Ciclo discute situação administrativa e política de municípios

O enfraquecimento dos governos estaduais - tendência desde 1934, no Brasil, e da própria federação - com a legislação...

18/10/1999 - 13:48

Ciclo discute situação administrativa e política de municípios

O enfraquecimento dos governos estaduais - tendência desde 1934, no Brasil, e da própria federação - com a legislação sobre os municípios se deslocando das constituições estaduais para a federal, foi ressaltado pelo deputado federal José Bonifácio Tamm de Andrada, relator da Comissão Especial para análise da proposta de emenda à constituição que institui o sistema parlamentarista de governo. Ele foi o palestrante do encerramento do Ciclo de Debates "O Município e as Reformas Administrativa, Previdenciária e Política" nesta sexta-feira (15/10/1999), com a coordenação do deputado Sebastião Costa (PFL).

Andrada lembrou que a Constituição Federal tem vários artigos sobre municípios. É ela que até mesmo prevê a atribuição dos municípios de eles mesmos elaborarem sua lei orgânica. O deputado ressaltou que o município, hoje, é muito mais dependente da União - que libera as verbas mais importantes - que dos governos estaduais. E, para liberar essas verbas o município enfrenta o que o deputado classifica como o maior dos males - a tecnoburocracia. Outra característica atual é que os municípios tiveram que expandir serviços para substituir o Estado, que está fraco.

Outra característica moderna, lembrada pelo deputado, é o enfraquecimento dos partidos. Ele comentou que, no passado, era difícil até mudar de partido - alguém da UDN ir para o PSD ou vice-versa - por causa das convicções políticas. A articulação partidária surgia do município e seguia até a esfera federal. "Hoje há uma desarticulação das lideranças locais com os representantes federais", observou. A solução para isso, ressaltou, é fortalecer e estimular as lideranças políticas municipais. "As lideranças políticas tradicionais estão perdendo força para as lideranças administrativas, que são fortes porque têm nas mãos a máquina municipal", comentou. Andrada defendeu que o Executivo municipal seja mais flexível, democrático e capaz de conviver com a comunidade. Alertou, ainda, para a necessidade de informatização das administrações, e defendeu que os impostos sejam municipais, afastando os municípios das questões tributárias da União e do Estado.

SISTEMA ELEITORAL
O diretor da Representação do Governo de Minas em Brasília, Israel Pinheiro Filho, defendeu a mudança do sistema eleitoral como única forma de estabelecer a fidelidade partidária. Para isso, seria necessário implantar o sistema distrital misto porque, segundo ele, o voto distrital puro iria restringir a representação das minorias. Nesse sistema, segundo ele, os partidos comandam a eleição, o que diminui o custo das campanhas e a possibilidade de corrupção eleitoral. "A briga do candidato é para ser escolhido pelo partido, e não para ser eleito pela população", explicou.

Outra grande mudança defendida por Israel Pinheiro Filho é a do sistema de governo, para o parlamentarismo. "Nossa Constituição é a coisa mais irresponsável desse país", afirmou. Segundo ele, a Constituição foi feita sem análise, sem debate, sob pressões e lobbies e com relatores irresponsáveis, que prometiam uma coisa e faziam outra. O ex-deputado federal defendeu a possibilidade de mudar a Constituição por meio de referendo popular e elogiou a ação do presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Para ele, o presidente foi criticado pelo corporativismo e pelos que defendiam interesses de classe. "Por quê não é possível mudar a Constiuição pelo voto", questionou.

AUTONOMIA DOS MUNICÍPIOS
Para o professor de Direito José Alfredo Baracho Júnior, o texto constitucional trabalhou bem a autonomia dos municípios, mas as interpretações dadas por acadêmicos, juristas e pela Justiça têm sido muito mais tímidas que o próprio texto. Ele explicou que, embora na origem o federalismo brasileiro tenha se inspirado no modelo norte-americano, a realidade dos dois países é diversa. Baracho lembrou que na federação brasileira já existia um poder central e que, por isso, buscou-se a consolidação democrática pela descentralização. Nos EUA, os estados aceitaram abrir mão de poder, em favor da União, para assegurar a independência.

Baracho observou que a continuidade da visão da inspiração norte-americana está prejudicando a visualização da autonomia dos municípios. Uma interpretação seria a de que o município não é parte da federação porque não tem poder judiciário nem representantes nas esferas federais, ou mesmo constituição - apenas a lei orgânica. "Essa leitura é grave porque viabiliza a apresentação de emendas que venham a restringir a autonomia municipal. Nosso problema é conseguir que juristas e tribunais pensem nossa federação de forma própria", observou.

O professor concordou que os estados foram enfraquecidos. Segundo ele, a Constituição Federal restringe a atuação dos legislativos estaduais tirando deles o poder de decidir sobre o direito penal e civil, que é o que dá vida aos estados e são temas relacionados com o cotidiano dos cidadãos. Ele concordou que seria complicada a implantação do voto distrital puro no Brasil. Segundo Baracho, nos Estados Unidos - que têm sistema bipartidário - o Judiciário é o espaço de proteção das minorias, mas o Brasil não está preparado para isso.

Quanto à mudança da Constituição, o professor lembrou que a rigidez é uma preocupação em vários lugares do mundo, inclusive nos EUA. Lá, é necessário, além da aprovação de 3/5 das duas casas legislativas, uma ratificação dos estados para aprovar mudanças constitucionais. Baracho concordou que a ortodoxia jurídica é perigosa. "Não defendo uma ou outra posição, mas acho importante registrar que há reflexões teóricas sobre esse assunto", concluiu.


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