Comissão debate massacre de Sem-tetos em Betim

A demora no inquérito de apuração das mortes dos trabalhadores Erionides Anastácio dos Santos e Elder Gonçalves de So...

27/04/2000 - 23:46

Comissão debate massacre de Sem-tetos em Betim

A demora no inquérito de apuração das mortes dos trabalhadores Erionides Anastácio dos Santos e Elder Gonçalves de Souza, ocorrida há exatamente um ano, no bairro Bandeirinhas, em Betim, foi o assunto principal debatido na reunião da Comissão de Direitos Humanos realizada nesta quarta-feira (26/04/2000). Os dois homens foram mortos durante um confronto entre a Polícia Militar e um grupo de sem-teto que ocupava um terreno da prefeitura de Betim conhecido como Vila da Bandeira Vermelha. Com o Auditório da Assembléia lotado de manifestantes com cartazes que lembravam a morte dos sem-teto, os deputados também ouviram várias denúncias contra o prefeito de Betim, Jésus Lima.

Para a discussão estavam presentes à reunião o delgado de Betim, Wagner Vidal, o comandante do policiamento de Betim, Major Alexandre Lucas, Helen Ises Mendes presidente da União Nacional dos Servidores Públicos (UNSP), Gerri Francisco representante da Luta Popular pela Moradia (LPM), o vereador Licinio Pereira Baia, Gerson Lima representante da Liga Operária Camponesa e Sebastião Antônio Isaú, um dos feridos durante o confronto. O delegado Wagner Vidal lembrou que a Policia Civil não participou da operação realizada pela PM, mas que após o ocorrido foram feitas todas as perícias necessárias e colhidos vários depoimentos. Segundo o delegado o papel de sua equipe, na época, foi o de apurar as circunstâncias do fato e encaminhar os resultados das investigações à Delegacia de Homicídios de Belo Horizonte.

O representante da Policia Militar, major Alexandre Lucas, comandante do policiamento de Betim, relatou alguns acontecimentos anteriores à ação da polícia. O major revelou que enviou vários ofícios solicitando a presença de representantes da Procuradoria de Justiça de Betim, do Ministério Público, de igrejas evangélicas de Betim e também da própria Comissão de Direitos Humanos da Assembléia para acompanhar a ação da PM mas, segundo ele, nenhum dos convidados compareceu.

AÇÃO DA PM É QUESTIONADA
Ellen Izis Mendes, presidente da União Nacional dos Servidores Públicos (UNSP), que apóia o movimento dos sem-teto, disse que os ofícios enviados pela PM não apresentavam o horário da realização da operação, o que impediu o comparecimento dos convidados. Ela questionou também a razão da PM não ter enviado ofício aos líderes do movimento e disse que, no dia da operação, eles foram chamados às pressas pela prefeitura, para tentar uma nova negociação. Ellen disse ainda que a prefeitura de Betim, durante os 40 dias de ocupação, cortou a água dos acampados e forneceu comida para os policiais militares, demonstrando um claro apoio à ação policial.

O representante da Luta Popular pela Moradia, Gerry Francisco, disse que os acampados da Vila Bandeira Vermelha sempre estiveram abertos às negociações mesmo antes da invasão. Ele informou que no dia do confronto, às 9 horas, a prefeitura de Betim chamou os líderes do acampamento para negociação. Segundo Gerry Francisco isso teria sido um pretexto para a PM invadir o local. "A polícia pegou os acampados desprevenidos usando de grande truculência" alegou Gerry. "Antes do ocorrido o prefeito só dizia que não havia um terreno disponível para o alojamento das 200 famílias presentes no acampamento. Foi necessária a morte de duas pessoas para que a prefeitura conseguisse um terreno" disse Jerry com relação à intransigência da prefeitura nas negociações. "Queremos o encaminhamento do inquérito para a verdade, não para a impunidade como está ocorrendo" protestou o representante dos sem-teto.

MAJOR CRITICA POSTURA DOS SEM-TETO
O major Alexandre Lucas disse que foi elaborada toda uma estratégia no sentido de se amenizar a ação da polícia na retirada dos acampados. O major disse que o discurso pregado pelos sem-teto na época era de "extremo radicalismo". "Os ocupantes do local afirmavam que estavam dispostos a matar ou morrer caso a policia reagisse" lembra o major. Comandante da operação na época, major Alexandre Lucas afirmou ainda que a PM quis agir com transparência quando convidou a Comissão de Direitos Humanos e o Ministério Público para acompanharem as operações de retirada.

O presidente da Comissão, o deputado João Leite (PSDB) confirmou o recebimento do ofício e o convite pessoal do major para acompanhar a ação, mas disse que não pôde comparecer pois na data marcada para a operação já havia agendado uma viagem importante. O deputado lembra que pediu ao major Lucas que mudasse o dia da operação, o que não foi possível segundo o comandante da PM de Betim. João Leite disse ainda que o plano de ação apresentado pelo major não condizia com as imagens registradas na época. "A ação que o comandante me relatou mostrava que a PM iria apenas abrir uma clareira próxima ao local do acampamento e ali ficaria para resguardar a segurança" conta o deputado.

PREFEITO É ACUSADO
Antônio Abdalla Baracat Filho, presidente do Programa de desenvolvimento Comunitário (Prodecom), afirmou que a ação da polícia que culminou na morte de Erionides Anastácio dos Santos e Elder Gonçalves aconteceu a pedido do prefeito de Betim Jésus Lima. Ele revelou que até hoje o terreno encontra-se abandonado pela prefeitura. Ele mencionou também várias irregularidades que teriam ocorrido na atual administração de Jésus Lima. Baracat também fez várias denúncias contra a ex-prefeita de Betim, a deputada federal Maria do Carmo Lara (PT). Antônio Baracat disse ainda que sofreu ameaças públicas de Geraldo Ferreira Silva, procurador de Justiça de Betim.

A deputada Maria Tereza Lara (PT) rebateu as denúncias feitas contra as administrações municipais do PT. "O PT tem um compromisso com a honestidade e estamos prontos para os esclarecimentos das denúncias que, caso não sejam verdadeiras, figurarão como um crime de calúnia", afirmou a deputada. Ela também apresentou documento do Ministério Público relatando a posição radical dos invasores do terreno. A deputada disse ainda que o a manifestação adquiriu um caráter exclusivamente político e não social. "Não concordo com o uso da miséria alheia para discurso político" afirmou Maria Tereza.

Sebastião Antônio Izaú, uma das vítimas da violência ocorrida no acampamento da Vila Bandeira Vermelha, disse que levou um tiro e que a bala ainda se encontra alojada em seu corpo. Ele revelou que o ferimento causou-lhe uma certa limitação de movimentos. "A situação poderia ser diferente se não fosse a ação violenta da polícia. Fomos taxados como um bando de guerrilheiros, o que não é verdade", disse Izaú. Gerson Lima, representante da Liga Operária e Camponesa, qualificou a atitude do prefeito de Betim como "covarde". Ele entregou à comissão a fita de vídeo gravada por Elder Gonçalves de Souza, um dos mortos no confronto. Ele disse que a fita comprova o apoio do prefeito Jésus Lima ao massacre da Vila Bandeira Vermelha.

DEPUTADO PEDE AGILIZAÇÃO DO INQUÉRITO
O deputado Luiz Tadeu Leite (PMDB) falou da grande demora na conclusão do inquérito. "Não concordo com a demora na apuração de um fato como esse. A conclusão prática desse debate é a busca da agilização desse processo" afirmou o deputado. Luiz Tadeu Leite pediu ao presidente da Comissão, deputado João Leite (PSDB), a elaboração de um requerimento solicitando a agilização na conclusão do inquérito. O deputado criticou o radicalismo político e disse que a polícia não deve ser tratada como um "monstro". "A violência é errada dos dois lados", afirmou o deputado.

A Comissão aprovou requerimento solicitando à Secretária de Estado de Segurança Pública rapidez na conclusão do inquérito que investiga as duas mortes ocorridas na Vila Bandeira Vermelha. O presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado João Leite informou ainda que 50% das terras do território nacional são de propriedade pública, o que obriga o Estado à proporcionar trabalho e terra para os sem-terra.

DENÚNCIAS
Na reunião desta quarta-feira (26/4/2000) foram formuladas duas denúncias à Comissão. A primeira foi feita pelo contador Antônio Carlos Assis, que denunciou o espancamento, por policiais militares, de seu filho no último domingo durante o jogo Cruzeiro e Atlético. A outra reclamação foi feita pelo advogado Geraldo Eugênio Faria Santos, da família de Altamir José Oliveira, morto em 28/10/1999, na cidade de Pompéu. Ele disse que após a polícia encontrar o suspeito da morte do rapaz, o juiz da comarca recusou-se a decretar sua prisão preventiva e o delegado do caso não tomou maiores providências e arquivou o caso, segundo o advogado.

REQUERIMENTOS APROVADOS
Durante a reunião desta quarta-feira foram aprovados os seguintes requerimentos:

- do deputado Durval Ângelo (PT), solicitando audiência pública para debater atos de vandalismo ocorridos nos arredores da avenida Alfredo Balena, conforme recente denúncia da Comissão Pastoral Direitos Humanos;

- do deputado Marcelo Gonçalves (PDT), que solicita realização de uma audiência pública para discutir o PL 797/2000, do deputado Dalmo Ribeiro (PSD), que institui o atendimento especial aos deficientes visuais nos estabelecimentos bancários;

- do deputado Luiz Tadeu Leite (PMDB), solicitando providências do secretário de Estado de Segurança Pública, no sentido de agilizar e concluir o inquérito aberto para apurar as mortes ocorridas há um ano no acampamento da Vila Bandeira Vermelha em Betim;

- da deputada Maria Tereza Lara (PT), solicitando informações sobre denúncias envolvendo o advogado Marcelo Haddad e o promotor de Justiça da cidade de Lavras, Dimas Messias Carvalho.

Foram aprovados também requerimentos de moção de apoio e congratulações.
PRESENÇAS
Participaram da reunião os deputados João Leite (PSDB), presidente, Maria Terza Lara (PT), Luiz Tadeu Leite (PMDB) e Marcelo Gonçalves (PDT).


Responsável pela informação: Anderson Pereira - ACS - 31-2907715