Globalização esvazia os movimentos coletivos

O entendimento sobre como se desenvolveu o processo de globalização no mundo contemporâneo e o debate sobre os modelo...

30/08/2001 - 18:50


 Globalização esvazia os movimentos coletivos

 

O entendimento sobre como se desenvolveu o processo de globalização no mundo contemporâneo e o debate sobre os modelos que poderão se contrapor a esse fenômeno, possibilitando o surgimento de um novo caminho para o desenvolvimento das nações foram os temas principais, abordados pelos expositores, durante o painel "Globalização, Neoliberalismo e Financeirização do Capital". O painel , realizado no Plenário da Assembléia Legislativa, na manhã dessa quinta-feira (30/08/2001), faz parte da programação do Fórum Mundial "Minas por um Outro Mundo", promovido pelo Comitê Mineiro do Fórum Social Mundial, com o apoio da Assembléia de Minas e da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.

O embaixador brasileiro, Samuel Pinheiro, que abriu os trabalhos, fez uma breve síntese sobre a evolução do processo de globalização da economia mundial, conduzido hegemonicamente, a partir da década de 80, pelos Estados Unidos e fortemente inspirado na ideologia neoliberal. A versão contemporânea do liberalismo, por sua vez, ainda se inspira na liberdade do mercado e, por isso prega a menor intervenção do Estado, seja como empreendedor, como regulador das atividades econômicas ou como protetor das classes trabalhadoras, deixando que, livres, as forças deste mercado organizem a sociedade.

Capital especulativo - A segunda etapa desse processo é caracterizada pelo fortalecimento e acelerada e acentuada integração do mercado financeiro, que movimenta um volume de recursos muito superior ao montante de capital real disponível no mundo. Esse movimento é realizado através de operações especulativas, geradoras das crises que atingem, principalmente, os países periféricos, mais dependentes do capital internacional. Depois desta análise, o embaixador Samuel Pinheiro buscou identificar como esse fenômeno atinge o Brasil.

"Nós somos um país marcado por disparidades sociais e grande vulnerabilidade externa, condições que requerem, para sua solução, uma atuação consistente dos movimentos sociais e a intervenção do Estado, na definição de políticas sociais de longo alcance" - afirmou o embaixador. O fenômeno da globalização, inspirado na ideologia neoliberal, força, no entanto, o encolhimento do Estado e valoriza o comportamento individualista, atingindo exatamente o sentido de "coletividade" que poderia inspirar uma reação dos países periféricos, prejudicando, desta forma, a sociedade brasileira.

Novo modelo de acumulação subordina economias emergentes ao capital financeiro

O coordenador nacional do Fórum Social Mundial, João Pedro Stédile, coordenador também do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), fez um relato sobre a evolução das formas de acumulação do capital ao longo da história moderna da humanidade. Até o final do século XIX, o processo de acumulação do capital estava baseado na apropriação de matérias-primas e da produção agrícola e, para isso, os capitalistas precisavam ter controle sobre o território dos países fornecedores destes bens e, por isso, a forma de dominação desse período foi o colonialismo.

A partir de 1900 até a década de 30, depois de intensa mobilização nos países dominados, em torno das lutas de libertação nacional, o mundo assistiu ao surgimento das chamadas nações independentes, e de uma nova forma de acumulação de capital. "Os capitalistas passaram a financiar a implantação de infra-estrutura básica, como estradas, usinas hidrelétricas e portos, nestes novos países, levando seus governos ao endividamento" - resumiu João Pedro Stédile.

Em 1930, o capitalismo mundial entra em crise, forçando a mais uma mudança da forma de dominação do capitalismo. No cenário de 30, a classe trabalhadora consegue consolidar uma série de direitos e garantir uma melhor remuneração para os trabalhadores do mundo industrializado e essa condição altera também os mecanismo de espoliação dos mais fracos. O capital é redirecionado para o Terceiro Mundo em busca de mão-de-obra barata. Nesse processo e a partir do final da Segunda Grande Guerra, os Estados Unidos impõe às nações derrotadas o predomínio da sua moeda como base das operações comerciais e consegue, durante várias décadas, dividir o comando da economia com os principais países industrializados do mundo.

Novas tecnologias - Na década de 80, o capitalismo sofre uma nova reviravolta, agravada por vários fatores, como a crise do petróleo do início dos anos 80. Aliada à revolução tecnológica, que permitiu um aumento estupendo da produtividade industrial, sem equivalente crescimento da demanda da mão-de-obra contratada, a crise do capital do final dos anos 80 fez surgir um novo modelo de acumulação, agora baseado no capital financeiro. "São US$ 30 trilhões de capital circulante, em forma monetária, que se movimenta pelo mundo em ondas especulativas e arrasadoras das economias que dele dependem" - afirmou Stédile.

Segundo o coordenador do Fórum Social Mundial, essa dependência se realiza tanto através dos processos de endividamento externo e interno dos países periféricos, onde vigoram taxas de juros aviltantes, como dos programas de desnacionalização das empresas locais. Stédile lembrou que, no final do governo militar do general Ernestro Geisel ele transferiu para o novo presidente, general João Baptista Figueiredo, uma dívida externa, na época considerada exorbitante, de US$ 5 bilhões. "Agora, em cinco anos de governo, Fernando Henrique Cardoso vai transferir para o novo presidente do Brasil uma dívida externa de US$ 280 bilhões".

Ele citou ainda cálculos elaborados pelo economista e pensador brasileiro, Celso Furtado, para reforçar o acentuado processo de financeirização da economia mundial. Durante os 250 anos que os portugueses dominaram o Brasil e daqui extraíram ouro e prata, foram transferidos para o mercado financeiro mundial um total de US$ 1,4 bilhão, em valores monetários atualizados aos dias de hoje. "O governo Fernando Henrique Cardoso transfere anualmente para esse mercado US$ 50 bilhões, ou seja, US$ 1 bilhão por semana" - frisou João Pedro Stédile.

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