A Comissão de Diretos Humanos reuniu-se nesta
quarta-feira (19/9/2001) e promoveu uma discussão sobre a construção da
Usina Hidrelétrica de Irapé, no Vale do Jequitinhonha e suas conseqüências
nos âmbitos social e ambiental para a população que reside no local
destinado à obra. A barragem está sendo feita na região do Alto Vale do
Jequitinhonha e, em função da sua construção, o lugar onde situam-se 47
comunidades, com mil famílias ribeirinhas, será alagado pela água
represada. Ao todo, serão atingidas cerca de 5 mil pessoas.
O representante da Associação dos Atingidos pela Barragem
de Irapé, José Francisco da Cruz, salientou que os moradores estão muito
preocupados com a situação. Segundo ele, o futuro das famílias que residem
na região não está sendo tratado da maneira correta pelos responsáveis
pela construção da barragem. "Nosso povo tem sofrido bastante nos últimos
meses em função da falta de organização daqueles que estão à frente do
projeto. A nossa insegurança e o medo crescem a cada dia, pois não sabemos
o que nos aguarda", declarou. José Francisco disse, ainda, que a Cemig,
responsável pela construção da hidrelétrica - não ouviu devidamente a
população que mora às margens dos rios Tacambirussu e Jequitinhonha. "A
empresa parece não ter responsabilidade com o grave momento pelo qual
passamos. Na pesquisa que fizeram na região, eles não levaram em conta a
opinião da nossa gente", afirmou Francisco, que classificou o projeto de
"imoral e desrespeitoso". Outro representante da Associação dos Atingidos
pela Barragem de Irapé, José Antônio, lembrou que a comissão foi criada em
1989, na cidade de Cristália. "Criamos o projeto para acompanhar a
construção da barragem. Queríamos garantir o nosso direito, mas não
avançamos em nada neste sentido", declarou.
AGRICULTURA É PRIORIDADE PARA MORADORES
A antropóloga Flávia Maria Galizoni fez uma explanação
sobre a situação do relevo e da cultura de alimentos da região do Alto
Vale do Jequitinhonha. Por meio fotos, ela mostrou a agricultura dos
moradores ribeirinhos e frisou a importância de um trabalho sério para o
reassentamento da população. "O sistema agrário da região é dividido entre
áreas particulares e comuns. O povo local possui uma forma muito boa para
o cultivo das culturas, pois eles sabem trabalhar em conjunto com a
natureza, e isso é raro atualmente", observou Flávia Galizoni.
Ela disse também que uma política de empregos deve ser
prioridade no processo de deslocamento da população ribeirinha. "A área na
qual eles trabalham possui a melhor terra, na região, para o plantio.
Quando fiz a minha pesquisa, apurei que os trabalhadores rurais produzem
meia tonelada de flores, especificamente a sempre-viva, para São Paulo, o
que é uma fonte de renda que não podemos desprezar", completou.
A deputada Elbe Brandão (PSDB) mostrou uma cartilha feita
pela Cemig na qual a empresa se compromete a tomar providências que
amparem os moradores que terão suas terras alagadas. A deputada disse que
a cartilha não foi colocada em prática ainda. "Pelo depoimento dos
representantes dos atingidos pela barragem, concluímos que vários pontos
não estão sendo considerados. De acordo com o que ouvimos, a Cemig não
cumpriu com os seus compromissos", declarou a deputada, que propôs uma
fiscalização rígida da Assembléia a partir desta reunião. "Temos que
acompanhar o processo de perto", disse. O presidente da Comissão, deputado
Edson Rezende (Sem Partido), também demonstrou preocupação e afirmou que
"a construção da barragem envolve o direito das pessoas e a nossa função é
garantir a integridade dos moradores".
CEMIG NÃO QUER PREJUDICAR RIBEIRINHOS
O representante da Cemig, Ronaldo de Oliveira Martins,
garantiu que a empresa está atenta e preocupada com a situação da
população atingida pela barragem. Segundo ele, a empresa se responsabiliza
pelas atitudes tomadas. "A Cemig não irá fazer promessas, mas se
compromete a não prejudicar os ribeirinhos. Entendemos a angústia do povo
e iremos, em outubro, nos reunir com as comunidades locais, até porque
elas são a prioridade para nós", disse Martins.
O procurador da República, Afrânio Nardi, afirmou que o
Ministério Público está ciente do processo da construção da usina de
Irapé. "Estamos tomando providências, pois constatamos irregularidades na
pesquisa do projeto. Estão em andamento dois processos administrativos nos
quais levantamos possíveis falhas nas análises feitas pela Cemig na
região", explicou Nardi, que pretende se reunir com os representantes da
empresa e da população atingida para solucionar as dúvidas em torno da
construção da hidrelétrica. "Queremos convocar todos os interessados no
assunto para que não haja injustiça no futuro", afirmou o procurador.
DENÚNCIA CONTRA PMMG
No início da reunião, a jornalista Emília Romilla
apresentou denúncia contra a Polícia Militar da cidade de Itabira. Ela
acusa instituição de forjar um flagrante que, no dia 5 de setembro, levou
à prisão de seu esposo e também jornalista, José Geraldo Rodrigues.
Segundo Romilla, José Geraldo, diretor do Jornal "Espinhaço", fez uma
série de reportagens sobre torturas e espancamentos que garimpeiros da
região teriam sofrido por parte da polícia. "Eles armaram uma cilada para
o meu marido como retaliação pelas denúncias e esconderam drogas na nossa
casa. Desde então ele está detido, mas todos da cidade sabem da sua
inocência", declarou Romilla.
A Comissão aprovou um requerimento solicitando a
realização de audiência pública para ouvir o comandante-geral da PMMG; a
Procuradoria-Geral da Justiça do Estado; a Ouvidoria da PMMG; o Sindicato
dos Jornalistas de Minas Gerais; o Tribunal de Justiça; a Presidência da
Câmara Municipal de Vereadores de Itabira; o Sindicato dos Radialistas; o
Sindicato dos Jornalistas do interior do Estado; a Secretaria de Segurança
Pública e um representante da Companhia Vale do Rio Doce sobre as
circunstâncias que envolveram a prisão do jornalista José Geraldo
Rodrigues.
REQUERIMENTOS APROVADOS
Foram aprovados, ainda, cinco requerimentos. O primeiro,
dos deputados Edson Rezende (sem partido) e Carlos Pimenta (PSDB), pede
que a Comissão institua um processo de acompanhamento permanente dos
atingidos com a implantação da Usina de Irapé e que se coloque como
mediadora dos acordos feitas com o governo do Estado, através da Cemig. O
requerimento apresentado pelo deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) pede que
seja realizada audiência pública para se discutir o PL 1.637/2001, tendo
como convidados representantes de órgãos públicos e entidades civis
relacionadas com a questão da titulação das terras remanescentes de
quilombos e o desenvolvimento dessas comunidades. O terceiro requerimento,
da deputada Elbe Brandão (PSDB), pede realização de audiência pública na
cidade de Janaúba, para a discussão de problemas de segurança pública que
ameaçam a população da região.
O deputado Edson Rezende requer audiência pública nas
dependências da E.E. Governador Milton Campos, em Belo Horizonte, para
debater a questão da representação do corpo discente com a diretora da
escola, professora Lúcia de Macedo Soares Poli; representante do
Secretário de Estado da Educação; e representantes dos alunos da escola. O
quinto requerimento, do mesmo deputado e do deputado Durval Ângelo (PT),
pede que seja oficiado ao governador, à Procuradoria-Geral de Justiça, à
Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos do Ministério Público de Minas
Gerais, ao Conselho Estadual dos Direitos Humanos, à Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados, à Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG
e à Ouvidoria de Polícia do Estado de Minas Gerais a preocupação da
Comissão dos Direitos Humanos com as denúncias do jornalista Ilson Lima,
que alega ter sido demitido do Jornal "Estado de Minas" por influência do
secretário da Segurança Pública, em razão de matérias sobre o caso do
jornalista José Cleves.
Foram aprovadas, ainda, três proposições que dispensam
apreciação do Plenário.
Presenças - Estiveram presentes
à reunião os deputados Edson Rezende (sem partido), presidente da
Comissão; Marcelo Gonçalves (PDT), Dimas Rodrigues (PMDB), Adelmo Carneiro
Leão (PT), Ermano Batista (PSDB), Eduardo Hermeto (PFL), Gil Pereira
(PMDB), Márcio Kangussu (PPS), Marco Régis (PPS), Carlos Pimenta (PSDB),
Maria José Haueisen (PT), Doutor Viana (PMDB) e a Elbe Brandão (PSDB).