Expositores falam sobre modelo econômico brasileiro
"Não há solução para o problema do desemprego no país enquanto o governo mantiver as altas taxas de juros que pratica...
04/10/1999 - 19:26Expositores falam sobre modelo econômico brasileiro
"Não há solução para o problema do desemprego no país enquanto o governo mantiver as altas taxas de juros que pratica". A afirmação é do senador José Alencar Gomes da Silva (PMDB/MG), que participou na quinta-feira (30/9/1999) à noite do Fórum de Políticas Macroeconômicas Alternativas para o Brasil, que debateu o tema "A Economia Brasileira, o Plano Plurianual e o Cenário Externo". Falando sobre "A abertura do mercado, a crise da empresa nacional e o desenvolvimento", o senador, que é também presidente do Grupo Coteminas, disse que as taxas de juros praticadas no Brasil - entre 12% e 15% ao ano - desencorajam qualquer tipo de investimento empreendedor. Além disso, a taxa Selic, que está em torno de 20% ao ano e é taxa de juros praticada pelo governo na rolagem da dívida, "é uma taxa que quebra a economia brasileira", segundo o senador.O senador criticou a forma como se deu a abertura do mercado nacional para as empresas e os investidores estrangeiros, afirmando que o governo não se preocupou em oferecer às empresas brasileiras sequer um tratamento igualitário ao que dispensou às estrangeiras, que receberam inúmeros incentivos fiscais e financeiros. José Alencar disse que "quem investe no mercado é vocacionado para o sofrimento", e afirmou que, como empresário - um dos maiores do país no setor têxtil - só conseguiu sobreviver, no mercado brasileiro, porque fez pesquisas de preços em todo o mundo para identificar os melhores parceiros e preparar-se para a concorrência.
"O empresariado brasileiro não pode ser responsabilizado pelo desemprego enquanto o governo não fizer sua parte e mudar a política de juros", afirmou o senador, ressaltando que nunca houve, no Brasil, tamanha transferência de capital para o sistema financeiro como está acontecendo agora. José Alencar disse ainda que, como senador por Minas Gerais, acredita que seu papel é trabalhar para convencer as autoridades econômicas do governo federal de que é necessário mudar a atual política econômica e financeira do país.
MINAS GERAIS É EXEMPLO PARA O PAÍS
O empresário Roberto Jeha, presidente das Indústrias São Roberto e diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), falou sobre "Anatomia de uma capitulação anunciada: as privatizações, a desnacionalização da economia e o controle externo". Ele elogiou o senador José Alencar, afirmando que ele é dos poucos empresários que resistem à "desnacionalização" e, como político, pode falar com experiência empresarial. Jeha elogiou também o governador Itamar Franco, pela sua resistência a algumas das privatizações feitas pelo governo federal, como no caso da Cemig. "Podem ter a certeza que os sócios estrangeiros não irão investir um centavo sequer em Minas Gerais", disse ele.
Comentando o projeto de privatizações do governo federal, o empresário afirmou que o programa brasileiro é "um dos maiores desastres já feitos com o patrimônio público de um país". Até o ano passado, as privatizações renderam ao Brasil R$ 69,5 bilhões - segundo dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômicos e Social (BNDES) -, que foram usados para pagar parte juros de 1998 da dívida externa do país. "O patrimônio público foi usado para pagar 53% dos juros relativos a um único ano", disse.
Jeha criticou o "Consenso de Washington", encontro que aconteceu no início da década de 90 nos Estados Unidos e reuniu as nações mais ricas do mundo, quando ficou decidido que os países pobres e emergentes seriam pressionados a abrir "totalmente" suas economias em troca dos empréstimos internacionais. Para ele, o Brasil abriu sua economia além do necessário para o mercado estrangeiro e cedeu demais às pressões internacionais. "Quem manda no país, agora, é o lobby do financiamento da dívida pública, é sistema financeiro internacional", disse ele, criticando o afastamento do Estado de alguns setores
"A burguesia industrial brasileira precisa fazer um pacto com os trabalhadores, com a classe média e com os cidadãos deste país para que seja construído um projeto alternativo de sobrevivência para o país", afirmou
ONDA ULTRALIBERAL ATINGIU PEQUENOS E MÉDIOS EMPRESÁRIOS
Paulo Osório Silveira Bueno, ex-deputado federal e diretor do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores - Sindipeças - falou sobre a "A desregulamentação e o privilégio das empresas estrangeiras no atual governo". Ele analisou as mudanças institucionais que aconteceram no país depois da Constituição Federal de 1988, e disse que o processo de globalização econômica era inevitável. Porém, o modelo "ultraliberal" adotado pelo governo federal "arrasou" a economia do país, porque gerou uma concorrência desleal entre as empresas nacionais e as estrangeiras, disse. O setor brasileiro de autopeças, que era um dos melhores do mundo, segundo Paulo Osório, foi totalmente absorvido pelas empresas estrangeiras.
O programa automotivo brasileiro lançado em 1995 ofereceu 70% de proteção alfandegária para a indústria internacional de automóveis e 2% para a de autopeças, segundo o diretor do Sindipeças. Ele reconheceu a importância de desenvolver no país projetos de novos veículos, afirmando ser esta a única maneira de manter aqui as empresas, desenvolver novas tecnologias e manter as empresas brasileiras no nível das melhores do mundo. "Mas o poder de decisão do governo brasileiro desapareceu, ficando subordinado às empresas estrangeiras", disse.
EUROPA JÁ VIVE REALIDADE DO MERCADO COMUM
O jornalista Bernard Cassen disse que ficou "muito impressionado" com o que ouvira dos seus antecessores, pois mostrava como o poder econômico e financeiro internacionais e o modelo liberal foram impostos ao Brasil, com grandes prejuízos para a vida dos cidadãos. Ele falou sobre o Mercado Comum Europeu e a União Européia, projeto que foi implantado aos poucos, ressaltando que na Europa não se fala mais em "política nacional" e, sim, em "política européia". Dos 15 países do continente, 11 já aderiram à moeda única - o euro - e a política comercial é a mesma para todos.
O grande projeto europeu, destacou Cassen, é tornar o continente auto- suficiente no maior número possível de itens, o que já é quase uma realidade. Segundo ele, afora energia, petróleo e alguns metais raros, a Europa não depende de outros continentes para nada. A agricultura, segundo ele, é o único setor protegido pela política liberal econômica praticada na Europa. O modelo liberal é um problema que, naquele continente, também tem gerado desemprego de forma preocupante, afirmou o diretor da Attac. Ele comentou que as multinacionais francesas - muitas com cerca de 50% de capital norte-americano - não investem mais na França, o que é um problema a ser enfrentado; já as pequenas e médias empresas do país operam principalmente no mercado interno e europeu.
Responsável pela informação: Cristiane Pereira - ACS - 31-2907715