MG não é obrigado a se adaptar à Emenda 19, dizem professores

O Estado de Minas Gerais não está obrigado a promover reforma administrativa ou constitucional para se adaptar às mud...

30/08/2000 - 09:22

MG não é obrigado a se adaptar à Emenda 19, dizem professores

O Estado de Minas Gerais não está obrigado a promover reforma administrativa ou constitucional para se adaptar às mudanças impostas pela Emenda Constitucional 19, do governo federal, que trata da reforma administrativa. A afirmação é consenso entre os professores Júlio César dos Santos Esteves, de Direito Administrativo, e Carmem Lúcia Antunes da Rocha, de Direito Constitucional, ambos da PUC/MG. Eles participaram do Fórum Técnico "Servidor Público Estadual e a Reforma Administrativa", na tarde desta terça-feira (29/8/2000), falando sobre o tema "O regime jurídico único do servidor após a Emenda 19 à Constituição Federal".

A principal mudança provocada pela Emenda 19, segundo o professor Júlio Esteves, é a extinção da obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único como lei normativa das relações de trabalho e de direitos e deveres entre o Estado e seus servidores. Para o professor, a decisão do governo federal de promover essa mudança por meio de uma alteração da Constituição Federal é, no mínimo, "curiosa", já que a Emenda mudou, menos de 10 anos depois, o que foi determinado pela própria Constituição Federal, em 1988, que obrigou todos os entes da Federação a adotarem o regime jurídico único.

REGIME ESTATUTÁRIO É O IDEAL

Ele entende, porém, que a Emenda 19 não determina a pluralidade da regimes e não obriga Estados e Municípios a, compulsoriamente, adotarem outras formas de relação trabalhista que não o regime estatutário. "A Emenda apenas elimina a adoção obrigatória do regime jurídico único, e o Estado de Minas Gerais, assim como os demais, pode ou não mantê-lo", ressaltou. Júlio César Esteves defende, contudo, que o Estado tenha um regime jurídico próprio para seus trabalhadores - os servidores públicos -, devido às especificidades da atividade do serviço público. E esse regime, disse ele, é o estatutário. "A multiplicidade de regimes é um retrocesso para a administração pública, especialmente na administração direta", afirmou.

Júlio César Esteves discorda firmemente da tese defendida por opositores do regime estatutário de que ele permita benefícios e seja um sistema de privilégios para os servidores públicos. Para o professor, o regime estatutário é, antes, uma forma de o Estado defender os seus interesses - que são, por princípio, os interesses da sociedade. Ele também não acredita que o regime celetista seja adequado para o serviço público, a não ser em casos muito específicos. "A Consolidação das Leis do Trabalho foi criada para atender aos interesses do setor privado da economia, e não ao Estado", afirmou. Outro ponto que ele destacou na defesa do regime jurídico único é que, ao abrir mão da sua adoção, Estados e municípios perdem sua autonomia, submetendo-se a regras federais.

OBJETIVOS DA REFORMA DEVEM SER QUESTIONADOS

A professora Carmem Lúcia Antunes Rocha, que é procuradora de Justiça, concorda que a Emenda 19 não obriga os Estados e municípios a abrirem mão do regime jurídico único. Ela fez uma veemente defesa dos servidores públicos e iniciou sua explanação afirmando que a sociedade, os servidores e governantes devem questionar quais os reais objetivos das mudanças que o governo federal chamou de ‘reforma administrativa’ mas que referem-se, segundo ela, muito mais aos servidores públicos. "É preciso que se pergunte como, por quê, para que e para quem foi feita essa reforma administrativa, e qual o tamanho ideal do Estado para o Brasil". Na avaliação da professora, a PEC 39/2000 é desnecessária porque, além da Constituição Estadual ser "muito boa", o regime federativo pressupõe autonomia e, não, submissão dos entes estaduais e municipais ao governo federal.

Para ela, a explicação da implantação das mudanças propostas por meio das Emendas nºs 19 e 20 - "esta, ainda mais grave, porque trata da previdência social e afeta todos os brasileiros" - está no projeto neoliberal do governo federal. Carmem Lúcia criticou a defesa do ‘Estado mínimo’ e indagou se algum dia o Estado brasileiro foi "máximo". "Já tivemos educação para todos, segurança pública em excesso, postos de saúde e atendimento médico sobrando?", ironizou a professora.

Carmem Lúcia disse que, em 1994, o então candidato Fernando Henrique Cardoso defendia, em sua campanha eleitoral, uma profissionalização dos servidores e dos serviços públicos. Mas o que se viu, logo após sua posse, durante os anos de 1995, 96 e 97, sob a gestão de Bresser Pereira no Ministério da Administração e Reforma do Estado, foi uma "orquestrada campanha contra os serviços e servidores públicos". O objetivo, disse a professora, foi desmoralizar os servidores junto à opinião pública, gerando medo e instabilidade nos funcionários como instrumentos que justificassem mudanças nas relações de trabalho entre o Estado e os servidores.

SERVIDORES PÚBLICOS SÃO TRABALHADORES

Ela comparou a proporção dos números de habitantes e de servidores públicos no Brasil, na França e na Itália para defender que o número de servidores no Brasil não é excessivo. O Brasil tem cerca de 163 milhões de habitantes e 6,1 milhões de servidores, em todas as instâncias; a França, cuja administração pública é considerada modelo no mundo, tem 55 milhões de habitantes e cerca de 4,5 milhões de funcionários públicos; e, na Itália, são também cerca de 4,5 milhões de servidores para uma população de cerca de 50 milhões de pessoas.

Para Carmem Lúcia, o que falta aos servidores públicos brasileiros é estímulo, atualização em técnicas e tecnologias, condições físicas adequadas e salários dignos e justos. "Não há servidor público ruim, o servidor público brasileiro é um trabalhador que trabalha, e muito", disse ela. "O que existe é uma péssima prestação de serviços públicos por parte do Estado, e tenho dúvidas se o governo federal tem interesse real em melhorá-los", afirmou. "Por que é que o governo sempre tem dinheiro para gastar com publicidade mas não tem para aumentar os salários dos professores?", questionou a professora, para exemplificar o descaso do governo federal com os servidores e a inexistência de um projeto sério de profissionalização dos serviços públicos.

 

 

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