Debate Público discute desafios da pesca no proxímo milênio

O setor pesqueiro no limiar do próximo milênio foi o tema do Debate Público promovido pela Comissão do Meio Ambiente ...

23/11/1999 - 07:26

Debate Público discute desafios da pesca no proxímo milênio

O setor pesqueiro no limiar do próximo milênio foi o tema do Debate Público promovido pela Comissão do Meio Ambiente e Recursos Naturais, por meio de uma iniciativa do deputado Fábio Avelar (PPS), nesta sexta-feira (19/11/1999), no Plenário da Assembléia Legislativa. A deputada Maria José Haueissen (PT) abriu o debate falando da importância do setor pesqueiro para o Estado. O deputado Fábio Avelar (PPS), que coordenou o evento, ressaltou a importância de uma consciência ambiental voltada para os rios.

O professor do Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Alexandre Godinho, foi o responsável pela exposição do tema "O porquê da redução dos estoques pesqueiros nos rios do Estado de Minas Gerais". Segundo ele, no Brasil existem cerca de três mil espécies de peixes, sendo que 380 estão presentes nos rios mineiros. Godinho conta que os peixes de Minas se destacam pelas cores, tamanho e forma; e o Surubim, o Jaú, o Curimbatá e o Dourado são as espécies mais encontradas. Esses animais são característicos de piracema, ou seja, deslocamento do peixe do seu local de alimentação para um local de reprodução. Os ovos são jogados e fecundados na correnteza e se desenvolvem nas lagoas localizadas nas margens dos rios principais.

CAUSAS DA REDUÇÃO
De acordo com dados apresentados pelo professor de Zoologia, em 1987 cada pescador tinha a expectativa de capturar 12 quilos de peixes por dia, mas em 1999 essa expectativa caiu para dois quilos. Para Godinho uma das causas da queda da quantidade de pescados é a falta de cheia nos rios. "Os filhotes que se desenvolvem nas lagoas marginais não conseguem voltar ao rio principal por falta de água, pois estamos há sete anos sem cheias", explicou. O professor aponta as cheias artificiais como uma possível solução para o problema.

Outra causa da redução do número de peixes, de acordo com Alexandre Godinho, é a legislação vigente, que, na sua opinião, é inadequada. Ele afirmou que os decretos estaduais estabelecem medidas mínimas para que o peixe seja pescado, mas exige tamanhos diferentes para uma mesma espécie de peixe. Por exemplo, o tamanho mínimo para o Pacu-caranha é 40 cm e para o Pacu é 30 cm. A poluição das bacias, o desmatamento, o uso das lagoas marginais para irrigação, a introdução de peixes exóticos e a falta de estudos científicos, de acordo com Godinho, também representam causas da redução dos estoques pesqueiros no Estado. "Estudos científicos são imprescindíveis para fundamentar ações destinadas à recuperação da pesca", ressaltou.

O representante da Cemig, Antônio Procópio Sampaio Rezende, convidado para debater o tema, afirmou a importância do trabalho de preservação executado pela empresa. "A Cemig realiza atividades ambientais nas 40 usinas presentes em diversas bacias do Estado", afirmou. Segundo ele, em quase todas as usinas há estações de piscicultura que desenvolvem técnicas de reprodução das espécies nativas. O pescador profissional Norberto dos Santos, por outro lado, afirmou, durante o Debate Público, que a barragem construída pela Cemig em Três Marias prejudica a desova dos peixes do local, pois impede a piracema.

PROFISSIONAIS E AMADORES
A representante do Ibama, Maria Beatriz Boschi, levantou a questão da suspensão temporária da pesca, que deve ser baseada em estudos técnicos. O representante do IEF, Carlos Augusto da Silva, ressaltou a necessidade de uma fiscalização pesqueira. Segundo ele, seis mil redes já foram apreendidas pela Polícia Florestal este ano. Carlos lembrou ainda que Minas possui a segunda maior rede hidrográfica do País e, apesar disso, importa cerca de 85% do seu pescado. "Temos 14 mil empreendimentos de piscicultura e 85 mil carteiras de pescas já foram emitidas pelo IEF", contou Carlos Augusto.

O tema "Pesca profissional e amadora, contribuições, reivindicações, e perspectivas" teve como expositora a representante da Federação dos Pescadores Profissionais do Estado, Bárbara Johnsen. Segundo ela, a classe, que foi regulamentada pelo Decreto-Lei 221/67, tem hoje cerca de 30 mil pescadores organizados em 10 colônias federadas e associações. Bárbara criticou "as afirmações falsas e tendenciosas" que a mídia faz com relação à classe, dizendo que a sociedade desconhece quem polui e prejudica os rios. "Os verdadeiros degradadores devem ser apontados", ressaltou. Bárbara disse que a lei estadual que proíbe a pesca profissional em Minas deve ser debatida, pois o pescador representa "os olhos da sociedade". "É o pescador profissional que dá notícias sobre a qualidade da água nos rios", opinou.

"Quem renova o rio é a água e não a proibição da pesca", destacou Bárbara Jonhsen. Para o representante do Clube dos Pescadores, Sérgio Luiz, os próprios pescadores profissionais podem exercer o papel de policiais. "Se eles derem fim aos peixes, darão fim também à profissão", ponderou Sérgio. Ele também apontou a poluição, o desmatamento e a falta de consciência da população como os principais fatores que prejudicam as águas dos rios. Sérgio Luiz sugeriu que seja dado um incentivo fiscal àqueles fazendeiros ou proprietários que tenham terras banhadas por rios. "Daqueles que poluírem os rios deve ser cobrada, em contrapartida, alta multa", defendeu. O presidente do Clube Campestre da Pesca Tamarindo, Ezequiel Profeta de Andrada, sugere a criação de um "Pesque e Solte" para pescadores amadores.

FISCALIZAÇÃO
Durante a última fase do debate, o capitão da Polícia Militar, Arley Ferreira, foi o expositor do tema "Fiscalização da Pesca: Desafios e Perspectivas" . Segundo ele, desde 1992, as atividades de fiscalização ambiental da Polícia Florestal no Estado se encontram em declínio. O capitão aponta como o principal fator que tem dificultado os trabalhos da Polícia a falta de recursos. "Se os recursos não chegarem a tempo, não tem como os policiais chegarem a tempo para atender as ocorrências", salientou. Dados apresentados pelo capitão mostram que o orçamento do ano de 1999 para a Polícia Florestal exercer a fiscalização ambiental no Estado somaram, aproximadamente, R$ 13 milhões, sendo que, os recursos repassados pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) e pelo Ibama, de 1995 a 1998, não chegaram a R$ 4 milhões. "A contribuição dos órgãos ambientais não é equilibrada. A Polícia Florestal precisa trabalhar melhor e, para isso, precisa de maior parceria dos órgãos ambientais ", disse.

Outros números apresentados pelo capitão Arley Ferreira demonstraram que, entre 1995 e 1998, a PM registrou 25 mil ocorrências relacionadas à pesca contra o meio ambiente, sendo que, desse total, 14 mil foram causadas pela pesca amadora, contra 10 mil causadas por pescadores profissionais. O efetivo da Polícia Florestal no Estado também foi apontado como outro fator complicador na fiscalização da pesca. Segundo Arley Ferreira, de um total de 40.726 integrantes da PM, apenas 1.258 são policiais florestais.

O jornalista do Estado de Minas, Onofre Miranda, que há quase trinta anos tem um coluna dedicada à pesca no Jornal, defendeu a criação de uma Secretaria Nacional da Pesca e criticou o fato de o Estado de Minas Gerais importar, segundo ele, cerca de 90% dos peixes consumidos no Estado. "Minas sempre foi conhecida como caixa d´água do Brasil", disse. Segundo o jornalista, o peixe começou a desaparecer no Estado nos últimos trinta anos por causa, principalmente, da poluição das águas, causada pelo intensificação da industrialização.

Já o pescador profissional Noberto Santos, do município de Três Marias, afirmou que hoje estoque de peixes é maior. Ele lembrou que em 1970 precisava sair da sua região para buscar peixes em outras águas e que, atualmente, mesmo tendo mais pescadores, não precisa mais se deslocar. O pescador defendeu a liberação da pesca nos Rios da Velha e Paraopeba e a harmonia entre os diversos setores pesqueiros no Estado. Na fase dos debates, foi discutida a pesca durante a piracema (período de desova dos peixes) e as opiniões divergiram entre aqueles que defenderam a proibição da pesca no período e aqueles que se colocaram a favor. Foi, também, ressaltada a importância da preservação da qualidade das águas do Estado para o desenvolvimento sustentável do setor.

O deputado Fábio Avelar (PPS) , que coordenou os trabalhos durante todo o debate, afirmou que "não irá medir esforços para propor alterações na legislação, de acordo com as sugestões e temas discutidos durante o debate" .


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