Celso Furtado diz que o Brasil está perdendo a soberania
O Fórum "Políticas Macroeconômicas Alternativas para o Brasil", promovido pela Assembléia Legislativa, teve como tema...
08/07/1999 - 06:25Celso Furtado diz que o Brasil está perdendo a soberania
O Fórum "Políticas Macroeconômicas Alternativas para o Brasil", promovido pela Assembléia Legislativa, teve como tema, nesta terça-feira (06/07/1999), a Teleconferência "Um Caminho para o Brasil" , e contou com o apoio do Governo do Estado, da Fundação João Pinheiro e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). O evento foi transmitido ao vivo, do Plenário, pela TV Assembléia e polarizou as atenções de telespectadores de diversos Estados, que participaram com perguntas e questionamentos aos expositores.Participaram do Fórum deputados, economistas, administradores de empresas, professores e alunos de Ciências Econômicas. A abertura foi feita pelo presidente da Assembléia, deputado Anderson Adauto (PMDB). Para ele, o modelo econômico determinado pelos donos do mundo já se encontra em declínio, e nenhuma empresa pode durar muito se não contar com a argamassa da solidariedade.
Anderson Adauto afirmou que Minas Gerais tem uma posição singular na resistência contra a ditadura dos mercados ou "fundamentalismo mercantil". "Há poucos dias participamos de um encontro internacional em Paris, promovido pelo jornal "Le Monde Diplomatique" e seis importantes organizações internacionais. De lá saímos convencidos, com os dois mil representantes de 78 países, que um outro mundo é possível. Um mundo no qual o Estado reassuma a sua responsabilidade na promoção e garantia da justiça, na administração da solidariedade, na promoção integral do homem", ressaltou, esclarecendo que o Fórum que se inicia agora terá prosseguimento nos meses próximos e no ano que vem.
A Teleconferência teve como figura principal o professor Celso Furtado, ex- ministro do Planejamento do governo João Goulart (1962/63) e ex-ministro da Cultura do Governo Sarney (1986/88). Como debatedores, participaram João Camilo de Oliveira Penna, ex-ministro da Indústria e Comércio e presidente do Conselho Administrativo da Itaipu Binacional; e o jornalista especializado em Economia, Aloysio Biondi, de São Paulo.
ENTREVISTA À IMPRENSA
Em entrevista coletiva à imprensa, antecedendo a exposição na Teleconferência, o professor Celso Furtado criticou duramente a política econômica do atual governo, que na sua concepção "perdeu o rumo, e o Brasil está perdendo a sua soberania submetendo-se aos ditames da política monetária do Fundo Monetário Internacional."
Para o ex-ministro, o Brasil entrou num processo progressivo de endividamento e de alienação de patrimônio tal que, a continuar essa tendência, dentro de alguns anos não teremos nenhum patrimônio no País que não seja estrangeiro. Ele destacou o crescimento das dívidas interna e externa no período de 1994 a 1998, que praticamente dobraram no período, e a estratégia governista de continuar negociando empréstimos adicionais a taxas exorbitantes, gerando uma autêntica "autofagia", ou seja " estamos comendo nossa própria carne".
Furtado criticou, também, a política de substituição da atividade produtiva pela atividade especulativa e a falta de transparência na divulgação das negociações com o FMI. Ele acha que a atual política cambial deve ser exercida em função do desenvolvimento, e não se restringir apenas ao câmbio.
Sobre as privatizações das estatais, Celso Furtado afirmou que, no fundo, elas são necessárias, já que a gestão do sistema empresarial público entrou numa fase de degenerescência. Encerrando a entrevista, o economista afirmou que a situação do Brasil é grave, e que "não é fácil imaginar uma saída, porém, ainda pode-se evitar o pior" , acentuou.
UM CAMINHO PARA O BRASIL
Dentro da temática da Teleconferência, "Um Caminho para o Brasil", Celso Furtado falou sobre "A Busca de Novo Horizonte Utópico", historiando a fase de implantação do capitalismo industrial marcada pela crescente ascensão das forças sociais que lutavam pelos ideais do bem-estar social e sobre as profundas modificações estruturais que conduziram à emergência de um sistema econômico planetário.
Para ele, essa visão utópica da economia constitui tão somente um exercício de lógica inspirado no princípio de que o progresso é imanente à vida social e se manifesta sempre que o homem se deixa guiar pela razão. E que a "globalização seria, portanto, a porta de acesso à estrada real que conduz ao uso pleno das potencialidades humanas, ou, para usar um conceito moderno, sinalizaria o fim da história."
O professor disse que o Brasil reduziu a eficiência dos investimentos financiados com poupança própria, aumentou sua taxa de endividamento externo, viu crescer amplamente sua taxa de desemprego, tudo contribuindo para uma baixa significativa de sua taxa de crescimento. Em síntese, afirmou, a transição para a globalização faz-se a um preço considerável. "É natural, portanto, que se indague como justificar esse sacrifício e a quem ele beneficia".
Ao encerrar sua exposição, Celso Furtado explicou que o objetivo que começa a definir-se é o de caminhar para a instituição de uma "autoridade financeira mundial", que poderá ou não ser tutelada pelas economias dominantes. Estas, segundo ele, se preparam para assumir o controle das atividades monetárias dos chamados países emergentes. "E que o FMI, enfeudado ao Tesouro dos Estados Unidos e aos interesses financeiros internacionais, se adequa para desempenhar esse papel".
IMPREVIDENCIA
Coordenador dos debates, o ex-ministro Camilo Penna afirmou que "a não preparação para o nosso futuro é a imprevidência, e parece-me que estamos imprevidentes. Em todos os campos brasileiros temos de buscar sermos mais previdentes, a começar pela própria imprevidência da previdência social na União, nos estados e nos municípios, hoje com déficit escandalosos. Há, também, a imprevidência do desperdício nas famílias de renda média e alta. É baixo o nosso estoque de capital bruto, é baixo o nosso fluxo de novos investimentos por trabalhador, é baixo o nosso índice de escolarização, baixando o valor do nosso capital humano".
Camilo de Oliveira Pena falou de sua preocupação com a distribuição de renda social, com a inserção do Brasil na globalização crescente por imperativos tecnológicos, com o crescimento da receita e da produtividade sem a obsessão com competitividade externa. Ele lembrou que, para muitos, planejamento hoje é atividade secundária, e que mercado, estratégia, flexibilização e liberalismo são conceitos que seriam politicamente mais corretos. Para ele, é necessário um grande e coordenado esforço descentralizado de levantamento e busca de otimização de uso de recursos naturais não renováveis e renováveis, assim como dos recursos já construídos e dos valores culturais de nossa sociedade, tudo acoplado à inexorabilidade do necessário esforço de desenvolvimento tecnológico. "
Outro debatedor, o jornalista Aluysio Biondi, de São Paulo, centrou sua fala na crise atual, com pagamento de juros altísssimos, iniciado com R$ 25 bilhões, em 1995, concluído com pagamento de R$ 130 bilhões, este ano. Para o jornalista paulista , "o País foi destruído nos últimos cinco anos. Disse, ainda, que em nenhum momento de nossa história foi tão grande a distância entre o que somos e o que esperávamos ser. Segundo ele, em cinco anos tudo foi destruído pelo atual governo, com uma política de "terra arrasada".
Briondi criticou, ainda, a política de globalização da economia, que "nos foi vendida com uma série de mentiras". Por outro lado, ele acredita que, apesar do domínio financeiro internacional sobre a população, "ainda podemos deixar de ser apenas um povo colonizado, porque este país tem todas as condições de vencer".
MESA
Compuseram a Mesa da Teleconferência o presidente da Assembléia, deputado Anderson Adauto; o professor Celso Furtado; o secretário de Estado da Cultura, Ângelo Oswaldo, representando o governador Itamar Franco; o secretário de Estado do Planejamento, Manoel Costa; o secretário de Estado da Saúde, Armando Costa; o integrante do Conselho Administrativo da Itaipu Binacional, João Camilo Penna; o jornalista Aluysio Briondi; e o 1°-secretário da Assembléia Legislativa, deputado Dilzon Melo (PTB).
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