Estatuto da Criança está em debate na Assembléia

Violência, delinqüência juvenil, tráfico de drogas, trabalho infantil...

28/11/2000 - 17:51

Estatuto da Criança está em debate na Assembléia

Violência, delinqüência juvenil, tráfico de drogas, trabalho infantil, perspectivas futuras e a ação das autoridades e da sociedade foram temas discutidos no primeiro dia do Seminário "Dez Anos do Estatuto da Criança e do Adolescente, Avanços, Desafios e Perspectivas" promovido pela Assembléia Legislativa, com apoio de 25 entidades entre órgãos públicos e organizações não governamentais. Na noite de segunda-feira (27/11/2000), o 1º-vice-presidente da Assembléia, deputado José Braga (PDT), abriu o Seminário destacando o empenho do Legislativo mineiro na promoção de eventos institucionais. Para ele, tecnicamente o Estatuto da Criança e do Adolescente - que entrou em vigor em 1990 - assinala um grande progresso ao consolidar as normas existentes na legislação brasileira sobre o assunto. "O Estatuto ratificou a condição de sujeitos de direito da criança e do adolescente. E mais do que isso, ele reflete a preocupação do legislador em alinhar o Brasil com as nações realmente civilizadas, onde a proteção do menor é um verdadeiro dogma".

O deputado ressaltou, no entanto, que após 10 anos, "é forçoso reconhecer que não avançamos tudo o que deveríamos". Como exemplo, ele citou questões como o menor abandonado, a delinqüência juvenil e o trabalho infanto-juvenil, que continuam a afligir a sociedade. "É falha a preservação social do menor, bem como sua preparação para integrar a cidadania adulta e responsável", assinalou.

REALIDADE EM MINAS

O primeiro expositor foi o secretário de Estado da Educação e Presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, Murilio Hingel. Segundo o secretário, 49 milhões de crianças e adolescentes com idade entre 14 e 20 anos vivem em favelas, em Minas Gerais. No Estado, 185 mil crianças trabalham e 280 mil, com idades entre 7 e 14 anos estão fora das escolas, enquanto 18% das crianças em idade entre zero e 6 anos de idade são subnutridas. Para Murilio Hingel, esses números refletem o descumprimento do artigo 227 da Constituição Federal, segundo o qual "é dever da família e do poder público assegurar com absoluta prioridade o direito à vida, ao lazer, à cultura, à dignidade e colocar a salvo da violência, da crueldade e da opressão as crianças e jovens".

O secretário enumerou diversas ações de atendimento aos jovens, como políticas sociais básicas de assistência social; prevenção, atendimento e proteção jurídico-social às crianças e adolescentes. Ele elogiou a atuação dos 300 Fundos Municipais em funcionamento, entre os 500 criados, a despeito das limitações e destacou a mobilização que vem sendo feita pela Secretaria para ampliação do Programa Fundo para a Infância e Adolescência (FIA 2000), que em 1999 arrecadou cerca de R$ 500 mil.

O FIA 2000 é um programa de desoneração do contribuinte do Imposto de Renda. As pessoas que recebem até R$ 40 mil ao ano poderão destinar até 6% do Imposto de Renda devido ao FIA. Ele citou o exemplo dos trabalhadores da Companhia Siderúrgica Belgo Mineira, que em 1999 destinaram R$ 300 mil ao Fundo. Os recursos foram destinados a 25 programas implantados no Vale do Jequitinhonha, como o Bolsa-Escola, que beneficiou 19 municípios, alcançando 10 mil famílias e 63 mil pessoas.

CRÍTICA

Antônio Elias Nahas, representante da Secretaria de Estado do Trabalho, criticou os "pessimistas" segundo os quais nada se tem a comemorar nesses 10 anos. Ele entende que essas pessoas desconhecem a complexidade do problema da infância e da juventude e citou diversos programas criados no Estado, como o Casa-Lar, que tem 43 unidades atendendo 300 crianças e adolescentes. Falou, ainda, do Programa Abrigo, que atende a 920 adolescentes; do Programa Curumim, com 26 unidades na Grande BH atendendo 4.700 crianças, e o Programa Trabalho Educativo, que oferece formação profissional a 400 adolescentes, além da Escola Horto (antiga Febem), que abriga 130 crianças em regime de internato.

Antônio Nahas acha que o problema do menor não foi erradicado ainda porque a sociedade como um todo não se mobilizou. Para ele, a sociedade não pode se omitir, transferindo o problema para o Estado. O representante da Secretaria do Trabalho entende que é preciso descentralizar, uma vez que as próprias comunidades podem resolver melhor os problemas que as afetam. "Precisamos aumentar o envolvimento de entidades não-governamentais na questão, porque o Estado possui uma estrutura muito pesada, enquanto as entidades são mais ágeis e, por isso mesmo, mais eficientes", assinalou. Nahas defendeu, ainda, a luta contra a falta de interesse e de recursos, considerando esse um dos grandes problemas da política neoliberal do Governo Federal, que não prioriza o social.

CONSELHOS MUNICIPAIS

O representante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente ( Conanda), Cláudio Augusto Vieira da Silva falou sobre os avanços do Estatuto da Criança e do Adolescente, na sua concepção, uma das leis mais editadas no Brasil, procuradas por milhares de pessoas que desejam conhecer o texto. Um segundo avanço por ele considerado é de que "o Estatuto democratizou o acesso às políticas públicas no Brasil". Cláudio Silva também considerou como vitória o funcionamento dos Conselhos Municipais, fundamentais para a aplicação de uma política pública global.

Outro desafio para o representante do Conanda é a administração dos Fundos, buscando as prioridades e a universalização da qualidade do atendimento. Ele acredita que cabe à sociedade civil, conselheiros e governo o estabelecimento de metas. "Temos que investir no reordenamento das crianças e adolescentes que são privados de tudo. Temos que lutar, acima de tudo, pelo estado de direito. Se não o fizermos, o narcotráfico tomará conta de nossos adolescentes", concluiu.

O último debatedor, Roger Carvalho dos Santos, diretor do Conselho Estadual de Ação Social, entende que "a sociedade civil tem a obrigação de zelar pelo controle social. "A criança e o adolescente têm direitos, enquanto o governo e a sociedade têm deveres para com eles", afirmou. Ele criticou o empenho do Governo Federal para pagar os juros da dívida externa, enquanto para a saúde e educação os recursos são extremamente limitados. "Nós não temos uma cultura que nos ensine a cuidar das crianças como cuidamos de nós mesmos. Precisamos levar a assistência à criança e ao adolescente sem sentimento de culpa. Temos que fazer políticas públicas com vontade, com respeito, buscando os recursos disponíveis, através de propostas claras, para que dêem resultados", concluiu.

MESA

Compuseram a Mesa dos trabalhos, o 1º-vice-presidente da Assembléia Legislativa, deputado José Braga (PDT); o secretário de Estado da Educação, Murilio Avelar Hingel; o chefe do Estado Maior da PMMG, tenente coronel Celso Afonso Faria Jorge; representante da Secretaria de Estado do Trabalho e Ação Social, Antônio Elias Nahas; o promotor da Infância e da Juventude, Eduardo Henriques Soares Machado; o juiz da Infância e da Juventude, Tarcísio Martins Costa; o presidente do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente, Cláudio Augusto Vieira da Silva; o diretor do Conselho Estadual de Ação Social, Roger Carvalho Santos, e o coordenador dos debates, deputado Rogério Correia (PT).

Responsável pela informação - Eustáquio Marques - ACS - 31-32907715