Acampados pedem apoio à Comissão de Direitos Humanos

"Queremos terra, um lugar para trabalharmos honestamente." Este é o principal desejo das 120 famílias de trabalhadore...

20/06/2002 - 17:07
 

Acampados pedem apoio à Comissão de Direitos Humanos

"Queremos terra, um lugar para trabalharmos honestamente." Este é o principal desejo das 120 famílias de trabalhadores rurais sem-terra acampadas, temporariamente, em um sítio na localidade de Tijuco, no Município de Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Na manhã desta quinta-feira (20/6/2002), os acampados receberam a visita de deputados da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa.

A condição precária de vida é a característica marcante dessa comunidade, que há um ano aguarda uma posição do governo federal para conseguir a posse das terras da Fazenda Bela Vista, situada na fronteira dos municípios de Sarzedo e Mauro Campos, próximos a Brumadinho. As casas são construídas com pedaços de bambu e lona; os banheiros são duas fossas também construídas com pedaços de bambu; fogões, só à lenha. Rede elétrica, no acampamento não existe. O único bem que os trabalhadores rurais sem-terra possuem é a água, que vem de uma nascente.

A trabalhadora Iêda Maria Oliveira Rocha, 45 anos, vive com o marido e cinco filhos no acampamento. Ela conta que os filhos não podem estudar, pois para chegar até a escola mais próxima, em Bom Jardim, deve-se fazer uma caminhada de pelo menos duas horas. As famílias também têm sofrido com a falta de condições na área de saúde, como relata Iêda Rocha. Segundo ela, as crianças e os velhos adoecem constantemente, por causa da baixa resistência ao frio, à poeira e à fome. A trabalhadora afirma que grande parte do alimento que comem e da roupa que têm vêm de doações.

No entanto, a situação piora a cada dia, conforme diz o também acampado José Geraldo Soares, 29 anos. Segundo ele, as pessoas que moram nos arredores do acampamento estão parando de fazer doações, por causa do preconceito. Para ele, essa é uma grande barreira da luta dos trabalhadores rurais sem-terra no Brasil. "As pessoas acham que sem-terra é vagabundo. Pelo contrário, nós queremos é um lugar para trabalhar", confessa. José Geraldo explica que nas terras do sítio em que vivem, atualmente, não é boa para o plantio, por isso a dificuldade para se conseguir garantir a sobrevivência dos filhos e dos parentes. No acampamento, planta-se, principalmente, hortaliças.

DIVERGÊNCIAS COM O INCRA

O desejo das 120 famílias de trabalhadores rurais sem-terra de conseguir a posse das terras da Fazenda Bela Vista, entre os municípios de Sarzedo e Mário Campos, já se arrasta há mais de um ano. Para o trabalhador rural José Geraldo, a posse das terras só não aconteceu por questões políticas. Ele lembra que o prefeito de Mauro Campos é contra a reforma agrária, por acreditar que ela pode trazer mais despesas para o município, prejudicando o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo ele, as famílias acampadas também consideram que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) está tendo "má vontade" em implementar alguma ação.

O assessor de Política Agrícola da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Eduardo Nascimento, informa que entre janeiro e fevereiro deste ano um técnico do Incra fez uma vistoria nas terras da Fazenda Bela Vista, que resultou em um laudo de avaliação da possibilidade de se implementar a reforma agrária no local. De acordo com Eduardo Nascimento, o relatório concluiu que apenas 25% das terras são agricultáveis, por isso o imóvel não poderia ser viabilizado para fins de assentamento das famílias. Para o assessor de Política Agrícola da Fetaemg, o laudo é contraditório e mostra que o Incra não tem a intenção de superar os obstáculos que impedem o assentamento das 120 famílias. Ele defende a realização de uma visita complementar à Fazenda Bela Vista, a fim de que sejam verificadas as condições que, segundo ele, foram desprezadas pelo Incra. Com isso, defende a anexação, ao relatório, de um documento com a opinião de um técnico que entenda de agricultura familiar, em que ele analise se existe a possibilidade de serem cultivados hortifrutigranjeiros no local; e que a questão ambiental seja melhor tratada; além de que sejam propostas novas formas de sobrevivência sustentável.

Incra se defende

O chefe da Divisão Técnica do Incra, Antônio Carlos da Silva, afirma que o Instituto tem interesse em solucionar problemas cuja natureza é a reforma agrária. Segundo ele, o que dificulta é a lentidão da tramitação do processo de desapropriação de terras. Sobre o laudo feito pelo Incra na Fazenda Bela Vista, Antônio Carlos da Silva relatou que o documento ainda está sendo analisado pela Câmara Técnica do Instituto, mas que acredita que a conclusão feita pelo técnico será mantida. O chefe da Divisão Técnica do Incra disse que em momento algum o relatório afirma que as terras da Fazenda Bela Vista são improdutivas. De acordo com ele, o laudo conclui que apenas 25% são agricultáveis, o que poderia ser prejudicial para os próprios trabalhadores rurais que estão à procura de terras para plantar.

DEPUTADOS VISITAM ACAMPAMENTO

A fim de agilizarem o processo de assentamento na Fazenda Bela Vista, as 120 famílias de trabalhadores rurais sem-terra acampadas no sítio em Tijuco, pediram apoio aos deputados da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa. Nesta quinta-feira (20/6/2002), os deputados Márcio Kangussu (PPS), presidente da Comissão, e João Leite (PSB) fizeram uma visita ao acampamento, a fim de verificar as condições de sobrevivência das famílias e buscar um caminho para solucionar a questão do assentamento. A visita foi organizada a partir de um requerimento apresentado pelo deputado João Leite. Os deputados estavam acompanhados do assessor de Política Agrícola da Fetaemg, Eduardo Nascimento; da diretora de Política Agrícola da Fetaemg, Maria Rita Figueiredo; do chefe da Divisão Técnica do Incra, Antônio Carlos da Silva; do procurador do Iter, Luiz Chaves; do ex-candidato a prefeito de Mauro Campos, Walace de Souza Maia; e da representante dos acampados, Valéria Antônia da Silva.

O deputado Márcio Kangussu afirmou que a visita representava a solidariedade e a intenção da Comissão de Direitos Humanos em resolver a questão do assentamento das 120 famílias. De acordo com ele, os deputados não possuem o poder para resolver a questão, já que ela se insere no âmbito federal, mas que eles poderiam exigir respeito àquelas famílias. Márcio Kangussu afirmou que a Comissão atuaria questionando o Incra sobre a viabilidade do laudo; e que iria ao governo estadual solicitar mais atenção para com os acampados, doando alimentos, roupas, e garantindo educação e saúde. O deputado elogiou a união e a organização das famílias e aconselhou os acampados a nunca perderem a força e a perseverança.

O deputado João Leite criticou o governo federal, que, segundo ele, fez uma "propaganda enganosa" aos acampados. No ano passado, o governo teria inscrito as famílias num programa de reforma agrária, confirmado a inscrição, mas não cumpriu com o prometido. João Leite reafirmou o compromisso da Comissão de Direitos Humanos em defender os trabalhadores rurais sem-terra e apoiá-los na luta contra a "ação discriminatória" do governo federal.

Durante a visita ao acampamento, os deputados marcaram uma reunião para as 14 horas da próxima segunda-feira (24/6) entre os representantes dos sem-terra, do Iter, do Incra e da Fetaemg, na sede do Incra.

 

 

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