Audiência pública debate PEC 35/2000

De um lado, a procuradora-geral do Estado, Mizabel Derzi, defendendo a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição...

18/04/2000 - 23:47

Audiência pública debate PEC 35/2000

De um lado, a procuradora-geral do Estado, Mizabel Derzi, defendendo a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 35/2000, do governador, como instrumento de defesa de direitos dos servidores públicos estaduais e de garantia contra a exoneração de servidores estáveis, possibilidade aberta, em nível federal, pela Emenda 19 à Constituição da República. De outro, representantes de entidades de servidores públicos queixando-se de não terem sido ouvidos durante a elaboração da PEC e criticando vários pontos da proposta, especialmente com relação ao tratamento dado aos servidores detentores de função pública. Essa foi a tônica dos debates na audiência pública da Comissão Especial encarregada de emitir parecer sobre a PEC 35/2000, nesta quinta-feira (13/4/2000), na Assembléia Legislativa. A PEC adapta a Constituição Estadual à Constituição da República, em decorrência das modificações introduzidas pela Emenda Constitucional 19, de 4 de junho de 1998, que contém a reforma administrativa. A iniciativa da reunião foi do relator da PEC, deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSD). A Comissão tem prazo até o próximo dia 3 de maio para emitir seu parecer.

ESTRATÉGIA DO GOVERNO DE MG
Segundo Mizabel Derzi, a PEC foi elaborada com a preocupação de adequar a Constituição Mineira à da República sem, no entanto, repetir alguns dispositivos da Emenda 19 que ela considera inconstitucionais, como a possibilidade de exoneração de funcionários estáveis. "Nenhum servidor terá um agravamento de sua situação atual com a PEC, inclusive os não-estáveis", assegurou. A procuradora argumentou que a proposta foi elaborada dentro de uma estratégia de evitar confrontos com a Constituição da República, a fim de evitar questionamentos sobre sua constitucionalidade que levem a matéria a ser julgada diretamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), onde poderia ser derrotada sem a possibilidade de recursos. "A interpretação do STF tem sido muito mais restritiva que ampliativa, em termos de direitos de servidores", avaliou, ao frisar que considera "um risco" colocar novos direitos na Constituição Estadual, como vantagens que os detentores de função pública conquistaram mediante leis ordinárias. "Temos que exercer a autonomia do Estado de forma responsável, sem riscos ou confrontos desnecessários", insistiu, lembrando o rigor das restrições impostas pela Lei Camata e pela Lei de Responsabilidade Fiscal, em tramitação no Congresso Nacional, com relação aos gastos com pagamento de pessoal. "Mas nada impede que a proposta seja aperfeiçoada na Assembléia, que é quem vai decidir como ficará a emenda", observou.

Representantes da Secretaria de Estado de Recursos Humanos e Administração, que trabalharam na elaboração da PEC, também defenderam a proposta e disseram que Minas Gerais foi o único Estado a propor, explicitamente, a proibição da exoneração de servidores estáveis. "A orientação do governador foi a preservação de direitos; enquanto na Emenda 19 a exoneração de não-estáveis está em segundo lugar, aqui está em quarto, depois de medidas para aumento da receita, da redução de cargos em comissão e da exoneração de quem está em estágio probatório", explicou Maria Taís Oliveira, diretora de Aposentadoria e Proventos da Secretaria. "Ao contrário do que acontece em nível federal, trabalhamos na perspectiva da valorização do servidor e do serviço público", completou o assessor Epaminondas Bittencourt.

SERVIDORES QUEREM ASSEGURAR DIREITOS
As explicações da procuradora não convenceram dirigentes de entidades de servidores públicos. Para Sebastião Soares, da União Nacional dos Servidores Públicos (Unsp), os detentores de função pública foram marginalizados pela proposta do Executivo. "Embora não sejam concursados, são servidores que foram contratados legalmente e por necessidade dos órgãos públicos", disse. Segundo ele, vários órgãos como o DER, o IMA e outros da área de saúde não funcionam sem os servidores de função pública.

Ele defendeu que o próprio conceito de função pública deve ser revisto, lembrando que o termo é tratado em Minas Gerais com interpretação diferente da que é dada em nível federal e nos demais Estados. "Para a União, função pública é servidor em caráter temporário. Aqui, criou-se a figura do função pública como todo e qualquer não-efetivo. Tem-se o função pública estável e o não-estável, o que é uma aberração jurídica", declarou. "A função pública é específica de funções temporárias; e os detentores de função pública não são servidores temporários", argumentou. O dirigente da Unsp sustentou que seu raciocínio tem amparo em jurisprudência e mostrou-se contrário à transformação de detentores de função pública em celetistas.

Tratamento isonômico - Regina Moura Araújo, do DER/MG, também pediu uma regularização definitiva e justa para os servidores de função pública. "Não estamos propondo a efetivação do detentor de função pública; o que queremos é tratamento isonômico", ressaltou. "Eles não entraram no serviço público pela porta dos fundos, mas, sim, pela porta da frente, por necessidade dos órgãos onde trabalham há anos", prosseguiu. Ela disse, ainda, esperar que o Governo do Estado tenha para com os servidores a mesma boa vontade que manifestou na reincorporação dos ex-PMs, hoje no Corpo de Bombeiros, e no caso dos funcionários da extinta Minascaixa. "E isso não vai significar nenhum aumento de gastos para o Estado, pois todos já fazem parte da máquina pública", completou.

Bode expiatório - Edilane das Graças Andrade, do Sindicato dos Serventuários da Justiça de 2ª Instância, disse que o Governo de Fernando Henrique Cardoso tem tratado os servidores como "bode expiatório" e cobrou um posicionamento mais firme do Governo Estadual contra a reforma administrativa e a Emenda 19. Edilane sugeriu, ainda, mudanças em alguns artigos da PEC, como o artigo 101, que garante a isonomia nas pensões apenas para os magistrados; e o 31, que retira o adicional trintenário.

Adilson de Brito, representante dos servidores da Secretaria da Assembléia Legislativa, também defendeu os detentores de função pública e disse que é preciso definir de vez sua situação, uma vez que não são regidos pela CLT, não são considerados de recrutamento amplo nem se enquadram mais na situação do Regime Jurídico Único. Renato Barros, da Coordenação Sindical, protestou contra o envio da PEC à Assembléia sem que os servidores tivessem sido ouvidos e propôs mudanças também no artigo 23, que propõe que apenas servidores efetivos possam ocupar cargos em comissão e funções de confiança. Ele criticou, ainda, o ex-secretário de Estado Antônio Augusto Junho Anastasia, responsável pela criação da função pública de caráter permanente, "situação que só existe em Minas Gerais".

Também apresentaram propostas de mudanças na PEC o presidente da Associação dos Defensores Públicos, Eriberto Campos Batista; Sandra Margareth, do Sindicato dos Serventuários da Justiça de 1ª Instância; João Paulo Sarmento, do IEF; major PM Domingos Sávio de Mendonça, presidente da Associação de Oficiais Policiais e Bombeiros Militares; e Sebastião Catarino, do Sindpúblicos.

CONTEÚDO DA PROPOSTA
A Emenda 19 retirou do texto constitucional o Regime Jurídico Único dos servidores públicos, criou as carreiras exclusivas do Estado, permitiu ao Poder Público a contratação de pessoal via CLT, retirou a isonomia de cargos e funções assemelhados e possibilitou, ainda, a exoneração de servidores estáveis.

A PEC proposta por Itamar Franco altera 38 artigos da Constituição do Estado: são eles os artigos 13, 14, 15, 20, 21, 23, 24, 25, 26, 27, 30, 31, 32, 33, 35, 53, 61, 62, 66, 74, 78, 100, 101, 104, 110, 122, 125, 126, 128, 131, 161, 179, 196, 300 e 301; e os artigos 103, 104 e 105 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Em sua justificativa, o governador critica as modificações feitas na Constituição da República e afirma que é "de alta relevância restabelecer garantias e prerrogativas que, no âmbito federal, foram cassadas". Ele defende a manutenção da estabilidade no serviço público para concursados ou efetivados, manifestando-se contrário à exoneração de servidores estáveis como medida de contenção de gastos com pessoal. "Em Minas Gerais, não se ferirá o direito à estabilidade já adquirido", assegura, na Mensagem que enviou à Assembléia. Para ser aprovada, a proposta precisa do voto favorável de 48 parlamentares (3/5 da Assembléia) e tramita como um projeto de lei ordinária, em dois turnos, mas tem os prazos regimentais contados em dobro.

DESPESAS COM PESSOAL
A PEC 35/2000 suprime dispositivo relacionado ao Regime Jurídico Único dos servidores, repetindo a Emenda 19. Desta forma, segundo a proposta, o Estado ficaria desobrigado de adotar um regime único para todos os servidores. Caso o Estado decidisse adotar, por exemplo, o regime estatutário para a administração direta e o celetista para a administração indireta, isso teria que ser feito por meio da apresentação de projeto de lei ordinária ou complementar, posteriormente.

O artigo 10 da PEC dá, além disso, nova redação ao artigo 27 da Constituição, estabelecendo que a despesa com pessoal ativo e inativo do Estado e dos Municípios não pode exceder os limites estabelecidos pela lei (a chamada "Lei Camata II" fixa os limites de 50% de toda a arrecadação para a União, e de 60% para Estados e Municípios). A proposta estabelece condições para a concessão de qualquer vantagem ou o aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou a alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público. A concessão fica condicionada à prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

DISPENSA DE NÃO-ESTÁVEL
Ao contrário da Emenda 19, que prevê até mesmo a exoneração de servidores estáveis como medida de contenção de gastos com pessoal, a PEC 35/2000 mantém a estabilidade para os servidores estaduais que já tenham assegurado esse direito. Segundo a PEC, decorrido o prazo estabelecido em lei para a adaptação aos parâmetros previstos para despesa com pessoal, serão imediatamente suspensos todos os repasses de verbas estaduais aos Municípios que não observarem os limites legalmente estabelecidos. Para o cumprimento desses limites, dentro de prazo a ser fixado em lei complementar, o Estado adotará as seguintes providências, sucessivamente: implementação de programa de esforço concentrado de arrecadação, combate à sonegação fiscal (uma novidade com relação à legislação federal), e de racionalização de custos e despesas administrativas; redução, em pelo menos 20%, das despesas com cargos em comissão e funções de confiança (repetição da Emenda 19); dispensa ou exoneração de servidor público civil não estável que conte tempo de efetivo exercício inferior a três anos de serviço no Estado de Minas Gerais, admitido em órgão da administração direta, autárquica ou fundacional; dispensa ou exoneração de servidor não estável, observados os critérios de menor tempo de efetivo serviço e avaliação de desempenho, na forma da lei.

O artigo 11 da proposta de emenda dá nova redação ao caput do artigo 30 da Constituição, ficando ele acrescido dos parágrafos 4º, 5º e 6º. As modificações propostas determinam que o Estado instituirá conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos seus Poderes, com a finalidade de participar da formulação da política de pessoal. Estabelece que lei estadual disciplinará a aplicação de recursos orçamentários provenientes da economia na execução de despesas correntes em cada órgão, autarquia e fundação, para aplicação no desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de adicional ou prêmio de produtividade

A PEC 35/2000 acrescenta também o artigo 301 às disposições gerais da Constituição do Estado. De acordo com o artigo, consideram-se servidores não estáveis aqueles admitidos na administração direta, autárquica e fundacional sem concurso público de provas ou de provas e títulos após o dia 5 de outubro de 1983, cinco anos antes da promulgação da Constituição da República. Disposição semelhante está na Emenda 19.

AMPLIAÇÃO DO DEBATE
O relator da PEC, deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSD), afirmou que o debate serviu para subsidiar seu parecer e se manifestou favorável à preservação de direitos, garantias e prerrogativas dos servidores públicos. Também presente à audiência pública, o deputado Antônio Carlos Andrada (PSDB) propôs a realização de um seminário, no Plenário da Assembléia, como forma de aprofundar o debate sobre a PEC e de envolver o maior número possível de deputados no debate. A proposta não chegou a ser formalizada, na forma de requerimento, e deverá ser analisada na próxima reunião da Comissão.

PRESENÇAS
Compareceram à reunião os deputados Mauro Lobo (PSDB), que a presidiu, Dalmo Ribeiro Silva (PSD), relator da PEC, Dimas Rodrigues (PMDB), Antônio Carlos Andrada (PSDB) e Paulo Piau (PFL). Também estiveram presentes a procuradora-geral do Estado, Mizabel Derzi; o procurador geral de Justiça, Márcio Decat de Moura; Epaminondas Bittencourt e Maria Taís da Costa Oliveira, da Secretaria de Recursos Humanos e Administração; cel.PM Fernando Muniz, representante do comandante geral da Polícia Militar; Renato Barros, da Coordenação Sindical dos Servidores Públicos Estaduais; major PM Domingos Sávio Mendonça, presidente da Associação de Oficiais Policiais e Bombeiros Militares; Edilane das Graças Andrade, do Sindicato dos Serventuários da Justiça de 2ª Instância; Sebastião Soares, da União Nacional dos Servidores Públicos (Unsp); Adilson de Brito, representante dos servidores da Secretaria da Assembléia Legislativa; Regina Moura Araújo, do DER/MG; Míriam Souza Pinto Alvarenga, do Sindicato dos Servidores do Instituto Mineiro de Agropecuária (Sima); Sandra Margareth, do Sindicato dos Serventuários da Justiça de 1ª Instância; Sebastião Catarinho, diretor Jurídico do Sindpúblicos; e João Paulo Sarmento, do Instituto Estadual de Florestas (IEF); dentre outros representantes de entidades de servidores públicos estaduais.


Responsável pela informação: Jorge Possa - ACS - 31-2907715