002), no
Plenário da Assembléia. O deputado Antônio Júlio dispensou a leitura
do discurso formal e disse que, naquele momento, preferia falar com
o coração. Segundo ele, a união entre todos os Parlamentos do País é
fundamental para se conseguir avançar e propor mudanças em nível
nacional.
O presidente da Assembléia de Minas criticou a
centralização das decisões em Brasília, dizendo que o próprio
Congresso Nacional perdeu a capacidade de legislar, pois as medidas
provisórias tornaram-se mais importantes que o trabalho parlamentar.
Para ele, é preciso mudar o estado de submissão ao poder central.
"Não podemos esperar que as coisas mudem. Essa situação precisa ser
modificada. É uma caminhada longa, difícil, mas alguém tem que
começar. Que seja uma luta de todos nós e do povo contra esse
poderio econômico-financeiro que está impondo amarras a todos os
parlamentares, em nível federal, estadual e municipal.",
declarou.
Liberdade - O presidente
salientou a necessidade de se tirar essas amarras para fazer do
Brasil um país de liberdade e de ações. Antônio Júlio disse que os
debates servirão para se tirar um documento de valia a ser
encaminhado aos candidatos à Presidência da República e aos
presidentes do Congresso Nacional e da Câmara dos Deputados. "Para
mudar o País, só com ideal e força. E nós vamos mudar, pois queremos
mudar. Precisamos devolver ao nosso povo o pacto federativo, para
que possamos ter liberdade e dar melhores condições de vida ao
povo", comentou o presidente.
Presidente da Unale pede união
O presidente da União Nacional dos Legislativos
Estaduais (Unale) e deputado estadual do Mato Grosso do Sul,
Maurício Picarelli, disse que, atualmente, os parlamentares vivem
uma condição que se contrapõe à própria identificação do Legislativo
como um dos poderes constitucionalmente reconhecidos. "O Poder
Legislativo não está mais sendo visto como verdadeiro e autêntico,
por não estar sendo detentor da prerrogativa de legislar. O
Legislativo Estadual deve ser visto como um verdadeiro Poder e não
como um anexo de Poder", declarou.
Segundo Maurício Picarelli, o Brasil vive dias em
que o Poder Executivo legisla e o Legislativo avaliza tais atos,
sobrando aos legisladores projetos de menor relevância, que não
geram efeitos no âmbito da competência estatuída pelas constituições
federal e estadual. Ele salientou a necessidade de união não só
entre os presidentes das Assembléias, mas de todos os deputados
estaduais. O presidente da Unale criticou o fato de que nem todas as
Assembléias Estaduais se fizeram presentes, quando convocadas, para
assumir a bandeira do resgate ao poder de legislar.
O ciclo de debates contou com as presenças de
deputados do Maranhão, Acre, Piauí, Mato Grosso do Sul, Tocantins,
Bahia, Amazonas, Santa Catarina, Mato Grosso, Goiás, Pernambuco,
Distrito Federal e Roraima.
Ampliação depende dos próprios deputados
Para ampliar o poder de legislar, não bastam apenas
mudanças constitucionais, são necessárias também transformações no
Parlamento. A opinião é do gerente de consultoria temática da
Assembléia, Sabino José Fortes Fleury. Para ele, os legisladores têm
que estar atentos às transformações da sociedade para continuarem
atendendo às demandas da população. Sabino citou como exemplo a
Constituição brasileira de 1891, que dispunha sobre orçamento,
finanças públicas, Direito Civil, Processual e Criminal. A
Constituição de 1988 teve de tratar de uma série de assuntos
técnicos, que exigem conhecimento profundo por parte dos
legisladores.
Mas, para Sabino Fleury, a necessidade de
conhecimento técnico não diminui a importância do trabalho
parlamentar. "O técnico não deve assumir o controle do processo
legislativo, afinal, o político é o representante do povo". Na
opinião do consultor, a nova forma de produção legislativa pressupõe
também a circulação de informações. "É fundamental que o Parlamento
do Rio Grande do Sul saiba o que a Assembléia do Amapá está fazendo,
para que os Legislativos estaduais se fortaleçam", disse. O
fortalecimento das Assembléias Legislativas, para ele, é a forma de
contornar a supremacia da União sobre os Estados, no campo
legislativo.
"No Brasil, temos uma tutela federal sobre os
Parlamentos estaduais. Tenho a sensação de que Brasília considera os
Estados incapazes de legislar", afirmou Sabino. Ele citou como
exemplo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que estabelece
limites rígidos para os gastos de Estados, Municípios e União. "A
LRF tem eficácia maior que qualquer lei estadual. Isso é reflexo da
presunção da irresponsabilidade dos Estados", analisou. A LRF não é
a única legislação federal que podou competências dos Estados.
Segundo Sabino Fleury, as sucessivas Constituições federais também
reduziram atribuições dos Estados, transferindo-as para a União. A
Constituição de 1891, por exemplo, delegava aos Estados competência
para legislar privativamente sobre educação, correios estaduais e
até Direito Processual. Já em 1934, esses assuntos deixaram de ser
de competência privativa dos Estados.
Presunção do erro - Mas,
para Sabino Fleury, essa situação pode ser revertida. "Para isso, os
Estados têm que mostrar que são competentes, precisam assumir o ônus
do erro, pois quem é independente é responsável por seus sucessos e
insucessos", ressaltou. Quem também defendeu a necessidade de se
correr riscos foi o ex-prefeito de Belo Horizonte e conselheiro
pedagógico da Escola do Legislativo, Patrus Ananias. "A lei é
precedida de conflitos. Por isso, temos que perder o medo do
conflito, pois ele é inerente à democracia", afirmou. Com ou sem
democracia, o Brasil tem passado por constantes embates entre
tendências centralizadoras e descentralizadoras, segundo Patrus. Ele
lembrou que alguns intelectuais chegaram a defender a centralização
de poder na União como forma de modernizar o País.
Mesmo que a Constituição de 1988 não atribua aos
Estados competência para legislar sobre os assuntos que afetam
diretamente a maioria dos cidadãos, Patrus acredita que ainda há
muito a ser feito pelos Legislativos estaduais, no que diz respeito
às questões urbanas, ambientais, de segurança pública, preservação
do patrimônio histórico e desenvolvimento regional.
O ex-prefeito lembrou aos deputados que a
Constituição Federal abre a possibilidade de aumentar as
prerrogativas dos Estados. O artigo 22 diz que Lei Complementar pode
autorizar os Estados a legislar sobre matéria de competência
privativa da União. E o artigo 23 estabelece que Lei Complementar
fixará normas para a cooperação entre Estados, Municípios e União,
para tratarem de assuntos de competência comum. "Esses dois artigos
abrem espaço para debate. Se essas leis complementares forem feitas,
podemos criar um novo espaço de ação dos Legislativos estaduais",
avaliou.
Dependência do Executivo - A submissão do Poder Legislativo ao Executivo foi lembrada pelo
coordenador do debate, deputado Márcio Cunha (PMDB). "É
impressionante a vocação governista desta Casa. Muitas proposições
de lei não vão a Plenário porque o governador não concorda. Mas não
podemos ficar à mercê dos projetos de utilidade pública. Temos um
papel maior do que o que estamos desempenhando", reclamou o
deputado.
|